Popularização da advocacia eletrônica

Tecnologias abrem mercado para advogados autônomos

Por João Ozorio de Melo

A advocacia eletrônica ou e-advocacia, conhecida nos Estados Unidos como e-Lawering, é uma alternativa viável para qualquer advogado, devidamente qualificado, que não encontra um emprego decente, que é contratado mas está insatisfeito no trabalho e na vida, que não dispõe de recursos para montar e operar um escritório que valha a pena ou que, simplesmente, é atraído pela ideia. É o que mostra a American Bar Association (ABA — a ordem dos advogados dos EUA). A ABA está fazendo um esforço para popularizar a advocacia eletrônica, com a publicação de vários artigos sobre o assunto.

Para a ABA, essa seria uma forma de combater o desemprego na área jurídica e também uma solução para advogados que passam anos cumprindo tarefas burocráticas (ou quase) nos escritórios e nunca conseguem ter seus próprios casos para atuar. A proposta vem acompanhada de recomendações apresentadas em diversos artigos.

Veja as principais dicas:
― A ideia do advogado virtual autônomo é talhada para advogados que se especializam em uma área específica da advocacia — um nicho de mercado, como no caso das firmas “butiques”. Não cai bem para o advogado autônomo que oferece full service, um modelo que só serve para grandes bancas.

― Mesmo a seus próprios clientes, o advogado autônomo só deve prestar serviços de sua área de especialização jurídica. Por exemplo, se o advogado é especializado em patentes e seu cliente é acusado de assédio sexual, ele deve repassar o caso para outra firma. Reforçando: não serve para advogados que atuam na área criminal, civil, trabalhista, tributária… e que também vendem joias e rodas de magnésio nas horas vagas, caso o cliente esteja precisando.

― Para criar sua “marca”, o advogado deve fazer o marketing de um único “produto”, como faz a Starbucks. Essa empresa vende mais de 30 produtos, mas só faz o marketing de um: o café. Mas, quando uma pessoa vai à Starbucks (ou mesmo a um supermercado), se depara com muitos produtos que podem lhe interessar, todos relacionados a café ou à marca da empresa (desde cappuccinoengarrafado a xícaras de café). Assim, o advogado autônomo pode ter uma especialidade carro-chefe, a que cria a marca, e outras áreas de atuação, em que o inter-relacionamento faz sentido.

― O advogado autônomo deve desenvolver relacionamentos com outros advogados e com firmas de advocacia de todos os portes (especialmente as pequenas e médias) para troca de indicações. Alianças ou parcerias com firmas de médio porte, que já têm vários clientes mas não um advogado especializado na área do advogado autônomo, podem render frutos para ambos.

― As pessoas preferem fazer negócios com quem elas conhecem. Portanto, o advogado autônomo deve executar diligentemente o seu trabalho de networking — isto é, se envolver com associações frequentadas por empresários, profissionais ou quaisquer pessoas que, de alguma forma, têm contato com sua área de atuação. Deve fazer parte de entidades comunitárias, prestar serviços voluntários e comparecer a eventos que podem trazer novos relacionamentos. Tudo para conquistar novos clientes para sua firma e para as firmas com as quais está se inter-relacionando.

― Uma regra geral para profissionais que trabalham em casa, que normalmente não é encontrada em textos para advogados, é a de que é preciso se vestir “de acordo” com o trabalho que faz. Se um advogado vai de terno e gravata para o escritório ou para uma reunião ou para um tribunal, assim deve ser em casa, na hora do trabalho. De bermudas, será visto pelos outros a sua volta como o pai, o marido, o filho, o sogro, o genro, o vizinho, o amigo (ou todos os seus correspondentes femininos) e não como um advogado ou advogada trabalhando.

