Agravo de Instrumento - Procedimento de inventário - Contrato de gaveta...

Agravo de Instrumento - Procedimento de inventário - Contrato de gaveta - Pleito de transferência do imóvel para terceiro - Reconhecimento e anuência de todos os herdeiros

AGRAVO DE INSTRUMENTO - PROCEDIMENTO DE INVENTÁRIO - CONTRATO DE ``GAVETA - EMPRÉSTIMO DE NOME - PLEITO DE TRANSFERÊNCIA DO IMÓVEL PARA NOME DE TERCEIRO - RECONHECIMENTO E ANUÊNCIA DE TODOS OS HERDEIROS - PROVAS ROBUSTAS - AUDIÊNCIA DE JUSTIFICAÇÃO REALIZADA - RECURSO PROVIDO

- A exigência de que a terceira entre com ação contra o espólio para obter o mandado de averbação para transferir imóvel para seu nome, considerando os fortes indícios de que a mesma efetuou os pagamentos, bem como o fato de que os herdeiros assinaram acordo concordando com a transferência do imóvel, é excessivamente formalista, não sendo razoável, portanto, a manutenção da decisão.

- Levando-se em consideração que foram tomados todos os cuidados necessários, tais como audiência de justificação, com a presença de todos os interessados, tomando-se por termo o reconhecimento ao direito da terceira adquirente, deve-se dar provimento ao recurso, determinando a expedição do mandado de averbação pleiteado.

Agravo de Instrumento-Cv nº 1.0024.06.227155-6/002 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante: Julieta Marcia Alves Costa, inventariante do espólio de Antônio Tomaz da Costa - Interessado: Leonardo Tomaz Costa e outros, herdeiros de Antônio Tomaz da Costa, Juliana Alves Costa, Rodrigo Tomaz Costa, Rogéria Alves Costa - Relatora: Des.ª Vanessa Verdolim Hudson Andrade

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 1ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 27 de janeiro de 2015. - Vanessa Verdolim Hudson Andrade - Relatora

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª VANESSA VERDOLIM HUDSON ANDRADE - Trata-se de agravo de instrumento interposto por Julieta Marcia Alves Costa, inventariante do Espólio de Antônio Tomaz da Costa, visando à reforma da decisão do Juiz de primeiro grau de f. 164/166 (f. 72/74 TJ), proferida nos autos do procedimento de inventário, que indeferiu o pedido de f. 96/97 e 122, dos autos principais, consistente no pleito de expedição de mandado de averbação ao Cartório de Registro de Imóveis de Guarapari/ES, ressalvando às partes o direito de procurar as vias ordinárias.

Em suas razões recursais, alega o agravante que tramita na 3ª Vara de Sucessões e Ausências da Comarca de Belo Horizonte inventário pela morte de Antônio Tomaz da Costa, tendo sido o feito encerrado e baixado em 10.12.2007. Informa que a meeira/inventariante e herdeiros foram procurados pela Sr.ª Cristianne DAnne Cerqueira, no fim de 2012, tendo a mesma apresentado documentos relativos a um imóvel totalmente pago por ela. Aduz que o imóvel nunca compôs o patrimônio do de cujus, tendo o mesmo apenas cedido seu nome, juntamente com sua esposa, para a realização do financiamento junto à Economisa, de forma que jamais teve a posse do imóvel.

Afirma que nunca realizou pagamento algum de prestação ou impostos ou quaisquer outras despesas com o imóvel. Assevera que herdeiros requereram a expedição de alvará para averbação ao Cartório de Registro de Imóveis de Guarapari/ES visando ao reconhecimento de um contrato de gaveta verbal, para fazer constar a transferência do imóvel para a Sr.ª Cristianne DAnne Cerqueira. Destaca que o pedido foi indeferido, tendo a agravante interposto agravo de instrumento, tendo a Turma Julgadora deferido a expedição do mandado de averbação.

