APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUÉIS - CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - CONDOMÍNIO ENTRE OS COPROPRIETÁRIOS...

10/01/2017

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUÉIS - CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - CONDOMÍNIO ENTRE OS COPROPRIETÁRIOS - POSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL PROPORCIONAL AO QUINHÃO - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - INEXISTÊNCIA

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE COBRANÇA DE ALUGUÉIS - CESSÃO DE DIREITOS HEREDITÁRIOS - CONDOMÍNIO ENTRE OS COPROPRIETÁRIOS - POSSIBILIDADE DE ARBITRAMENTO DE ALUGUEL PROPORCIONAL AO QUINHÃO - LITIGÂNCIA DE MÁ-FÉ - INEXISTÊNCIA

- Os bens que compõem o espólio são um todo unitário, equiparando-se a um condomínio.

- Cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou.

- Qualquer coproprietário pode pleitear pagamento de aluguel de quota parte de imóvel comum utilizado ao outro coproprietário.

- Na ausência de comprovação de que a parte tenha procedido de modo temerário processualmente, ou faltado com lealdade e boa-fé, deve-se afastar a aplicabilidade da multa por litigância de má-fé.

Apelação Cível nº 1.0701.14.008437-0/001 - Comarca de Uberaba - Apelante: Gilmara Silva Ribeiro - Apelado: espólio de Fábio de Oliveira representado pela inventariante Fabiana de Oliveira Andrade - Relator: Des. Luiz Carlos Gomes da Mata

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 13ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar parcial provimento à apelação.

Belo Horizonte, 20 de outubro de 2016. - Luiz Carlos Gomes da Mata - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. LUIZ CARLOS GOMES DA MATA - Versa o presente embate sobre recurso de apelação interposto por Gilmara Silva Ribeiro, em face da sentença proferida pela ilustre Juíza de Direito da 3ª Vara Cível da Comarca de Uberaba, Dra. Régia Ferreira de Lima, nos autos da ação de despejo ajuizada por espólio de Fábio de Oliveira, que julgou parcialmente procedente o pedido inicial para:

"[...] condenar a locatária Gilmara da Silva Ribeiro ao pagamento dos respectivos aluguéis mensais no valor de R$1.400,00 (mil e quatrocentos reais), corrigidos na forma entabulada no contrato, devidos desde 01.10.2011, acrescidos de correção monetária a partir da data de seu respectivo vencimento e juros de mora de 1% ao mês" (f. 330-v.).

Alega a apelante, f. 348/358, que restou provado que todos os aluguéis foram pagos. Disse que, mesmo reconhecendo o pagamento, a Juíza sentenciante a condenou ao pagamento dos aluguéis desde 01.10.2011. Afirma que não são devidos os aluguéis a partir de novembro de 2012, uma vez que adquiriu os direitos de meação de Teresina Collengui de Oliveira e de herança de Gilberto de Oliveira (espólio-autor). Diz que não faz sentido pagar aluguel daquilo que é seu. Argumenta que ocupa 43,47% da área e que o restante é ocupado por outro inquilino. Afirma que a decisão recorrida deixou de analisar o pedido de condenação do espólio apelado em litigância de má-fé.

Requer o provimento do recurso, julgando-se improcedente o pedido inicial e condenando o apelado ao pagamento de multa por litigância de má-fé.

Preparo realizado, conforme f. 362.

Contrarrazões, f. 367/382.

É o relatório. Decido.

Conheço do recurso de apelação, uma vez que presentes os pressupostos de admissibilidade.

Extrai-se dos autos que o espólio de Fábio de Oliveira (apelado), representado pela inventariante, Fabiana de Oliveira Andrade, ajuizou a presente ação em desfavor de Gilmara Silva Ribeiro (apelante), alegando que, dentre os bens deixados por Fábio de Oliveira, encontra-se um imóvel não residencial, na Avenida Prudente de Morais nº 733/739, Bairro Abadia, Cidade de Uberaba/MG. Disse que o referido imóvel se encontra locado à ora apelante, por meio de contrato escrito e com prazo determinado, a partir de 5 de outubro de 2011, no valor de R$1.400,00 (mil e quatrocentos reais). Afirmou que a apelante nunca pagou os aluguéis, perfazendo um débito no valor de R$57.239.63 (cinquenta e sete mil duzentos e trinta e nove reais de sessenta e três centavos).

Citada para compor a lide, a apelante apresentou sua defesa às f. 40/45. Disse que o objeto da locação corresponde a 43,47% de toda a área do imóvel. Afirma que, em 29.10.2012, adquiriu os direitos de meação de Teresina Collengui de Oliveira e de herança de Gilberto de Oliveira (espólio-autor), constituídos de 58,33% dos bens da herança do espólio-autor, e que são os imóveis da Rua Prudente de Morais, cuja parte está locada a ela, e da Rua Vigário Carlos. Argumentou que, como adquiriu os direitos de meação e herança, o que se discute, na presente ação, são os aluguéis vencidos até o dia 28 de outubro de 2012.