“Advogados sem amarras”
Em um de seus artigos sobre advocacia virtual, o advogado autônomo Jay Fleischman, dá dicas operacionais para os “advogados sem amarras”. Suas sugestões apresentam, principalmente, formas de reduzir os custos operacionais dos advogados autônomos, o que lhes dá uma vantagem competitiva em relação aos escritórios formais: podem reduzir os custos dos clientes com serviços advocatícios, sem reduzir seus rendimentos. Conheça as ideias:

Um escritório tradicional precisa de todos os recursos de comunicação disponíveis, como telefone, fax,e-mail e diversos outros meios disponibilizados pela internet. A firma sem escritório também. Mas, em qualquer dos casos, os advogados não podem se esquecer de que nenhuma comunicação eletrônica substitui os contatos feitos pessoalmente, face a face. O desenvolvimento de relacionamentos pessoais ainda é a melhor arma de marketing para qualquer firma de advocacia conquistar novos clientes e manter os existentes.

Telefone
Não pense que pode fazer todas as suas comunicações por e-mail, por mais que isso pareça desejável. O cliente quer ouvir sua voz, discutir seus problemas, expressar suas emoções pessoalmente ou por telefone, diz Fleischman.

Ele usa o Skype para fazer e receber chamadas, diretamente de seu laptop. Nos EUA, o serviço “premium” do Skype custa US$ 53,88 por ano. Isso lhe permite fazer chamadas ilimitadas (com vídeo, quando for o caso) para qualquer parte do país e do mundo. Ele paga um extra de US$ 72 por ano, para ter um número telefônico local, para que as pessoas possam chamá-lo, como se ele tivesse uma “linha telefônica real”. Mesmo com esse extra, ele gasta menos por ano do que muitas firmas gastam por mês.

Secretária
É impraticável para o advogado manejar todas as ligações telefônicas, se quer executar seu trabalho a tempo. Para o ajudar nas comunicações telefônicas, Fleischman usa a “Call Ruby”, uma empresa que oferece serviços terceirizados de secretária nos EUA. “As secretárias terceirizadas só não marcam reuniões, mas atendem o telefone, transferem a chamada para mim onde quer que eu esteja se certificam que os clientes entrem em contato comigo ou com outra pessoa da firma, se for o caso, e fazem com que os clientes fiquem satisfeitos. É melhor do que qualquer secretária eletrônica”, diz.

PBX
Outra opção para firmas sem escritório, mas com mais de uma pessoa na equipe, é o Grasshopper, um sistema virtual de PBX testado por Fleischman. “É um sistema de atendimento automático, que não tem o mesmo valor do atendimento por secretária, mas, quando uma pessoa disca meu ramal, ele transfere as chamadas para um número que programei previamente”, explica. “E as mensagens são enviadas para meu computador na forma de arquivo mp3″.

Fax
Para os advogados que ainda usam fax, Fleischman apresenta uma solução: usar um serviço de “fax-para-e-mail”, tal como o Maxemail ou o eFax. Qualquer um desses serviços dá ao usuário um número telefônico local para outras pessoas enviarem fax. O fax chega à caixa de e-mail no formato PDF (o que dispensa o escaneamento de fax recebido pelo aparelho tradicional).

E-mail
O e-mail é um meio de comunicação extremamente prático, mas desprovido de segurança. Os dados são transmitidos através de um espaço inseguro da internet e qualquer pessoa, com alguns conhecimentos, pode interceptá-los. Nos EUA, a CIA, o FBI e outros órgãos de segurança nacional fazem isso todos os dias. Fleischman diz que usa o Google Apps, que oferece mais segurança do que sua capacidade financeira pode adquirir e é usado por várias agências governamentais.

Armazenamento de dados
Documentos importantes devem ser arquivados no computador e em discos rígidos externos. Mas a novidade no mercado é a computação em nuvem, na qual pode ser montado um sistema para armazenamento de arquivos. A vantagem desse sistema é que os documentos dos clientes podem ser compartilhados com outras pessoas da equipe.