Manifesta que o Magistrado, contrariando a decisão de segundo grau, pronunciou-se no sentido de analisar novamente a matéria sob a ótica de seu livre convencimento. Arremata que os fatos narrados foram devidamente comprovados nos autos, bem como que a terceira interessada quitou integralmente o imóvel junto à instituição financeira. Pugna pela reforma da decisão de primeiro grau, para que se confirme o pedido já deferido no acórdão proferido pela 1ª Câmara Cível do TJMG, com a expedição de alvará para o CRI de Guarapari/ES, constando a Sr.ª Cristianne DAnne Cerqueira como proprietária do bem.

O agravo foi recebido no efeito devolutivo, conforme decisão à f. 79/79 v.

Conheço do recurso, presentes os pressupostos de admissibilidade.

Insurge-se a agravante contra decisão interlocutória de primeiro grau às f. 72/74, que indeferiu o pedido de f. 96/97 e 122, dos autos principais, informando que o falecido cedeu seu nome, juntamente com sua esposa (ora inventariante), para realizarem o financiamento do imóvel objeto do presente feito, de forma que o bem nunca foi considerado patrimônio do de cujus. Informa que, em audiência de justificação, os herdeiros corroboraram o conteúdo de que o imóvel nunca fez parte do patrimônio da família, bem como que a Sr.ª Cristianne efetuou todos os pagamentos e baixa da hipoteca.

Assevera, ainda, que, em que pese o ``empréstimo de nome ter ocorrido para Luis Carlos Cerqueira, pai da Sr.ª Cristianne, o mesmo faleceu em 2002 e não realizou o pagamento de nenhuma das prestações. Por fim, coloca que não há quaisquer objeções por parte dos herdeiros no que tange à transferência do imóvel, devendo-se considerar que a família, que é a maior interessada em possuir mais um imóvel para partilhar, nunca se utilizou do mesmo, já que não faz parte do rol de bens de propriedade do de cujus.

Feitas essas considerações iniciais, cumpre ressaltar que, em acórdão publicado em 05.11.2013, nos autos do agravo de instrumento nº 1.0024.06.227155-6/001, interposto em face de decisão similar proferida no mesmo processo, de relatoria desta Desembargadora, assim restou decidido, à unanimidade:

``[...] Nesse caso, o inventário já foi encerrado, com a adjudicação dos bens aos herdeiros, não tendo sido o imóvel em questão arrolado. Posteriormente, apresentaram os herdeiros e a meeira inventariante, junto com a terceira interessada, petição em conjunto, pedindo expedição de mandado de averbação do imóvel em nome da terceira Cristianne DAnne Cerqueira, que havia adquirido o imóvel utilizando o nome do de cujus perante a instituição financeira, tendo ela feito todos os pagamentos, o que se encontra amplamente comprovado nos autos.

Nota-se pelos comprovantes que os pagamentos sempre foram feitos pela terceira, o que foi aceito pela financeira de modo contínuo (f. 27 e seguintes), extraindo em nome dela os boletos bancários. O cheque de f. 30 corrobora o pagamento realizado nominalmente à financeira Economisa. A correspondência de f. 29 foi recebida pela financeira, conforme recibo nela aposto, com declaração de baixa de hipoteca à f. 32, constante da cédula hipotecária. Às f. 34 e seguintes constam outros pagamentos feitos pela terceira retrorreferida. Tais documentos são reforçados pela constatação de que o referido bem nunca constou da relação de bens do inventariado.

O MM. Juiz considerou que, como o contrato de promessa de compra e venda não foi juntado aos autos, não poderia expedir o alvará, devendo ser procuradas as vias ordinárias. Entendo que seria excessivo formalismo exigir que a terceira entre com ação contra o espólio para obter o alvará, com despesas desnecessárias para ela e o espólio ou herdeiros, tendo em vista que os documentos corroboram que sempre efetuou os pagamentos, tratando-se não só de contrato de `gaveta como também de `orelha. Configurou-se que houve apenas o empréstimo do nome para obtenção do financiamento. O STJ tem repudiado o formalismo, prestigiando o princípio da instrumentalidade. [...].