A sentença recorrida foi proferida às f. 327/331. Ao julgar o pedido parcialmente procedente, a ilustre Juíza fundamentou que:

"[...] antes do registro do formal de partilha não há que se falar em aquisição da qualidade de proprietária pela cessionária, que até então apenas assume a condição de coerdeira de bens considerados indivisíveis e comuns.

Assim sendo, em havendo contrato de locação que garante a posse da cessionária sobre bem pertencente ao espólio, entendo que são devidos os respectivos alugueres, na forma anteriormente ajustada, haja vista que a situação de condomínio de bens que compõe a herança autoriza os demais herdeiros a buscarem frutos decorrentes da utilização exclusiva do bem por um herdeiro" (f. 329-v.).

Entendido o caso e, após analisar com acuidade os autos, tenho que, ainda que sejam poucos, há reparos a serem feitos na respeitável sentença.

Como se sabe, é possível que, aberta a sucessão, o herdeiro disponha de seus direitos hereditários, no todo ou em parte, mediante cessão por escritura pública. A alienação de direitos através de cessão pode ser feita antes ou no curso do inventário, desde que inexista a cláusula testamentária de inalienabilidade.

Porém, a cessão de direitos hereditários não garante segurança absoluta para o cessionário, pois o imóvel especificado pode, inclusive, não ser transmitido, dada a incerteza de alcance das forças da herança.

Como ressaltado pela ilustre Magistrada de primeira instância, a validade da cessão de direitos havida no caso em julgamento já foi discutida neste Tribunal de Justiça, quando ficou decidido que eventual debate acerca da nulidade do negócio jurídico deveria ser objeto de ação própria (1.0701.10.005816-6/001); permitindo-se, assim, a habilitação da apelante nos autos do inventário.

Considerando que a partilha ainda não foi realizada, os bens que compõem o espólio são, na forma prevista pelo art. 1.791 do Código Civil, um todo unitário, equiparando-se a um condomínio. Portanto, cada condômino responde aos outros pelos frutos que percebeu da coisa e pelo dano que lhe causou (art. 1.319 do Código Civil). Isso significa que qualquer coproprietário pode pleitear pagamento de aluguel de quota parte de imóvel comum utilizado ao outro coproprietário.

Sobre o tema, a doutrina ensina que:

``Consequências da utilização dos frutos da coisa comum. Os condôminos poderão usar da coisa comum, retirando seus frutos, sendo que cada um responderá perante aos outros pelas vantagens ou frutos que vier a perceber, sem a devida autorização, bem como pelos prejuízos que lhes causar. Assim, se um deles habitar a casa comum, deverá pagar aos demais a título de aluguel a parte correspondente ao quinhão de cada um'' (DINIZ, Maria Helena. Código Civil anotado. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1999, p. 517).

Nesse sentido, a jurisprudência orienta que:

"Apelação cível. Ação de cobrança. Condomínio sobre imóvel. Uso exclusivo de um dos condôminos. Pagamento de aluguel devido. - Estando um dos herdeiros usufruindo exclusivamente do imóvel deixado pela falecida, deverá arcar com o pagamento ao outro herdeiro e proprietário de cota parte do bem, do aluguel correspondente" (TJMG - Apelação Cível nº 1.0701.12.031666-9/001, Relator Des. Wagner Wilson, 16ª Câmara Cível, j. em 10.07.2014, p. em 21.07.2014).

E também:

``Agravo de instrumento. Direito das sucessões e processual civil. Abertura de inventário. Substituição de inventariante. Necessidade de observância do procedimento previsto no art. 996 do CPC. Ausência de instauração do incidente de remoção. Pretensão insubsistente. Contraprestação pelo uso exclusivo do imóvel por um dos herdeiros. Cabimento. Recurso não provido. - 1. A medida cabível em caso de eventual desídia do inventariante é a instauração de incidente de remoção - que pode ser feita até mesmo de ofício pelo julgador -, não se afigurando possível deduzir a pretensão nos próprios autos do inventário, notadamente quando não observadas as garantias do contraditório e da ampla defesa. 2. Inobservado o procedimento previsto no art. 996 do CPC, apresenta-se insubsistente a pretensão dos agravantes de substituir a inventariante. 3. A utilização exclusiva, por um único herdeiro, de imóvel integrante do espólio, gera o direito à contraprestação pecuniária para os demais quando estes se opõem à utilização gratuita do bem. 4. Recurso a que se nega provimento (TJMG - Agravo de Instrumento Cível nº 1.0319.05.021987-6/001, Relatora Des.ª Áurea Brasil, 5ª Câmara Cível, j. em 16.10.2014, p. em 24.10.2014).

