Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório

Amanda Fonseca Perrut

A indicação de bens específicos pelo testador a determinado herdeiro é possível e evita eventuais disputas sucessórias.

quinta-feira, 17 de abril de 2025
Atualizado às 09:11

É juridicamente possível atribuir bens móveis e imóveis específicos aos herdeiros por meio de testamento, sem que tal disposição testamentária seja caracterizada como legado, evitando-se, destarte, os inconvenientes inerentes ao condomínio, mesmo que este seja temporário.

Da mesma forma, tal atribuição testamentária específica antecipa a partilha, evitando-se, portanto, eventuais disputas sucessórias, mormente em relação aos bens que já estejam na posse, uso e gozo pelos herdeiros.

Tal ato de disposição encontra amparo no art. 2.014 do CC, que permite ao testador indicar bens e valores que devem compor os quinhões hereditários, desde que seja respeitada a legítima de cada herdeiro necessário (cf. art. 1.789 e § 1º do art. 1.857 do CC).

"Art. 1.789(CC). Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança."

"Art. 1.857(CC). Toda pessoa capaz pode dispor, por testamento, da totalidade dos seus bens, ou de parte deles, para depois de sua morte. § 1o A legítima dos herdeiros necessários não poderá ser incluída no testamento."

"Art. 2.014(CC). Pode o testador indicar os bens e valores que devem compor os quinhões hereditários, deliberando ele próprio a partilha, que prevalecerá, salvo se o valor dos bens não corresponder às quotas estabelecidas.

Assim sendo, não se trata de legado, mas do que a doutrina denomina de "herdeiro ex re certa".

Assim, conforme já dito acima, essa indicação de bens específicos pelo testador a determinado herdeiro tem o condão de evitar o estabelecimento de um condomínio em relação aos imóveis em que já residem. Corrobora para a legalidade do ato de disposição de última vontade os ensinamentos de José Fernando Simão, para quem:

"Este dispositivo é de grande importância para fins de planejamento sucessório e desfaz alguns equívocos comuns na concepção da legítima. Isso porque pode o testador estabelecer, por meio de um ato unilateral, quais bens comporão o quinhão hereditário de cada herdeiro, evitando-se assim um condomínio muitas vezes indesejado entre todos os herdeiros. Novamente, um exemplo de manual ajuda a compreensão da questão. Suponha que o testador tem apenas dois filhos e dois imóveis, que são dois apartamentos idênticos em um mesmo prédio. Pode o testador paga a legítima de cada filho com um apartamento evitando o condomínio entre ambos." SIMÃO, José Fernando. Comentário ao art. 2.014. In: SCHREIBER, Anderson (Coord.) et.al. Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 3 ed. rev. e atual. Rio de Janeiro, RJ: Forense, 2019. p. 2154).

Da mesma forma, a doutrina de Mauro Antonini assim preconiza:

"O art. 2.014 reforça a disposição do art. 2.018, este similar ao art. 1.776 do Código anterior. O art. 2.018 faculta ao ascendente efetuar partilha em vida, por testamento, em relação a seus descendentes. O art. 2.014 assegura ao testador, em todas as situações e não somente quando se trata de ascendente em face de descendentes, o direito de, no testamento, deliberar sobre a partilha, indicando quais bens e valores irão compor o quinhão de cada herdeiro. Essa disposição testamentária será válida se a divisão respeitar as quotas intangíveis dos herdeiros necessários. Se houver violação dessas quotas, aplicam-se as regras de redução das disposições testamentárias (arts. 1.967 e 1.968). Embora deva respeitar a legítima, o testador, ao deliberar sobre a partilha, PODERÁ ESCOLHER QUAIS OS BENS IRÃO COMPOR OS QUINHÕES DOS HERDEIROS NECESSÁRIOS. A deliberação do testador sobre a partilha fica limitada, também, pela meação do cônjuge. Relembre-se que meação não é herança. Uma vez separada a meação do cônjuge, o restante será a herança, cuja partilha poderá ser deliberada pelo testador." ANTONINI, Mauro. Comentário ao art. 2.014. In: PELUSO, Cezar (Coord.). Código Civil comentado: doutrina e jurisprudência. 3ª ed. rev. e atual. Barueri, SP: Manole, 2009. p. 2197.

Ademais, tais assertivas harmonizam-se com o art. 112 do CC, o qual assim estipula:

"Art. 112(CC). Nas declarações de vontade se atenderá mais à intenção nelas consubstanciada do que ao sentido literal da linguagem."

Na mesma linha, tem vigência in casu a regra do art. 1.898 da lei civil:

"Art. 1.899(CC). Quando a cláusula testamentária for suscetível de interpretações diferentes, prevalecerá a que melhor assegure a observância da vontade do testador."

Cabe, ainda, a ressalva de que referidos bens, antecipadamente conferidos aos herdeiros, integrarão a legitima de cada um deles para compor a efetiva partilha e a divisão igualitária da legítima conferida a eles em relação aos demais bens e direitos hereditários.

Por fim, é importante destacar que tal partilha antecipada por meio de testamento deve observar: I - a máxima igualdade possível quanto ao valor, à natureza e à qualidade dos bens; II - a prevenção de litígios futuros; III - a máxima comodidade dos coerdeiros, do cônjuge ou do companheiro, se for o caso.


Amanda Fonseca Perrut
Advogada com mais de 20 anos de experiência, é fundadora da Fonseca Perrut Advocacia, com atuação em todo o Brasil.

Fonte: Migalhas

                                                                                                                            

Notícias

Prisão cautelar ficou mais bem disciplinada

Extraído de Folha do Delegado 24 de maio de 2011 Prisão cautelar ficou mais bem disciplinada A Lei nº 12.403/2011 trouxe algumas inovações no tocante às prisões cautelares, principalmente quanto à possibilidade de medidas alternativas.Prisão cautelar ficou mais bem disciplinada Por Silvio César...

"Vício formal"

  Segunda-feira, 23 de maio de 2011 Ministro nega liminar a juiz que contesta anulação de promoção pelo CNJ     O ministro Marco Aurélio, do Supremo Tribunal Federal (STF), negou liminar requerida em Mandado de Segurança (MS 30600) pelo juiz Fernando Miranda Rocha contra ato do...

Receita Federal simplifica impressão de comprovante do CPF

Receita Federal simplifica impressão de comprovante do CPF 21/05/2011 - 16h41 Economia Wellton Máximo Repórter da Agência Brasil Brasília – O contribuinte que emitir o Cadastro de Pessoa Física (CPF) não precisará mais entrar no Centro de Atendimento Virtual da Receita (e-CAC) para imprimir o...

Jurisprudência: União Homoafetiva. Entidade Familiar. Partilha

Extraído de AnoregBR   Jurisprudência: União Homoafetiva. Entidade Familiar. Partilha.        Seg, 23 de Maio de 2011 07:58 A Seção, ao prosseguir o julgamento, por maioria, entendeu ser possível aplicar a analogia para reconhecer a parceria homoafetiva como uma das...

Freio de arrumação

  Nova composição pode mudar os rumos do CNJ Por Rodrigo Haidar   O Supremo Tribunal Federal aprovou, na última quarta-feira (18/5), os nomes dos dois juízes escolhidos pelo presidente da corte, ministro Cezar Peluso, para compor o Conselho Nacional de Justiça nas vagas reservadas à...