O STJ tem, ainda, entendido que, com o advento da Lei nº 10.150/2000, o adquirente do imóvel por meio de `contrato de gaveta possui legitimidade ativa ad causam para discutir em juízo questões relativas aos direitos e obrigações do contrato primitivo, desde que a cessão tenha ocorrido até 25.10.1996, constando da hipoteca que o contrato foi contraído em 1980.

Por outro lado, conforme ressaltado no acórdão retrorreferido do STJ, de nº REsp 85654, a matéria comporta audiência de justificação, no próprio processo, dispensando-se até que seja feito em apenso, pois seria demasiado formalismo exigir a propositura de uma ação, onerando ainda mais a interessada ou o espólio, que com tudo anui.

Nesse caso, não há apenas sérios indícios de que houve a compra utilizando o nome do de cujus, pois o bem não foi arrolado no inventário, já encerrado há anos, a meeira e os herdeiros não se opõem ao pedido e, além de tudo - e o que é mais relevante, inobstante a falta do contrato de gaveta, há prova suficiente de que a adquirente foi quem pagou, em seu nome, as prestações e todas as despesas, com a anuência da financeira.

Deve, pois, ser deferida a medida, porém com os cuidados devidos, marcando-se audiência de justificação, com a presença de todos os interessados, tomando-se por termo o reconhecimento ao direito da terceira adquirente, para expedição do mandado de averbação em seu nome, devendo arcar com todas as despesas da transferência.

Assim sendo, dou provimento, para esse fim (TJMG - Agravo de Instrumento-Cv 1.0024.06.227155-6/001, Relatora: Des.ª Vanessa Verdolim Hudson Andrade, 1ª Câmara Cível, j. em 05.11.2013, p. em 13.11.2013).

Extrai-se que, em julgado anterior, esta Desembargadora já havia entendido pela existência de fortes indícios de que ocorreu a compra do imóvel anteriormente, com utilização do nome do de cujus, principalmente em razão de a Sr.ª Cristianne ter realizado todos os pagamentos em seu nome, não tendo sido o bem sequer arrolado nos autos do inventário.

Concluiu-se, também, que a cônjuge meeira e os herdeiros não se opunham ao pedido, entendendo esta Relatora que deveria a medida ser deferida, após realizada audiência de justificação com a presença de todos os interessados, tomando-se por termo o reconhecimento ao direito da terceira adquirente, de forma que esta deveria, inclusive, arcar com todas as despesas de transferência.

Entretanto, o Magistrado de primeiro grau, ao argumento de que o Tribunal de Justiça não subtraiu, através do julgado acima, o direito de o Juiz decidir de acordo com sua livre convicção, pretendendo apenas que se produzissem provas antes de prolatada a decisão final, indeferiu o pleito de expedição de mandado de averbação ao Cartório de Registro de Imóveis de Guarapari/ES, ressalvando às partes o direito de procurar as vias ordinárias. Assim restou decidido às f. 72/74:

``Feitos esses registros iniciais, vejo que a prova colhida em audiência, tal como determinado pelo Eg. TJMG, não autoriza o acolhimento do pedido inicial. Senão vejamos:

A então inventariante disse durante a audiência: `que, de fato, juntamente com Antônio Tomaz da Costa, a depoente adquiriu o imóvel situado em Guarapari, na Rua José Alves Soares, nº 145; que a depoente e seu falecido marido emprestaram os nomes para o financiamento do imóvel em questão; que o nome foi emprestado para o amigo do finado Antônio, de nome Luiz; [...] que quem quitou o financiamento foi Cristianne Cerqueira (f. 159).

