Os riscos do totalitarismo regulatório

Os riscos do totalitarismo regulatório*

Alexandre Santos de Aragão
é professor de Direito Administrativo da UERJ e doutor em Direito do Estado pela USP. 

A vida em sociedade implica naturalmente restrições à liberdade. São inúmeros os exemplos colhidos do dia-a-dia: sinais de trânsito, limitações à construção e ao barulho etc. Trata-se apenas da conciliação da liberdade de cada um para propiciar a vida em comum, expressão mesmo do velho ditado popular de que "o seu direito começa onde o meu termina".

Mas isso é inteiramente distinto de quando o Estado, por eventuais maiorias legislativas ou voluntarismo de autoridades públicas no exercício transitório de cargos políticos ou de confiança, passa a querer impor a todas as pessoas comportamentos que julga ser melhores para eles, como se fossem todas crianças incapazes de discernir o que é melhor ou pior para si mesmas, querendo mesmo em alguns casos estorvar atividades econômicas perfeitamente lícitas.

Nesses casos, o Estado não está apenas conciliando interesses potencialmente contraditórios, mas impondo determinada concepção de vida a sujeitos cujas ações ou omissões em nada estão afetando a esfera individual de outras pessoas.

Estão sendo, nesse sentido, propostas pelo Estado limitações ao bronzeamento artificial, locais de colocação de alimentos nas prateleiras dos supermercados, colocação de advertências em calcinhas e cuecas para utilização de preservativos e realização de exames de saúde. O último exemplo, apesar de tão pitoresco, por incrível que pareça já foi aprovado pelo Senado e pela CCJ da Câmara dos Deputados, demonstrando o quanto a sociedade civil deve se prevenir para proteger as suas liberdades.

Há dois pontos contra os quais a sociedade deve estar igualmente atenta: contra o voluntarismo regulatório - em regulação a boa intenção apaixonada costuma ser perigosa - e contra o comodismo de alguns indivíduos, que preferem que o Estado tutele a sua vida ou da sua família, ao invés de ele próprio tomar as suas decisões.

A República e a Democracia constituem a maturidade institucional de uma sociedade, na qual ela própria se dirige. Não podemos admitir retrocessos paternalistas nessas conquistas. Em 1917, por exemplo, a Prefeitura do Rio de Janeiro determinara a vedação do uso da praia em determinados horários para impedir que os banhistas tomassem demasiado sol e às moças só era permitido o banho de mar se acompanhadas de um banhista especialmente contratado para segurar-lhe a mão, conforme determinado pelo prefeito Pereira Passos.

Os exemplos históricos, hoje prosaicos, se devidamente atualizados servem para mostrar a visão que medidas regulatórias como algumas das que se está atualmente cogitando têm do cidadão: incapazes de decidir o seu melhor caminho e proibidos de assumir por livre arbítrio alguns riscos razoáveis que só lhe dizem respeito.

O Estado de Direito não pode adotar como suas as paixões individuais de algumas das pessoas que episodicamente ocupam este ou aquele cargo público, tão bem criticadas pelo pensador israelense Amós Oz, para quem "o fanatismo está em quase todos os lugares, e suas formas mais silenciosas, mais civilizadas, estão presentes em nosso entorno, e talvez dentro de nós também. Conheço bem os antitabagistas que o queimarão vivo, se você acender um cigarro perto deles! Conheço bem os vegetarianos que o comerão vivo por comer carne! (...) Conformidade e uniformidade, a urgência para pertencer a algo e o desejo de fazer com que todos os demais pertençam podem muito bem ser as formas mais amplamente difundidas de fanatismo (...). Creio que a essência do fanatismo reside no desejo de forçar as outras pessoas a mudarem."

O que deve ser advertido nesse contexto é que excessos na disciplina estatal sobre a vida das pessoas também pode causar danos à saúde..., à saúde do Estado Democrático de Direito.

 

* - Publicado na Revista Consultor Jurídico, 21 de julho de 201

Extraído de Transparência Capixaba

 

Notícias

Ministério Público e Defensoria podem atuar juntos na defesa de incapaz

13/11/2013 - 08h58 DECISÃO Ministério Público e Defensoria podem atuar juntos na defesa de incapaz A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve decisão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJRJ) que admitiu a nomeação da Defensoria Pública como curadora especial de incapaz. O...

Justiça invalida negócio entre pai moribundo e filhos em fraude à execução

Justiça invalida negócio entre pai moribundo e filhos em fraude à execução  Quarta, 13 Novembro 2013 09:41  A 1ª Câmara de Direito Civil negou o recurso de herdeiros contra sentença que invalidou a venda de bens realizada pelo pai, então moribundo, à própria família, por prejudicar os...

Regime de bens

12 novembro 2013 Se não houver casamento, pacto antenupcial é nulo Por Livia Scocuglia O pacto antenupcial é nulo se não for feito por escritura pública e ineficaz se não lhe seguir o casamento. Assim determina o artigo 1.653 do Código Civil que foi seguido pela Justiça de São Paulo ao decidir uma...

Juiz pode bloquear verbas públicas para garantir fornecimento de remédio

12/11/2013 - 07h29 RECURSO REPETITIVO Juiz pode bloquear verbas públicas para garantir fornecimento de remédio a pessoa necessitada O juiz pode determinar o bloqueio de bens necessários para o fornecimento de medicamentos segundo o seu prudente arbítrio e desde que com adequada fundamentação. A...

Alteração de registro civil em união estável depende de prova judicial

11/11/2013 - 09h02 DECISÃO Alteração de registro civil em união estável depende de prova judicial A adoção do sobrenome de companheiro ou companheira na união estável depende de comprovação prévia da relação. A decisão é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar recurso de...