No caso em julgamento, da escritura pública de f. 47/47-v. se extrai que a apelante recebeu 58,33% dos direitos de herança do espólio apelado; em sendo assim, os aluguéis não podem ser cobrados no valor original do contrato. Enquanto não realizada a partilha, são realmente devidos aluguéis pela utilização do imóvel, porém, o valor deve ser equivalente ao percentual não cedido, ou seja, 41,67%.

Casos semelhantes já foram assim decididos por este Tribunal:

``Apelação cível. Ação ordinária. Arbitramento de aluguéis. Inovação recursal. Ordem pública. Legitimidade passiva. Teoria da asserção. Correspondência do direito invocado com a conduta praticada pelo requerido. Herança. Condomínio. Utilização exclusiva do imóvel. Aluguel proporcional. - Resta afastada a alegação de inovação recursal em virtude de argüição de matéria de ordem pública, que poderia ser analisada inclusive de ofício. - A configuração de legitimidade passiva, nos moldes da teoria da asserção, configura a análise da correspondência entre as partes processuais e os titulares da relação de direito material afirmada em juízo, em conformidade com as narrativas autorais, superficialmente, `sem adentrar no mérito'. - A ocupação exclusiva por parte de alguns dos herdeiros condôminos do imóvel objeto da herança enseja o pagamento de valor a título de aluguel correspondente à cota-parte do sucessor que se opõe à utilização privativa'' (TJMG - Apelação Cível nº 1.0694.13.001977-1/001, Relatora: Des.ª Mariângela Meyer, 10ª Câmara Cível, j. em 23.06.2015, p. em 22.07.2015).

``Direito civil. Imóvel mantido em condomínio por herdeiros. Uso exclusivo. Possibilidade de arbitramento de aluguel proporcional ao quinhão. Acessão. Aluguel arbitrado tendo como base o terreno e as edificações. Tendo sido comprovado que os autores são proprietários de 50% de 1/5 do imóvel descrito na inicial e que os réus estão em sua posse exclusiva, dúvida não há de que estes devem pagar aos autores os aluguéis pelo uso exclusivo da coisa comum. Os aluguéis a serem arbitrados devem tomar como base o terreno com suas edificações, isto porque uma das formas de aquisição da propriedade se dá pela acessão, que, por sua vez, pode ocorrer por meio de plantações ou construções em imóveis alheios. O aluguel deve ser proporcional ao quinhão de cada herdeiro. Recurso provido'' (TJMG - Apelação Cível nº 1.0016.11.002665-1/001, Relator Des. Cabral da Silva, 10ª Câmara Cível, j. em 22.10.2013, p. em 01.11.2013).

Registro que os recibos de f. 75/87 demonstram o pagamento dos aluguéis entre outubro de 2011 (quando teve início o contrato de aluguel) e novembro de 2012 (quando ocorreu a cessão de direitos hereditários), o que significa que, até a cessão, não houve inadimplência e que os aluguéis foram pagos no valor total, qual seja R$1.400,00 (mil e quatrocentos reais).

Nesse contexto, a decisão recorrida merece parcial reforma, visto que são devidos os aluguéis após novembro de 2012, os quais deverão ser calculados obedecendo ao percentual indicado, ou seja, 41,67% do valor original do contrato de locação (R$1.400,00 - mil e quatrocentos reais), com as devidas atualizações.

Ressalto que os valores pagos no decorrer da demanda, cujos recibos encontram-se acostados aos autos, deverão ser descontados.

Por fim, quanto à ausência de aplicação da multa por litigância de má-fé, tenho que razão não assiste à apelante. O ajuizamento desta ação era um direito do espólio apelado, que buscou garantir o recebimento dos aluguéis sobre o imóvel locado. Não há provas de que o Espólio tenha procedido de modo temerário processualmente, nem que tenha faltado com lealdade e boa-fé a justificar o deferimento em questão. Em sendo assim, não deve ser aplicada a penalidade.

Diante disso, dou parcial provimento ao recurso de apelação, para reformar parcialmente a sentença e reduzir a condenação imposta para que os aluguéis devidos pela apelante sejam calculados, a partir de novembro de 2012, no percentual de 41,67% do valor original do contrato de locação (R$1.400,00 - mil e quatrocentos reais), descontado aquilo que já foi pago durante da demanda. Mantida a forma de correção dos valores imposta pela sentença.

Diante do novo cenário, redistribuo os ônus da sucumbência, devendo o espólio apelado o pagamento de 70% das custas do processo, inclusive as recursais, e os 30% restantes pela apelante. Os honorários de sucumbência deverão ser calculados ao percentual de 20% sobre o valor apurado da condenação, na proporção também de 70% para o espólio apelado e 30% para a apelante. Devem ser observadas as regras de suspensão da exigibilidade em relação ao apelado, tendo em vista os benefícios da Justiça Gratuita que lhe foram deferidos em primeira instância, f. 30.

É como voto.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores José de Carvalho Barbosa e Newton Teixeira Carvalho.

Súmula - DERAM PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO.

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Serjus

 

 

 

 

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