A herdeira Rogéria Alves Costa, por seu turno, disse: `que não tomou conhecimento do financiamento em questão; que somente por ocasião da petição de f. 96/97 é que a depoente tomou conhecimento da existência desse imóvel e do financiamento tomado; que foi nessa ocasião é que soube que seu pai teria emprestado o nome para uma pessoa chamada Luiz (f. 160).

O herdeiro Rodrigo Tomaz Costa assim narrou sua versão: `que somente por ocasião da petição de f. 96/97 é que o depoente tomou conhecimento da existência desse imóvel e do financiamento tomado; que foi informado desses fatos por Juliana Alves Costa; que na ocasião foi informado que Luiz havia pedido aos seus pais auxílio para obter a compra do imóvel em questão [...] (f. 161).

Conforme se vê da prova colhida, não se tem notícia de contrato de gaveta celebrado entre o de cujus e Cristianne DAnne Cerqueira. Ao contrário, o que diz a prova é que o finado Antônio Tomaz e sua esposa tomaram um financiamento a pedido de um amigo chamado Luiz, com quem talvez possam ter celebrado o alegado contrato de gaveta.

O fato de a inventariante ter afirmado que quem quitou o imóvel foi Cristianne não afasta a hipótese de que ela o tenha feito em nome de Luiz, a quem o casal antes referido pretendeu beneficiar.

O certo é que o conjunto probatório não autoriza o deferimento do pedido de expedição de `mandado de averbação (sic) ao cartório de Registro Geral de Imóveis de Guarapari/ES, para a transferência à Cristianne DAnne Cerqueira, do apartamento nº 104 da Rua José Alves Soares, nº 145, em Guarapari/ES.

Merece, ainda, o registro de que, quando muito, o Juízo da Vara de Sucessões poderia autorizar a transferência da parte do imóvel que pertencia ao morto (que deveria, e não foi objeto do inventário), que em tese estaria afeta à sua competência, mas nunca da parcela que pertence ao cônjuge sobrevivente, e que, portanto, não poderia ser objeto de inventário.

E, porque em face da prova produzida em audiência vejo como temerário o acolhimento do pleito em questão, indefiro o pedido de f. 96/97 e 122, ressalvando às partes o direito de procurar as vias ordinárias (CPC, art. 984) (sic).

Entretanto, tais razões não merecem prosperar. Verifica-se que a própria inventariante, que também ``emprestou seu nome na ocasião da confecção do contrato de financiamento do imóvel, informou em audiência de justificação que, juntamente com Antônio Tomaz da Costa, adquiriu o imóvel situado em Guarapari, bem como que o nome foi emprestado para o amigo do finado Antônio, de nome Luiz, e que o financiamento foi quitado por Cristianne Cerqueira (f. 63).

A exigência de que a terceira entre com ação contra o espólio para obter o alvará, considerando os fortes indícios de que ela efetuou os pagamentos, bem como o fato de que os herdeiros e a própria Sr.ª Cristianne assinaram acordo às f. 24/25, concordando com a transferência do imóvel, é excessivamente formalista, não sendo razoável, portanto, a manutenção da decisão.

Assim sendo, e levando-se em consideração que foram tomados todos os cuidados necessários, tais como audiência de justificação, com a presença de todos os interessados, tomando-se por termo o reconhecimento ao direito da terceira adquirente, deve-se dar provimento ao recurso, determinando a expedição do mandado de averbação pleiteado.

Pelo exposto, dou provimento ao recurso, para determinar a expedição de mandado de averbação para o Cartório de Registro de Imóveis de Guarapari/ES, para constar a Sr.ª Cristianne DAnne Cerqueira como proprietária do bem e devendo ela arcar com todas as despesas da transferência.

Custas recursais, ex lege.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Armando Freire e Eduardo Andrade.

Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Data: 05/03/2015 - 09:41:20   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico - 04/03/2015
Extraído de Sinoreg/MG

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