"Agricultura em Debate"

 

08/04/2011 - 19h34

Debatedores pedem mudanças na renegociação de dívidas dos produtores rurais 

A Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) deu início nesta sexta-feira (8) ao ciclo de discussões "Agricultura em Debate", que teve como foco o endividamento rural. Para o senador Acir Gurgacz (PDT-RO), presidente da CRA, que sugeriu o tema, o governo e o sistema financeiro precisam adotar medidas mais eficazes na renegociação da dívida do setor rural. Em sua avaliação, a Medida Provisória (MP) 432/08, convertida na Lei 11.775/2008, fez apenas mais uma rolagem das dívidas agrícolas.

- O que tivemos até agora são paliativos que não tocaram na essência da questão, que é o critério de cálculos de atualização do saldo devedor. A renegociação da dívida precisa ser revista de uma forma que o agricultor tenha reais condições de pagar - afirmou.

Participaram do debate a superintendente técnica da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), Rosemeire Cristina dos Santos; o gerente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Evandro Ninaut; o superintendente da Área de Recuperação de Crédito do Banco do Nordeste, José Andrade Costa; o gerente-executivo do Banco da Amazônia, José Alves Bezerra; o diretor de Financiamento e Proteção da Produção Rural do Ministério de Desenvolvimento Agrário, João Guadagnin; o diretor de Agronegócio do Banco do Brasil, José Carlos Vaz; e o secretário-adjunto de Política Econômica do Ministério da Fazenda, Gilson Bitencourt.

[Rosemeire Cristina dos Santos - Foto: Lia de Paula / Agência Senado]

Rosimeire Cristina dos Santos, da CNA, disse que é difícil estabelecer a capacidade de pagamento do produtor, o tamanho da dívida e as providências a tomar, pois a operação de financiamento é registrada quando é feita e não quando o produtor realiza o pagamento. Ela observou que, apesar disso, o Projeto Campo Futuro que monitora custo de produção e preço em 158 municípios, aponta que a rentabilidade da atividade agropecuária melhorou, com exceção do arroz e trigo, mas pode ser uma melhora transitória.

- Nós estamos no segundo pagamento de uma renegociação que foi feita em 2008 pela Lei 11.175. Temos algumas regiões, como Mato Grosso, com mais seis parcelas pela frente, e endividamento crônico em outras regiões, como o Nordeste, que é um quadro crítico hoje. Em alguns casos, nem mesmo uma renegociação de dívidas traria benefícios àquela população - afirmou.

Rosimeire Cristina dos Santos afirmou que somente prorrogar as dívidas não basta. Para ela é preciso vincular os financiamentos a instrumentos de gerenciamento de risco. Ela também defendeu uma alteração da política agrícola brasileira que estabeleça renda para o produtor, possibilitando que se mantenha na atividade e não se descapitalize por conta de problemas climáticosou de preços.

Evandro Ninaut disse que antes de 1986, "nadávamos de braçada". Ele observou que a economia mundial era diferente e, apesar de todos os planos econômicos, a agropecuária veio sustentando a balança comercial brasileira, graças à subida no preço das commodities. Ninaut disse que a realidade é que muitos planos foram feitos para tentar corrigir a situação do endividamento rural, mas nenhum para resolvê-lo estruturalmente.

- Precisamos é de uma política agrícola moderna que atenda a condição de mercado atual. Precisamos da aprovação do Fundo de Catástrofe, um seguro que traga estabilidade. O cooperativismo tem mantido o homem no campo mas não sabemos até quando isso vai durar, pois dependemos do câmbio e do preço flutuante das commodities no mercado internacional - assinalou. 

Panorama do crédito

[José Andrade Costa - Foto: Lia de Paula / Agência Senado]

José Andrade Costa, lembrando que o Banco do Nordeste atua numa área que abrange 1.990 municípios, salientou que não adianta apenas conceder crédito sem um trabalho de apoio ao pequeno produtor rural, o que levou o banco a estabelecer uma série de parcerias com outros órgãos públicos e privados.

Representando o Banco da Amazônia, José Alves Bezerra disse que a instituição vem atuando fortemente na área de infra-estrutura. Na área de fomento, especialmente o setor rural, Bezerra disse que o banco é responsável por 83% de todo o crédito de investimento que é aplicado naquela região, atingindo 94% dos municípios. Em 2010, o banco aplicou R$ 7,3 bilhões nessa área.

