Artigo: Escritura Pública de Inventário com Testamento - Rodrigo Reis Cyrino

Artigo: Escritura Pública de Inventário com Testamento - Rodrigo Reis Cyrino

Publicado em 03/02/2016
Por Rodrigo Reis Cyrino*

É possível a lavratura de uma escritura pública de inventário mesmo com a existência de testamento? Entendemos que sim, pois trata-se de procedimento que visa alcançar a desjudicialização nos casos de inventário e partilha por escritura pública mesmo que haja testamento, mas que foi processada a ação de abertura e cumprimento de testamento, com a necessária participação ministerial e judicial ou nos casos de testamento caduco, revogado, quando todas as partes estejam de pleno acordo que o inventário seja processado na via extrajudicial, devendo todos assinar o ato notarial, quando o testamento não envolver questões patrimoniais ou ainda quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento.


Vale destacar que no Estado da Paraíba a Corregedoria Geral da Justiça entendeu pela possibilidade de lavratura de escritura de Inventário e Partilha, mesmo havendo testamento, desde que processada ação de abertura e cumprimento de testamento, in verbis:


Provimento CGJ nº 12/2014 – Paraíba

Diante da expressa autorização do juízo sucessório competente nos autos da ação de abertura e cumprimento de testamento, sendo' todos os interessados capazes e concordes, poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública, a qual constituirá título hábil para o registro imobiliário.

Parágrafo único. Poderá fazer-se o inventário e a partilha por escritura pública também nos casos de testamento revogado ou caduco ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento, e observada a capacidade e a concordância dos herdeiros.


Assim, segundo os princípios insertos na Lei 11.441/2007, cuja edição foi inspirada na perspectiva da desjudicialização dessas matérias, quando não houver risco potencial lesivo aos relevantes interesses que podem estar subjacentes nas questões atinentes à divisão dos bens, a norma editada por aquele Órgão Correicional, está em completa harmonia com o atual sistema jurídico, não colidindo com os dispositivos da Lei 11.441/2007.

Com essa possibilidade, os resultados práticos serão benéficos aos usuários em geral, pois possibilitará a solução de suas questões na esfera extrajudicial, o que contribuirá também para desafogar o Poder Judiciário, na medida do possível, evitando o início de processos sem qualquer litígio.


Ratificando essa posição, o Enunciado nº 16, do IBDFAM - Instituto Brasileiro de Direito de Família e o Enunciado nº 600, da VII Jornada de Direito Civil, também autorizam os Cartórios de Notas a lavrarem escrituras públicas de inventário mesmo que o falecido haja deixado testamento. Os enunciados citados dispõem que:


Enunciado 16, IBDFAM. Mesmo quando houver testamento, sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial.

_______________________________________________

ENUNCIADOS APROVADOS NA VII JORNADA DE DIREITO CIVIL

(Brasília/DF, 28 e 29 de setembro de 2015)

COORDENADOR GERAL: RUY ROSADO
COORDENADOR CIENTÍFICO: ROBERTO ROSAS

DIREITO DE FAMÍLIA E SUCESSÕES
COORDENADOR: OTAVIO LUIZ RODRIGUES JUNIOR


ENUNCIADO 600 – Após registrado judicialmente o testamento e sendo todos os interessados capazes e concordes com os seus termos, não havendo conflito de interesses, é possível que se faça o inventário extrajudicial. Parte da legislação: art. 610, § 1º, do Código de Processo Civil e Lei n. 13.105, de 16/3/2015



Além disso, em pesquisa ao tema, observei que vários Códigos de Normas autorizam que os Tabeliães de Notas possam lavrar as referidas escrituras de inventário e partilha, quando se verificar que mesmo havendo testamento, foi processada ação de abertura e o seu cumprimento, quando o testamento estiver revogado, caduco ou quando todas as partes estiverem de acordo com a lavratura da escritura pública de inventário e assinarem o ato, tais como:


RIO DE JANEIRO:

PROVIMENTO CGJ Nº 16/2014

O Desembargador VALMIR DE OLIVEIRA SILVA, Corregedor-Geral da Justiça do Estado do Rio de Janeiro, no uso de suas atribuições legais e de acordo com o que dispõe o artigo 44, XX do Código de Organização e Divisão Judiciárias do Estado do Rio de Janeiro;

