STJ decide: Há dever de remessa dos autos ao juízo competente em caso de processo eletrônico no NCPC

STJ decide: Há dever de remessa dos autos ao juízo competente em caso de processo eletrônico no NCPC

Flávia T. Ortega, AdvogadoPublicado por Flávia T. Ortega

Imagine a seguinte situação hipotética:

João impetrou mandado de segurança na Justiça Federal de 1ª instância da Seção Judiciária de Recife (PE) contra ato praticado pelo Superintendente de uma entidade federal.

O Juiz Federal entendeu que a autoridade apontada como coatora possui domicílio funcional em Brasília (DF), de forma que a Justiça Federal da Seção Judiciária de Brasília (DF) seria competente para conhecer a demanda.

Diante disso, o Juiz Federal de Recife, de ofício, reconheceu sua incompetência para o julgamento da causa.

A incompetência, neste caso, é absoluta ou relativa?

Absoluta. Segundo entendimento consolidado no STJ, “em se tratando de mandado de segurança, a competência para processamento e julgamento da demanda é estabelecida de acordo com a sede funcional da autoridade apontada como coatora e a sua categoria profissional, o que evidencia a natureza absoluta e a improrrogabilidade da competência, bem como a possibilidade de seu conhecimento ex officio"(STJ. 1ª Seção. CC 41.579/RJ, Rel. Min. Denise Arruda, julgado em 14/09/2005).

Assim, se a parte resolve impetrar mandado de segurança contra uma autoridade federal, será competente a seção judiciária do local onde esta autoridade tenha sede funcional, ou seja, onde ela trabalha. Não se aplica ao autor do mandado de segurança a prerrogativa prevista no art. 109§ 2ºda CF/88:

Art. 109 (...)

§ 2º As causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na seção judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o ato ou fato que deu origem à demanda ou onde esteja situada a coisa, ou, ainda, no Distrito Federal.

A justificativa dada é a de que, em se tratando de mandado de segurança, é a autoridade impetrada que será notificada para prestar informações. Logo, se a autoridade possui sede funcional em Brasília, o mandamusdeverá ser impetrado na Seção Judiciária do DF, sendo inviável que a autoridade que more e resida em um local seja demandada em outro. Diferente seria o caso se a parte autora tivesse ingressado com uma ação ordinária. Nesta hipótese, ela teria opções e poderia propor a ação na seção judiciária:

a) onde ela mora;

b) onde o ato ou fato ocorreu;

c) onde esteja situada a coisa;

d) ou no DF.

Tendo a parte optado por ingressar com MS, ela deverá se sujeitar às regras próprias de competência deste tipo de ação, sendo competente o local da sede funcional da autoridade. Esta competência é absoluta.

O juiz poderia ter declarado a incompetência de ofício?

Sim. A incompetência absoluta pode ser alegada em qualquer tempo e grau de jurisdição e deve ser declarada de ofício (art. 64§ 1º do CPC/2015).

Quando o juiz reconhece a sua incompetência absoluta, qual a providência que ele deve adotar?

O juiz, reconhecendo sua incompetência, deverá remeter os autos ao juízo competente (art. 64§ 3º do CPC/2015).

Vale ressaltar que se o juízo incompetente já tiver praticado atos decisórios, em regra, eles continuarão produzindo efeitos até que o juízo competente os confirme ou revogue. Veja:

Art. 64 § 4º Salvo decisão judicial em sentido contrário, conservar-se-ão os efeitos de decisão proferida pelo juízo incompetente até que outra seja proferida, se for o caso, pelo juízo competente.

O juiz deverá remeter os autos ao juízo competente mesmo que a ação proposta tenha sido um mandado de segurança? O art.64, § 3º do CPC é aplicado também para os processos de MS?

SIM. Nesse sentido já decidiu o STJ na vigência do CPC passado: STJ. 1ª Seção. MS 21.744/DF, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 23/09/2015. O mesmo entendimento continua válido com o novo CPC.

