Para AGU, mudanças no registro civil de transexual devem preservar segurança jurídica

Para AGU, mudanças no registro civil de transexual devem preservar segurança jurídica

Publicado em: 06/06/2017

Os transexuais têm o direito de alterar o nome e o sexo no registro civil, ainda que não tenham se submetido a cirurgia de mudança de sexo. No entanto, por uma questão de segurança jurídica e interesse público, tal alteração não deve implicar o desaparecimento dos dados anteriores – uma vez que isso dificultaria, por exemplo, eventual cobrança de dívida ou responsabilização penal por atos praticados pela pessoa antes da mudança de nome.

Essa é a tese defendida pela Advocacia-Geral da União (AGU) em ação pautada para ser julgada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) na próxima quarta-feira (02/06). A ação foi ajuizada pela Procuradoria-Geral da República (PGR), que pede para que o artigo 58 da Lei nº 6.015/73 seja interpretado de modo a se reconhecer o direito dos transexuais de trocarem de nome e de sexo no registro civil, independentemente da realização de cirurgia de mudança de sexo.

A AGU encaminhou aos ministros do STF memorial no qual recomenda o provimento apenas parcial da ação. Para a Advocacia-Geral, negar aos transexuais a possibilidade de adequar os registros de nome e sexo à sua verdadeira identidade sexual psíquica, ou seja, com o gênero com o qual estão psicologicamente identificados, realmente seria uma afronta aos postulados constitucionais da dignidade da pessoa humana (artigo 1º, inciso III) e da não discriminação (artigo 3º, inciso IV).

“Impende salientar que as razões ora esposadas aplicam-se a todos os transexuais, tenham ou não se submetido ao procedimento cirúrgico. Isso porque a característica principal que singulariza os transexuais e que enseja a alteração de seus registros civis correspondem, sobretudo, a um fator psicológico, desvinculado da aparência física que ostentam”, ressalta a AGU no documento.

Desaparecimento

A Advocacia-Geral alerta, contudo, que permitir que a alteração de nome e sexo no registro seja feita sem a manutenção de qualquer referência ao antigo estado da pessoa equivaleria a uma espécie de desaparecimento civil do sujeito anterior, “o que inviabilizaria (ou ao menos causaria sérios embaraços), por exemplo, a efetivação de cobrança de débitos civis e tributários, bem como a investigação, persecução e execução penais que eventualmente recaíssem sobre o transexual em razão de atos por ele praticados anteriormente a tal alteração”. Por essa razão, a AGU entende que a manutenção, no registro alterado, de uma referência ao nome e sexo civil anteriores contribui para a segurança jurídica e “reveste-se de interesse público”.

A AGU pondera, ainda, que a mudança de nome e sexo no registro civil não pode ser feita de forma irrestrita e incondicionada, ou seja, deve observar alguns requisitos que comprovem que a transexualidade é um aspecto “irrefragável da realidade psíquica e social do indivíduo”. Nos termos propostos pela própria PGR, por exemplo, seria necessário ter mais de 18 anos e convicção, há pelo menos três anos, de pertencer ao gênero oposto ao biológico – condições que devem ser atestadas por especialistas capazes de avaliar aspectos psicológicos e médicos.

Segundo a Advocacia-Geral, a exigência de tais requisitos é especialmente necessária no caso de transexuais que ainda não fizeram cirurgia de mudança de sexo, uma vez que os que realizaram a cirurgia já precisaram atender tais condições anteriormente.

Separação de poderes

Apesar de, no mérito, defender a procedência parcial do pedido da PGR, a AGU levanta uma questão preliminar para apontar que a ação não deveria nem mesmo ser conhecida. Isso porque o dispositivo questionado (Lei nº 6.015/73) não trata especificamente de transexuais; ele apenas autoriza as pessoas em geral a substituir o nome por apelido público. Desta forma, a Advocacia-Geral entende que não é possível dar à norma uma interpretação diferente da que ela originalmente prescrevia, sob pena de o Supremo atuar como legislador, invadindo competência de outro poder.

O ministro Marco Aurélio é o relator da ação. Atua no caso a Secretaria-Geral de Contencioso, órgão da AGU responsável por representar a União no STF.

Ref.: ADI nº 4.275 – STF
.

Fonte: AGU
Extraído de Recivil

Notícias

Lacunas e desafios jurídicos da herança digital

OPINIÃO Lacunas e desafios jurídicos da herança digital Sandro Schulze 23 de abril de 2024, 21h41 A transferência de milhas aéreas após a morte do titular também é uma questão complexa. Alguns programas de milhagens já estabelecem, desde logo, a extinção da conta após o falecimento do titular, não...

TJMG. Jurisprudência. Divórcio. Comunhão universal. Prova.

TJMG. Jurisprudência. Divórcio. Comunhão universal. Prova. APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE DIVÓRCIO - COMUNHÃO UNIVERSAL DE BENS - PARTILHA - VEÍCULO - USUCAPIÃO FAMILIAR - ÔNUS DA PROVA - O casamento pelo regime da comunhão universal de bens importa na comunicação de todos os bens presentes e futuros...

Reforma do Código Civil exclui cônjuges da lista de herdeiros necessários

REPARTINDO BENS Reforma do Código Civil exclui cônjuges da lista de herdeiros necessários José Higídio 19 de abril de 2024, 8h52 Russomanno ressalta que, além da herança legítima, também existe a disponível, correspondente à outra metade do patrimônio. A pessoa pode dispor dessa parte dos bens da...

Juiz determina que valor da venda de bem de família é impenhorável

Juiz determina que valor da venda de bem de família é impenhorável Magistrado considerou intenção da família de utilizar o dinheiro recebido para adquirir nova moradia. Da Redação terça-feira, 16 de abril de 2024 Atualizado às 17:41 "Os valores decorrentes da alienação de bem de família também são...

Cônjuge não responde por dívida trabalhista contraída antes do casamento

CADA UM POR SI Cônjuge não responde por dívida trabalhista contraída antes do casamento 15 de abril de 2024, 7h41 Para o colegiado, não se verifica dívida contraída em benefício do núcleo familiar, que obrigaria a utilização de bens comuns e particulares para saná-la. O motivo é o casamento ter...