Fleischman diz que ele e sua equipe usam o Dropbox. O sistema sincroniza os arquivos dos computadores dos membros da equipe e faz o armazenamento em nuvem, para que toda a equipe tenha acesso a ele. Mas, como se trata de documentos de clientes, há que haver um bom nível de segurança. No caso, o sistema usa a “Camada de Soquetes de Segurança” (SSL – Secure Sockets Layer) e criptografia AES de 256 bits, para transmitir e armazenar arquivos. Outra provedora desse serviço é a Box.net.

O advogado diz que sua firma também usa um aplicativo de gerenciamento da prática, baseado em nuvem, para rastrear prazos, mensagens e atualizações dos arquivos. Uma das vantagens desses sistemas é a de que os advogados não têm de se preocupar com o back-up dos arquivos, porque isso é feito automaticamente.

Local de reuniões
Fleischman tem um sócio que tem um escritório com sala para reuniões com clientes, embora ele trabalhe de casa. Ter um sócio com escritório é uma ideia para o advogado autônomo, sem escritório. Mas outros advogados encontram novas soluções. Dependendo do cliente, marcar uma reunião para um café com um ambiente tranquilo pode ser uma saída.

Além disso, muitos tribunais disponibilizam salas de reuniões para advogados. Seccionais e subseccionais da Ordem dos Advogados e de associações de advogados têm, muitas vezes, salas de reunião que podem ser usadas pelos advogados. Outra alternativa é alugar uma sala de reunião, por determinado tempo, em um centro executivo.

Comunicações da equipe
Além do sócio com escritório, Fleischman trabalha com um advogado contratado e um assistente jurídico. Vez ou outra, usa assistentes que operam por meios virtuais, sem vínculos empregatícios, para fazer determinadas tarefas, sempre que necessário. Ele os contrata por meio de sites de assistentesfree-lancing, como o eLance e outros. Os próprios assistentes o contatam, depois de verem uma oferta de trabalho que colocou no Facebook. A lógica é simples: ele precisa de assistentes familiarizados com tecnologia e o melhor lugar para encontrá-los é em um site com 700 milhões de membros tecnologicamente aptos.

As comunicações se desenvolvem com naturalidade. Todas as manhãs Fleischman, o advogado contratado e o assistente jurídico entram no Skype, para planejar o trabalho do dia e dos dias seguintes. Discutem o trabalho a ser feito e os desafios. E os resolvem, como em uma reunião normal de equipe em um escritório. Conforme necessário, se falam, durante o dia, pelo Skype ou pelo Google Talk — tão facilmente, como se estivessem em salas diferentes de um grande escritório.

A firma também mantém um “wiki” — um “site colaborativo”, em que todas as pessoas (autorizadas, nesse caso) podem dar suas contribuições a conhecimentos e trabalhos que devem ser compartilhados e a procedimentos. O “wiki” é hospedado pelo servidor de internet da firma, com uma combinação de nome de usuário e de senha que é mudada regularmente, para efeito de segurança.

A vida de um advogado sem escritório
“Os clientes de nossa firma sabem que somos advogados sem escritório, autônomos e móveis. Nossa equipe tem a capacidade de trabalhar de casa ou de qualquer lugar, misturar a vida profissional com a pessoal, conforme surgem as necessidades ou oportunidades. A vida se torna mais livre”, diz Fleischman.

“Além disso, a não ser pelo pequeno escritório de meu sócio, não temos as despesas de uma instalação física. Nosso sistema telefônico custa uma fração do que as firmas de advocacia gastam por mês e todas as nossas despesas são menores agora, que não temos todos os gastos com material de escritório”, ele declara.

“A melhor parte é não perder muito tempo no tráfego, indo e vindo do escritório para casa. É um tempo que o advogado autônomo pode empregar adiantando o trabalho, estudando ou aprendendo a usar uma nova tecnologia, desfrutando a família ou resolvendo problemas pessoais. É só não descuidar do trabalho”, conclui.


João Ozorio de Melo é correspondente da revista Consultor Jurídico nos Estados Unidos.

Revista Consultor Jurídico, 15 de novembro de 2011
 

Extraído de Acordo Coletivo

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