Jurisprudência mineira - Agravo de instrumento - Direito de família - Alimentos gravídicos

Jurisprudência mineira - Agravo de instrumento - Direito de família - Alimentos gravídicos - Art. 6º da Lei nº 11.804/2008 - Comprovação - Fixação

AGRAVO DE INSTRUMENTO - DIREITO DE FAMÍLIA - ALIMENTOS GRAVÍDICOS - ART. 6º DA LEI Nº 11.804/2008 - COMPROVAÇÃO - FIXAÇÃO - BINÔMIO NECESSIDADE/POSSIBILIDADE

- Com o advento da Lei nº 11.804/2008, especificamente das disposições contidas em seu art. 6º, para a concessão de alimentos gravídicos, basta a existência de indícios da paternidade, indícios esses que foram comprovados no caso em análise.

- Mesmo com base apenas nos elementos superficiais e iniciais que formam o instrumento probatório dos autos, os alimentos devem ser fixados na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada, nos termos do § 1º do art. 1.694 do Código Civil.

Agravo de Instrumento Cível nº 1.0024.12.333782- 6/001 - Comarca de Belo Horizonte - Agravante: F.R.S. - Agravado: F.S.C. - Relator: Des. Dárcio Lopardi Mendes

A C Ó R D Ã O

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, à unanimidade, em dar provimento ao recurso.

Belo Horizonte, 14 de março de 2013. - Dárcio Lopardi Mendes - Relator.

N O T A S T A Q U I G R Á F I C A S

DES. DÁRCIO LOPARDI MENDES - Trata-se de agravo de instrumento interposto contra decisão de f. 136-TJ, proferida pelo MM. Juiz da 5ª Vara de Família da Comarca de Belo Horizonte, que, nos autos da "ação de alimentos gravídicos" ajuizada por F.S.C., em face de F.R.S., fixou os alimentos gravídicos no valor correspondente a R$ 7.000,00 (sete mil reais).

Em razões recursais de f. 02/16, alega o agravante que as partes tiveram um namoro público de 18.01.2009 a 26.11.2012, mas instável, pois, durante o período, ocorreram vários términos; que não discorda que se relacionou amorosamente com a agravada, mas há dúvida da paternidade diante do rompimento do namoro e envolvimento da mesma com outro homem na época da concepção da criança.

Aduz que a agravada é pós-graduada em Direito Tributário e é sócia de um conhecido escritório de advocacia; que trabalha com grandes empresas e sempre disse que tinha aproximadamente retirada pró-labore em torno de R$ 4.000,00 (quatro mil reais); que a agravada exerce trabalhos extras ao escritório de que é sócia, o que lhe proporciona mais rendimentos do que o que foi alegado.

Ressalta que é cirurgião dentista e não possui qualquer especialização; que a falta de especialização somada aos crescentes convênios odontológicos e clínicas com especializações diversas prejudicaram os seus rendimentos, pois, desde 2002, vem perdendo clientela, que passou a associar-se a convênios que pagam bem menos e atendem a seus interesses; que, quando conheceu a agravada, sua situação financeira já estava em grave declínio.

Alega que não adquiriu um apartamento de R$ 225.000,00, apenas fez novação de um apartamento que possuía com sua esposa, que venderam em 20.06.2010; que ajuda com despesas pessoais como alimentação e moradia a sua ex-esposa; que possuía um veículo quitado, todavia, devido ao alto consumo e gastos com a manutenção, houve por bem vendêlo; que possui, pendentes de pagamento, três financiamentos no Banco do Brasil, todos no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais). Por fim, ressalta que resta demonstrado que sua realidade financeira é bem inferior à narrada pela agravada, que maquiou seus bens.

Com essas considerações, requer a antecipação dos efeitos da tutela para reformar a decisão, determinando o indeferimento da liminar que fixou os alimentos gravídicos no valor de R$ 7.000,00 (sete mil reais), e, caso não seja esse o entendimento, alternativamente que ocorra a minoração dos alimentos gravídicos, descontados o valor do parto de R$ 3.000,00 (três mil reais).

O recurso foi recebido às f. 227/230-TJ, em seu efeito ativo.

Informações prestadas pelo MM. Juiz a quo à f. 236- TJ.

A agravada apresentou contraminuta às f. 238/253- TJ, arguindo preliminar de não conhecimento do recurso ante a sua intempestividade.

A douta Procuradoria-Geral de Justiça opinou, às f. 317/324-TJ, pelo provimento parcial do recurso. Quanto à preliminar arguida pela parte agravante, qual seja a intempestividade do presente recurso, tenho que a mesma não deverá prosperar.

A decisão agravada, de f. 136/136-v.-TJ, foi prolatada em dezembro de 2012, publicada em 13.12.2012.

