Declarada ineficaz a venda de fração ideal à terceiro por ausência de notificação prévia dos coproprietários, estes poderão adquirir o quinhão pagando o valor declarado a menor na escritura firmada anteriormente com o terceiro

há 14 horas

Superior Tribunal de Justiça

Declarada ineficaz a venda de fração ideal à terceiro por ausência de notificação prévia dos coproprietários, estes poderão adquirir o quinhão pagando o valor declarado a menor na escritura firmada anteriormente com o terceiro


REsp nº 1.628.478 – MG

 

EMENTA: RECURSO ESPECIAL. CIVIL. VENDA DE QUINHÃO DE COISA COMUM INDIVISA. DIREITO DE PREFERÊNCIA. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. INOBSERVÂNCIA AO DIREITO DE PREEMPÇÃO DOS DEMAIS CONDÔMINOS. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PRÉVIA. CIÊNCIA INEQUÍVOCA QUE SE DEU APENAS COM O REGISTRO DA ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA. DISSONÂNCIA ENTRE O PREÇO DO NEGÓCIO E AQUELE ESTAMPADO NO TÍTULO TRANSLATIVO REGISTRADO EM CARTÓRIO. PRÁTICA DE PREÇO SIMULADO. ABUSO DO DIREITO. OFENSA À BOA-FÉ OBJETIVA. PREVALÊNCIA DO DOCUMENTO LAVRADO PELO TABELIÃO E LEVADO A REGISTRO. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E DESPROVIDO. 1. O propósito recursal consiste em definir, além da negativa de prestação jurisdicional: i) a forma pela qual deve se dar a notificação que viabilize o direito de preferência do condômino na aquisição de parte ideal de coisa comum indivisa; e ii) o parâmetro do valor do negócio a ser considerado para tal fim. 2. Verifica-se que o Tribunal de origem analisou todas as questões relevantes para a solução da lide, de forma fundamentada, não havendo falar em negativa de prestação jurisdicional. 3. Nos termos do art. 504 do CC/2002, é garantido ao condômino o direito de preferência na aquisição de fração ideal de coisa comum indivisa, em iguais condições ofertadas ao terceiro estranho à relação condominial, desde que o exerça no prazo de 180 (cento e oitenta) dias a contar da ciência. Tal conhecimento deve ser possibilitado pelo coproprietário alienante, em decorrência de imposição legal, através de prévia notificação, judicial, extrajudicial ou outro meio que confira aos demais comunheiros ciência inequívoca da venda e dos termos do negócio, consoante o previsto nos arts. 107 do CC/2002 e 27, in fine, da Lei n. 8.245/1991, este último aplicado por analogia. 4. Aperfeiçoada a venda (no caso imobiliária) ao terceiro, com a lavratura de escritura pública e o respectivo registro no Cartório de Registro de Imóveis, sem a devida observância ao direito de preempção, surge para os coproprietários preteridos o direito de ajuizamento de ação anulatória ou de direito de preferência c/c adjudicação compulsória, desde que o faça dentro do prazo decadencial de 180 (cento e oitenta) dias, contados do registro da escritura, cuja publicidade implica a presunção de ciência acerca da venda e das condições do negócio estampadas no título. 5. Praticado preço simulado pelas partes, fazendo constar da escritura pública preço a menor, que não reflita o valor real do negócio, deve prevalecer aquele exarado na escritura devidamente registrada para fins do direito de preferência, sendo que o registro do título (que tem como atributo dar publicidade da alienação imobiliária a toda a sociedade, conferindo efeito erga omnes) é o ato substitutivo da notificação, que deveria ter sido anteriormente remetida ao coproprietário, mas não foi, não podendo o condômino alienante valer-se da própria torpeza, a qual denota o abuso do direito infringente da boa-fé objetiva. 6. Recurso especial conhecido e desprovido.

 

É ineficaz a venda de quinhão de propriedade imobiliária realizada por um dos coproprietários à terceiro estranho ao condomínio se não houve notificação dos demais coproprietários sobre a intenção de venda. Estes podem exercer seu direito de preferência, ainda após o registro da escritura pública em nome do terceiro, pagando ao alienante o valor declarado na escritura pública, mesmo que o alienante tenha adotado preço simulado, declarando valor a menor do que o real preço do negócio.


Explica-se. Na venda de um imóvel de propriedade exercida em conjunto, o comunheiro que pretende alienar o seu quinhão a terceiro estranho ao condomínio deve dar ciência aos demais condôminos antes de efetivada a venda. Estes terão preferência na aquisição da quota desde que assim requeiram no prazo decadencial de 180 dias, depositando o preço equivalente àquele ofertado ao terceiro (art. 504 do Código Civil).