Vamos voltar ao nosso exemplo:

O Juiz Federal de Recife decidiu que era absolutamente incompetente para julgar o MS. No entanto, em vez de remeter os autos ao juízo competente, ele extinguiu o processo sem resolução do mérito.

O magistrado argumentou que o processo é eletrônico e que, como são regiões diferentes (TRF5 e TRF1) existe uma impossibilidade técnica de enviar os autos para a Seção Judiciária do DF pelo sistema do PJE (Processo Judicial Eletrônico).

O argumento invocado pelo magistrado foi aceito pelo STJ?

NÃO.

Se o juízo reconhece a sua incompetência absoluta para conhecer da causa, ele deverá determinar a remessa dos autos ao juízo competente e não extinguir o processo sem exame do mérito.

O argumento de impossibilidade técnica do Poder Judiciário em remeter os autos para o juízo competente, ante as dificuldades inerentes ao processamento eletrônico, não pode ser utilizado para prejudicar o jurisdicionado, sob pena de configurar-se indevido obstáculo ao acesso à tutela jurisdicional.

Assim, implica indevido obstáculo ao acesso à tutela jurisdicional a decisão que, após o reconhecimento da incompetência absoluta do juízo, em vez de determinar a remessa dos autos ao juízo competente, extingue o feito sem exame do mérito, sob o argumento de impossibilidade técnica do Judiciário em remeter os autos para o órgão julgador competente, ante as dificuldades inerentes ao processamento eletrônico.

STJ. 2ª Turma. REsp 1.526.914-PE, Rel. Min. Diva Malerbi (Desembargadora convocada do TRF da 3ª Região), julgado em 21/6/2016 (Info 586).

Fonte: dizer o direito.

Flávia T. Ortega
Advogada

Origem da Foto/Fonte: Extraído de JusBrasil

Notícias

Proposta de alteração no Código Civil não muda status jurídico dos animais

SERES COISIFICADOS Proposta de alteração no Código Civil não muda status jurídico dos animais José Higídio 26 de março de 2024, 8h51 De acordo com a proposta da relatoria-geral, “os animais, objetos de direito, são seres vivos sencientes e passíveis de proteção jurídica própria, em virtude da sua...

Como fica a divisão dos bens em uma separação?

Como fica a divisão dos bens em uma separação? Francisco Gomes Júnior Antes de casar ou unir-se, defina o regime de bens e faça acordos antenupciais para evitar disputas na separação. segunda-feira, 25 de março de 2024 Atualizado às 07:58 Ultimamente, com a notícia de diversos casos de famosos...

Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres

Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres 22 de março de 2024 - Notícias CNJ / Agência CNJ de Notícias Contar com a segurança do “papel passado” para oficializar a união levou um casal de mulheres a tomar a decisão mais importante em pouco mais de dois anos de vida em comum: casar...

Você sabia que precatório de credor falecido é herança?

Você sabia que precatório de credor falecido é herança? Laís Bianchi Bueno Os precatórios são dívidas governamentais decorrentes de várias situações. Após o falecimento do titular, são automaticamente transmitidos aos herdeiros de acordo com o Código Civil. quarta-feira, 20 de março de...

Imóvel de família pode ser penhorado para pagamento da própria reforma

PENHORABILIDADE RETROALIMENTANTE Imóvel de família pode ser penhorado para pagamento da própria reforma Danilo Vital 19 de março de 2024, 14h33 Essa exceção está no artigo 3º, inciso II, da mesma lei. A lógica é impedir que essa garantia legal seja deturpada como artifício para viabilizar a reforma...

Modernidade e sucessão: como funciona a herança digital

OPINIÃO Modernidade e sucessão: como funciona a herança digital Rodrigo Chanes Marcogni 18 de março de 2024, 18h23 Obviamente que temos que considerar aqui que ao estabelecerem suas regras e políticas de uso as empresas que hospedam as redes sociais o fazem imbuídas no princípio constitucional do...