Verifica-se que o mandado de citação expedido foi devidamente cumprido e juntado à f. 138-v.-TJ no dia 18.12.2012.

Por conseguinte, o presente recurso foi interposto no dia 07.01.2013, ou seja, dentro do prazo legal, considerando que o recesso forense suspende a contagem do prazo recursal.

Aliás, nunca será demais enfatizar a orientação firmada pelo Superior Tribunal de Justiça no sentido de que há a suspensão da contagem dos prazos durante o período do "recesso forense".

Nesse sentido, trago à baila o seguinte julgado: "Agravo regimental. Prazo recursal. Férias forenses. Suspensão. CPC, art. 179. Inaplicabilidade. Feriado. CPC, art. 184, § 1º. - As férias e o ‘recesso’ forense suspendem os prazos, ao contrário dos feriados, que apenas os prorrogam. Suspenso o prazo recursal, a contagem recomeça no primeiro dia útil seguinte ao término das férias forenses. Os feriados não alteram a contagem do prazo quando não coincidirem com o dia do início ou fim do prazo para recurso" (AgRg no Ag 481013/RS - Rel. Min. Humberto Gomes de Barros - DJ de 29.11.2004, p. 317).

Sendo assim, rejeito a preliminar.

Inicialmente, cumpre ressaltar algumas considerações a respeito da Lei nº 11.804/08, que disciplina a matéria em questão, qual seja os alimentos gravídicos. Essa lei entrou em vigor no dia 5 de novembro de 2008, com a seguinte redação:

“Art. 1º Esta Lei disciplina o direito de alimentos da mulher gestante e a forma como será exercido. Art. 2º Os alimentos de que trata esta Lei compreenderão os valores suficientes para cobrir as despesas adicionais do período de gravidez e que sejam dela decorrentes, da concepção ao parto, inclusive as referentes à alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, além de outras que o juiz considere pertinentes. Parágrafo único. Os alimentos de que trata este artigo referem-se à parte das despesas que deverá ser custeada pelo futuro pai, considerando-se a contribuição que também deverá ser dada pela mulher grávida, na proporção dos recursos de ambos.

Art. 3º (VETADO).

Art. 4º (VETADO).

Art. 5º (VETADO).

Art. 6º Convencido da existência de indícios da paternidade, o juiz fixará alimentos gravídicos que perdurarão até o nascimento da criança, sopesando as necessidades da parte autora e as possibilidades da parte ré.

Parágrafo único. Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão”.

A aludida norma constitui uma verdadeira evolução no Direito Positivo Nacional, uma vez que é patente o fato de que a gravidez acarreta elevadas despesas com alimentação especial, assistência médica e psicológica, exames complementares, internações, parto, medicamentos e demais prescrições preventivas e terapêuticas indispensáveis, a juízo do médico, entre outras, sendo que, anteriormente à referida lei, a gestante não tinha alternativa, senão arcar com tudo sozinha, para, depois do nascimento do bebê, ajuizar uma investigação de paternidade

com vistas a obter alguma ajuda financeira na mantença do filho.

Antes de sua edição, por algumas vezes, a Justiça já havia se manifestado de acordo com a concessão de alimentos a gestantes, com base no princípio da paternidade responsável, bem como nas demais disposições legais que resguardam o direito à vida. Mas fato é que doutrina e jurisprudência sempre divergiram acerca do tema.

No meu entendimento, penso que a Lei nº 11.804 encontra supedâneo justamente no art. 2º do CC, que resguarda os direitos do nascituro, verbis:

"A personalidade civil da pessoa humana começa com o nascimento com vida; mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro".

Consoante lição de Fabrício Zamprogna Matiello, “Entre os direitos do nascituro encontram-se os relativos à vida (daí a punição à prática do aborto), à filiação, à herança do pai que falece antes de nascer o herdeiro concebido, a doações feitas em seu favor e a todas as prerrogativas derivadas da personalidade, sujeita à condição suspensiva consubstanciada pelo efetivo nascimento com vida. Não se confirmando este, nenhum direito terá sido adquirido pelo ente, que não se torna pessoa e, portanto, também não transmite os direitos que dependiam do fato biológico para se concretizarem” (Código Civil comentado. 3. ed. São Paulo: Editora LTR, p. 22).

Atualmente, com o advento da lei supracitada, especificamente das disposições contidas em seu art. 6º, para a concessão de alimentos gravídicos, basta a existência de indícios da paternidade, indícios esses que foram comprovados no caso em análise pelo próprio agravante à f. 03-TJ, quando afirma que, "primeiramente, cumpre esclarecer que as partes tiveram somente um namoro público, de 18.01.2009 a 26.11.2012" (sic - f. 03-TJ), bem como pelas fotos acostadas às f. 255/256-TJ.