CONSIDERANDO que cabe à Corregedoria Geral da Justiça o estabelecimento de medidas para melhorar a prestação dos Serviços Extrajudiciais;

CONSIDERANDO a necessidade de constante adequação dos serviços prestados pelas Serventias extrajudiciais no âmbito do Estado do Rio de Janeiro;

CONSIDERANDO a necessidade de melhor interpretação das regras insertas na Lei Federal n° 11.441/2007, no que tange à proposta de desjudicialização por intermédio da lavratura de escrituras de divórcio, inventário e partilha;

CONSIDERANDO as propostas apresentadas pela Associação dos Notários e Registradores do Estado do Rio de Janeiro – ANOREG/RJ, visando ao melhor atendimento dos usuários dos Serviços extrajudiciais;

CONSIDERANDO a orientação normativa que já vem sendo adotada pelas Corregedorias Gerais da Justiça de outros Estados da Federação;

CONSIDERANDO o decidido no processo n° 2013-039883;

RESOLVE:

Art. 1º - Acrescentar ao artigo 297 da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da Justiça – Parte Extrajudicial os §§ 1°, 2° e 3°, com a seguinte redação:

Art. 297. (...)

§ 1°. Será permitida a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos detestamento revogado ou caduco, ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento.

§ 2°. Nas hipóteses previstas no parágrafo anterior, o Tabelião solicitará, previamente, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário deverá ser feito judicialmente.

§ 3°. Sempre que o Tabelião tiver dúvida a respeito do cabimento da escritura de inventário e partilha, nas situações que estiverem sob seu exame, deverá suscitá-la ao Juízo competente em matéria de registros públicos.

Art. 2º - Acrescentar ao artigo 310 da Consolidação Normativa da Corregedoria Geral da Justiça – Parte Extrajudicial os §§ 1° e 2°, com a seguinte redação:

Art. 310. (...)

§ 1°. Havendo filhos menores, será permitida a lavratura da escritura, desde que devidamente comprovada a prévia resolução judicial de todas as questões referentes aos mesmos (guarda, visitação e alimentos), o que deverá ficar consignado no corpo da escritura.

§ 2°. Nas hipóteses em que o Tabelião tiver dúvida a respeito do cabimento da escritura de separação ou divórcio, diante da existência de filhos menores, deverá suscitá-la ao Juízo competente em matéria de registros públicos.

Art. 3º - Este Provimento entra em vigor na data de sua publicação.

Rio de Janeiro, 13 de março de 2014.

Desembargador VALMIR DE OLIVEIRA SILVA
Corregedor-Geral da Justiça



SÃO PAULO:
A Corregedoria Geral da Justiça do Estado de São Paulo editou o Provimento CG Nº 40/2012, alterando as Normas de Serviço para manifestar expressamente o entendimento que ora se busca sustentar. 
O mencionado Provimento alterou o Capítulo XIV das Normas de Serviço da Corregedoria Geral da Justiça, que atualmente estabelece: “129. É possível a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos de testamento revogado ou caduco ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento. 129.1. Nessas hipóteses, o Tabelião de Notas solicitará, previamente, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário far-se-á judicialmente” (grifo nosso).

MINAS GERAIS:
PROVIMENTO Nº 260/CGJ/2013
Codifica os atos normativos da Corregedoria-Geral de Justiça do Estado de Minas Gerais relativos aos serviços notariais e de registro.


Art. 195. A escritura pública de inventário e partilha conterá:


(...)


Parágrafo único. É possível a lavratura de escritura pública de inventário e partilha nos casos de testamento revogado, declarado nulo ou caduco ou, ainda, por ordem judicial.

RIO GRANDE DO SUL:
PROVIMENTO Nº 32/06-CGJ
Seção II - Disposições referentes à lavratura de escrituras de inventário e partilha
(...)

Art. 297. A escritura pública de inventário e partilha conterá a qualificação completa do autor da herança; o regime de bens do casamento; pacto antenupcial e seu registro imobiliário, se houver; dia e lugar em que faleceu o autor da herança; data da expedição da certidão de óbito; livro, folha, número do termo e unidade de serviço em que consta o registro do óbito, além da menção ou declaração dos herdeiros de que o autor da herança não deixou testamento e outros herdeiros, sob as penas da lei.

§ 1°. Será permitida a lavratura de escritura de inventário e partilha nos casos de testamento revogado ou caduco, ou quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento.