Como se vê, é proibido ao coproprietário de coisa comum indivisa vender o seu quinhão a estranhos caso outro condômino tenha interesse tanto por tanto. O alienante somente se desonera dessa obrigação legal se notificar, devida e previamente, os demais consortes e não houver manifestação no prazo legal ou houver desinteresse na aquisição.


Essa notificação deve ser, em regra, judicial ou extrajudicial, de modo expresso e com comprovante de recebimento, a fim de demonstrar a inequívoca ciência da intenção de venda.


Nada impede, contudo, que, nos termos do art. 107 do Código Civil, o conhecimento aos outros consortes se dê por meios informais, uma vez que a lei não prevê forma específica para tal ato, muito embora é dificultosa a comprovação da ciência inequívoca mediante outra prova que não seja a documental.


A validade da notificação pressupõe a informação expressa não só da intenção de venda da fração ideal de titularidade do coproprietário alienante, mas também das condições do negócio ofertadas ao terceiro, a exemplo do preço, do tempo e do modo de pagamento.


Por outro lado, a inexistência ou ausência de comprovação da prévia comunicação cria uma condição resolutiva à compra e venda realizada, pois os demais condôminos, desinformados, podem ainda exercer a opção de compra do quinhão alheado, dentro do prazo decadencial de 180 dias, mesmo que o negócio tenha sido escritura e registrado em nome de terceiro.


Assim, uma vez realizado o negócio sem a devida notificação prévia do condômino, a solução da questão somente pode se dar na via judicial, pela ação de preferência cumulada com adjudicação compulsória.


O art. 504 do Código Civil expressamente prevê que a preferência na aquisição se dê "tanto por tanto", ou seja, nos mesmos moldes em que realizada a oferta ou a venda ao estranho, referindo-se a condições iguais de oferta e igualdade de condições com terceiros.


No caso do recurso em comento, não existiu notificação do condômino alienante aos demais condôminos. O direito de preferência foi exercido pelos demais condôminos apenas após o aperfeiçoamento da venda da fração ideal do imóvel comum para terceiro estranho ao condomínio.


Na escritura de compra e venda, que foi levada à registro, consta que o quinhão foi vendido por R$ 15.000,00, sendo esse o instrumento pelo qual os demais condôminos tomaram conhecimento da venda. Os demais coproprietários alegaram que o valor declarado na escritura é o que devia ser pago por eles ao alienante para adquirirem seu quinhão na ação judicial, ao passo que o condômino alienante defende que seja considerado o valor que realmente recebeu do comprador – R$ 360.000,00.


O Superior Tribunal de Justiça concluiu que a ausência de comunicação prévia aos demais coproprietários, pelo condômino alienante, acerca da venda do seu quinhão do imóvel comum indiviso ao terceiro estranho à relação condominial, foi suprida pelo registro da escritura pública de compra e venda, iniciando-se, a partir daí, o transcurso do prazo decadencial do direito de preferência de 180 dias, porquanto presumida a ciência do negócio, nos limites das informações constantes do título levado a registro, como o fato de haver sido vendido por R$ 15.000,00.


O condômino alienante confessadamente afirmou ter lançado o preço do negócio jurídico a menor na escritura pública, não refletindo o real valor da compra e venda realizada.

Como bem notado pelo Tribunal Superior, a escritura pública é documento dotado de fé pública, fazendo prova plena das informações que nela contiverem, nos termos do art. 215, caput, do Código Civil, sobretudo com a manifestação clara de vontade das partes e dos intervenientes (art. 215, § 1º, IV, do Código Civil).


O registro da escritura pública no Cartório de Registro de Imóveis faz produzir efeitos erga omnes à compra e venda, alcançando terceiros, notadamente em virtude do atributo da publicidade.


O Superior Tribunal de Justiça entendeu que ainda que se cogite de eventual enriquecimento dos demais condôminos – em virtude da substancial diferença entre o valor efetivo do negócio, e aquele constante da escritura pública –, não se evidencia ilicitude ou ausência de causa subjacente, porquanto proveniente de conduta do próprio alienante e dos adquirentes, que adotaram preço simulado, destoante da realidade, não podendo tirar proveito da própria torpeza, se atuaram à margem da lei, com abuso do direito, notadamente porque desprovidos de boa-fé objetiva (art. 187 do Código Civil).

Leia o acórdão.

Extraído de Direito das Coisas

 

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