No entanto, é imperioso ressaltar que, mesmo quando da fixação dos alimentos gravídicos, deve o julgador atentar-se a determinados critérios pautados na lei.

Nessa monta, o § 1º do art. 1.694 do Código Civil estabelece que os alimentos devem ser fixados "na proporção das necessidades do reclamante e dos recursos da pessoa obrigada", o que significa dizer que o alimentando tem o direito de receber o necessário ao seu desenvolvimento, mas sempre dentro do razoável e com especial atenção à necessidade de quem pede e à possibilidade do obrigado.

É evidente o fato de que, na fixação dos alimentos provisórios, deve-se agir com cautela na determinação de seu valor, com base nos elementos superficiais e iniciais que formam o instrumento probatório dos autos, obedecendo-se sempre ao princípio contido no binômio necessidade/possibilidade.

Corroborando tal entendimento, leciona Fabrício Zamprogna Matiello (in Código Civil comentado. 2. ed. São Paulo: Editora LTR, p. 1.110):

"A fixação da prestação alimentar não depende apenas da verificação da necessidade do reclamante. É imprescindível, também, que a pessoa de quem se reclama o cumprimento do dever tenha condições de fornecê-la, sem que disso resulte a falta de recursos mínimos para manter a si mesmo e à respectiva família com dignidade. A lei não exige o autoflagelo e o sacrifício em nome do bem-estar alheio; pretende, isto sim, que a reclamante tenha como viver e que o obrigado possa alcançar auxílio e ainda assim conservar-se num patamar razoável de vida. O que é farto na mesa deste pode ser dirigido àquele, em equação de bom senso e humanidade que supera eventuais discussões jurídicas e acadêmicas".

Assim, é necessário que se alcance um equilíbrio, mediante o qual o alimentando não receberá mais do que precisa, nem o alimentante será obrigado a pagar além do que suas condições econômicas permitam, adequando, assim, a prestação alimentar ao quadro real vivenciado pelos envolvidos.

Em análise perfunctória dos autos, observa-se que é inquestionável a necessidade alimentar, haja vista que o menor Arthur nasceu no dia 8 de janeiro de 2013, conforme declaração de nascimento acostada às f. 260/261-TJ, sendo incapaz de promover a própria subsistência, e também pelo fato de que a prestação alimentar decorre do dever inerente ao poder familiar.

Todavia, a princípio, o valor fixado pelo MM. Juiz a quo quando da prolação da decisão de f. 136/136-v.- TJ, em dezembro de 2012, de R$ 7.000,00 (sete mil reais), a título de alimentos gravídicos, encontra-se muito além das necessidades do menor. No entanto, mesmo configurada a necessidade do demandado, faz-se mister a aferição das possibilidades do alimentante.

In casu, há nos autos prova capaz de demonstrar a possibilidade de o agravante arcar com o pagamento da verba alimentar em favor do menor, considerando que exerce a profissão de cirurgião dentista, tendo, assim, uma boa capacidade financeira.

Entretanto, o valor fixado pelo MM. Juiz a quo, qual seja R$ 7.000,00 (sete mil reais), não estaria razoável, sendo nítida a possibilidade de a decisão guerreada causar lesão grave e de difícil reparação ao agravante, pois o valor fixado a título de alimentos gravídicos, a princípio, revela-se exorbitante.

Assim, tenho que a fixação dos alimentos em R$ 4.000,00 (quatro mil reais) será o mais prudente neste momento, considerando as necessidades do agravado, bem como a possibilidade do agravante.

Nesse mesmo sentido, foi o parecer explanado às f. 317/324-TJ, pela douta Procuradoria-Geral de Justiça:

"Com a devida vênia, também entendo que o valor correspondente a quatro mil reais é o que melhor atende ao trinômio necessidade, possibilidade e proporcionalidade" (sic - f. 321). Ressalta-se que, de acordo com a Lei nº 11.804/08, que disciplina sobre os alimentos gravídicos, em seu art. 6º, parágrafo único, dispõe que, "Após o nascimento com vida, os alimentos gravídicos ficam convertidos em pensão alimentícia em favor do menor até que uma das partes solicite a sua revisão".

Dessa feita, tendo em vista a comprovação da capacidade financeira do agravante, mas considerando as necessidades básicas do menor, entendo que a decisão recorrida merece reforma. Ante o exposto, dou provimento ao presente agravo de instrumento, para que a verba alimentar fixada seja reduzida para R$ 4.000,00 (quatro mil reais).

Custas recursais, ex lege.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Ana Paula Caixeta e Alvim Soares.

Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico - MG

Publicado em 29/04/2013

Extraído de Recivil

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