§ 2°. Nas hipóteses previstas no parágrafo anterior, o Tabelião solicitará, previamente, a certidão do testamento e, constatada a existência de disposição reconhecendo filho ou qualquer outra declaração irrevogável, a lavratura de escritura pública de inventário e partilha ficará vedada e o inventário deverá ser feito judicialmente.

§ 3°. Sempre que o Tabelião tiver dúvida a respeito do cabimento da escritura de inventário e partilha, nas situações que estiverem sob seu exame, deverá suscitá-la ao Juízo competente em matéria de registros públicos.
(...)


Ante o exposto, concluo que a edição de provimentos pelas Corregedorias Gerais de Justiça, para possibilitar a lavratura de escritura pública de inventário mesmo com a existência de testamento, é medida salutar, nos seguintes casos: 1) quando foi processada a ação de abertura e cumprimento de testamento, com a necessária participação ministerial e judicial; 2) nos casos de testamento caduco; 3) nos casos de testamento revogado; 4) quando todas as partes estejam de pleno acordo que o inventário seja processado na via extrajudicial, devendo todos assinar o ato notarial; 5) quando o testamento não envolver questões patrimoniais 6) quando houver decisão judicial, com trânsito em julgado, declarando a invalidade do testamento
.

*Rodrigo Reis Cyrino
Tabelião de Notas do Cartório do 2º Ofício - Tabelionato de Linhares - ES
Membro da Comissão de Segurança e Tecnologia da Comissão de Assuntos Americanos da União Internacional do Notariado - UINL
Vice-presidente regional do Sudeste da Diretoria do Colégio Notarial Federal - Conselho Federal
Diretor do CNBPrev
Presidente do Colégio Notarial do Brasil - Seção Espírito Santo
Diretor do Tabelionato de Notas do Sindicato dos Notários e Registradores do Espírito Santo - SINOREG-ES
Mestre em Direito Estado e Cidadania
Pós Graduado em Direito Privado e Direito Processual Civil
Professor de Direito Público na Faculdade Faceli
Palestrante em Direito Notarial e Registral
Autor de diversos artigos
Email: cartorioreis@gmail.com
_____________________________________________________________________________________

Extraído de Colégio Notarial do Brasil


Notícias

Proposta de alteração no Código Civil não muda status jurídico dos animais

SERES COISIFICADOS Proposta de alteração no Código Civil não muda status jurídico dos animais José Higídio 26 de março de 2024, 8h51 De acordo com a proposta da relatoria-geral, “os animais, objetos de direito, são seres vivos sencientes e passíveis de proteção jurídica própria, em virtude da sua...

Como fica a divisão dos bens em uma separação?

Como fica a divisão dos bens em uma separação? Francisco Gomes Júnior Antes de casar ou unir-se, defina o regime de bens e faça acordos antenupciais para evitar disputas na separação. segunda-feira, 25 de março de 2024 Atualizado às 07:58 Ultimamente, com a notícia de diversos casos de famosos...

Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres

Casamento em cartório oficializa amor entre mulheres 22 de março de 2024 - Notícias CNJ / Agência CNJ de Notícias Contar com a segurança do “papel passado” para oficializar a união levou um casal de mulheres a tomar a decisão mais importante em pouco mais de dois anos de vida em comum: casar...

Você sabia que precatório de credor falecido é herança?

Você sabia que precatório de credor falecido é herança? Laís Bianchi Bueno Os precatórios são dívidas governamentais decorrentes de várias situações. Após o falecimento do titular, são automaticamente transmitidos aos herdeiros de acordo com o Código Civil. quarta-feira, 20 de março de...

Imóvel de família pode ser penhorado para pagamento da própria reforma

PENHORABILIDADE RETROALIMENTANTE Imóvel de família pode ser penhorado para pagamento da própria reforma Danilo Vital 19 de março de 2024, 14h33 Essa exceção está no artigo 3º, inciso II, da mesma lei. A lógica é impedir que essa garantia legal seja deturpada como artifício para viabilizar a reforma...

Modernidade e sucessão: como funciona a herança digital

OPINIÃO Modernidade e sucessão: como funciona a herança digital Rodrigo Chanes Marcogni 18 de março de 2024, 18h23 Obviamente que temos que considerar aqui que ao estabelecerem suas regras e políticas de uso as empresas que hospedam as redes sociais o fazem imbuídas no princípio constitucional do...