João Guadagnin disse que a inadimplência no Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf) é a mais baixa de todos os sistemas de crédito existentes hoje no Brasil. Ele salientou que nos 3,3 milhões de contratos, em todas as modalidades de custeio e de investimento do Pronaf, o índice de inadimplência média nacional não chega a 4%.

- A agricultura familiar brasileira toma crédito e paga o crédito. São bons pagadores - afirmou Guadagnin, ressaltando que o "calcanhar de Aquiles" da agricultura familiar ainda é a falta de assistência técnica.

José Carlos Vaz disse que a carteira de agronegócio do Banco do Brasil dispõe de R$ 75 bilhões, tem contratos com 1,6 milhão de produtores rurais e representa 60% do sistema de crédito rural. A inadimplência é de apenas 1,2%. Para a safra 2010-2011, o banco fechou em março a contratação de R$ 21 bilhões em custeio, investimento e comercialização, destinados a pequenos, médios e grandes produtores, representando um crescimento de 10% em relação ao desembolsado na safra anterior.

Ele afirmou que renegociar dívidas não é a melhor solução, pois a margem de lucro do produtor fica cada vez menor.

- Por isso que é essencial não só que a gente consiga, talvez não compulsoriamente mas via convencimento, que os produtores rurais de médio e grande porte passem a usar mecanismos similares aos da agricultura familiar - sugeriu.

Gilson Bittencourt disse que não interessa ao Ministério da Fazenda prorrogar as dívidas, mas sim liquidar e limpar a carteira. Segundo ele, só o fato de falar em renegociação já aumenta a inadimplência. Para Gilson, o importante é fazer com que o dinheiro gere renda para o produtor. Ele defendeu a criação de um cadastro dos produtores do país para facilitar o planejamento de seguro, de crédito e da renegociação de dívidas.

[senador Blairo Maggi (PR-MT) - Foto: Geraldo Magela / Agência Senado]

O senador Blairo Maggi (PR-MT) elogiou o fato de o Pronaf manter uma carteira auto-sustentada e disse que o desempenho merece ser observado para se saber se, no futuro, o modelo pode ser adotado pela agricultura empresarial. O senador salientou que sua preocupação hoje são os médios produtores, que não estão no Pronaf e nem no grupo dos grandes.

- Esse grupo está sendo deixado para trás e sendo absorvido, via arrendamento e compra de terras, pelos grandes fundos, o que não é bom para a agricultura brasileira. O fundo só trabalha pelo lucro e não tem paixão ou tradição na terra. Se der dinheiro, planta; se não der, para de plantar. Podemos ter um problema sério no país se o mercado desabar, com desabastecimento e problema social nos municípios onde estão essas propriedades que geram empregos e renda. Vamos quebrar esses municípios - alertou.

O senador Ivo Cassol (PP-RO) lembrou que antigamente as renegociações eram feitas de comum acordo com instituições bancárias, o que acabou dando fama de caloteiros aos produtores rurais. "Mas, isso mudou", afirmou. Cassol disse que compartilha da mesma preocupação de Blairo Maggi quanto à centralização do crédito em poucas empresas grandes e a falta de acesso dos pequenos.

- Não basta financiar, tem que botar para funcionar, porque eles não têm capital de giro - afirmou.

O senador apontou a necessidade de uma política de defesa do produtor, queixando-se do fato de um litro de leite ser mais barato que um refrigerante. 

Participação popular 

O debate desta sexta-feira na CRA deu início a uma experiência nova de participação e interação popular com o processo legislativo. Pela primeira vez, os cidadãos puderam enviar perguntas e sugestões, em tempo real. A participação popular foi feita via telefone (0800-612211), pela internet (www.senado.gov.br/alosenado) e Twitter (@alosenado). As informações serão sistematizadas pela Secretaria de Pesquisa e Opinião Pública.

O presidente da CRA, senador Acir Gurgacz, observou que a iniciativa faz parte de um projeto-piloto. De acordo com a aceitação, a prática poderá ser adotada por outras comissões da Casa.

Ricardo Icassatti / Agência Senado
 

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