Por um processo civil justo

Por um processo civil justo

(20.07.12)

Por José Jácomo Gimenes,
professor da Universidade Estadual de Maringá e juiz federal,
e Marcos César Romeira Moraes,
juiz federal.

O advogado é pago duas vezes na nova lei, pelo vencido e pelo cliente. O vencedor ficaria sem indenização pelos gastos com o advogado, que teria prioridade

O sistema judicial brasileiro está passando por um momento histórico. Tramita na Câmara o projeto do novo Código de Processo Civil, representando esperança de aprimoramentos e Justiça mais rápida. A oportunidade deve ser aproveitada. Temos de buscar um diploma legislativo técnico, justo e sem influência de interesses particulares.

O projeto do novo CPC, entretanto, carrega um artigo longo, o 87, com 13 parágrafos e nove incisos, que é desnecessariamente corporativo e injusto com os milhões de cidadãos que são obrigados a buscar o Judiciário. Se mantida, a impropriedade refletirá um processo civil defeituoso e um Judiciário institucionalmente injusto.

O artigo 87 começa com uma mudança sutil. Determina que o vencido no processo pague honorários ao advogado do vencedor.

A mudança contraria a histórica regra do artigo 20 do CPC em vigor, que determina que o vencido no processo indenize o vencedor, pagando as despesas do processo e honorários advocatícios, verba conhecida como honorários de sucumbência.

A sutil mudança do titular da verba contraria a própria lógica e funcionalidade do processo judicial. Como está no projeto, o vencedor do processo fica sem indenização do que gastou com seu advogado. Por exemplo: se gastou 20% com seu advogado, receberá somente 80% de seu direito, ofendendo o princípio da reparação integral.

Se mantida a mencionada alteração, o advogado do vencedor vai receber honorários de duas fontes: de seu cliente, por força de contrato, e do vencido, por determinação da lei.

A verba do vencedor vira em uma espécie de tributo corporativo, desnecessário e sem fundamento constitucional. O vencedor, se quiser ressarcimento do valor gasto com o advogado, terá que propor um outro processo judicial, nesse caso onerando exageradamente o vencido.

O projeto, nesse ponto, privilegia os interesses financeiros do advogado, desprotegendo ruinosamente o jurisdicionado. O respeitável profissional da Advocacia tem competência para combinar seus honorários por contrato, como fazem todos os outros profissionais liberais, não sendo necessário legislação impositiva para incrementar seus ganhos.

Não é a primeira vez que ocorrem avanços sobre a verba indenizatória da parte vencedora. O Estatuto da OAB já lançou normas transferindo a verba para o advogado. O imbróglio foi levado ao STF, num processo demorado e resultado intrigante.

A forte tendência da Corte para declaração de inconstitucionalidade da transferência da verba foi suplantada por uma questão processual menor, sem julgamento da controvérsia central. O resultado foi somente a declaração de inconstitucionalidade de regra de transferência em relação aos advogados empregados, com mínima aplicação.

Uma segunda mudança, no parágrafo 3º do artigo 87, consistente em um "tabelão" de honorários de sucumbência, com percentuais mínimos atrelados ao valor da causa, para processos contra o Estado.

O "tabelão" modifica substancialmente a sábia regra do parágrafo 4º do artigo 20 do CPC em vigor, que deixa para o juiz a fixação dessa verba, sempre sujeita a recurso. O "tabelão" é uma ofensa ao princípio do livre convencimento do juiz e pode gerar ganhos injustificáveis em demandas milionárias repetitivas contra o Poder Público.

Por último, duas outras inovações comportam considerações. O parágrafo 10 do artigo 87 declara que os honorários de sucumbência têm natureza alimentar, tipo de crédito que tem privilégio constitucional na ordem de pagamento por precatórios. O parágrafo 11 autoriza o pagamento desses honorários em nome da sociedade de advogados, pessoa jurídica, com tratamento fiscal bem mais benevolente.

Em resumo, a verba indenizatória do vencedor do processo, em passe de mágica, é transferida para o advogado e transformada em verba alimentar, com possibilidade de pagamento em nome de pessoa jurídica.

Assim, grandes empresas jurídicas poderão receber honorários de sucumbência vultuosos, com vantagens fiscais, bem antes de seus clientes receberem o crédito principal. O acessório passa a ter privilégios não concedidos ao principal.

O artigo 87 do projeto do Código Processual Civil deve ser revisto, sob pena de institucionalizar injustiça para quem procura o Judiciário para resolver seus conflitos.

 

(*) Artigo originalmente publicado na Folha de S. Paulo
Extraído de www.espacovital.com.br

Notícias

TJGO nega visita de padrasto a menor órfã de mãe

TJGO nega visita de padrasto a menor órfã de mãe A 1ª Turma Julgadora da 6ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Goiás (TJGO) reformou parcialmente decisão da comarca de Cachoeira Alta, para garantir ao pai que seja afastado o direito de visita do padrasto à filha menor. Depois da...

Autorização de viagem nacional de crianças

Portaria n° 2.324/CGJ/2012 - Dispõe sobre a concessão, em Minas Gerais, de autorização de viagem nacional de crianças pelos pais ou responsáveis ou judicial PORTARIA N° 2.324/CGJ/2012 Dispõe sobre a concessão, no âmbito do Estado de Minas Gerais, de autorização de viagem nacional de crianças...

TJDFT: Promessa de doação em acordo de divórcio não gera obrigação de doar

TJDFT: Promessa de doação em acordo de divórcio não gera obrigação de doar Há oito anos um casal, com duas filhas menores, resolveu se divorciar de forma consensual. Na cláusula sexta do acordo firmado em cartório o pai fez uma promessa de que transferiria a propriedade de um imóvel na Asa Sul...

É possível incluir sobrenome do cônjuge depois do casamento

13/09/2012 - 08h03 DECISÃO É possível incluir sobrenome do cônjuge depois do casamento É possível acrescentar o sobrenome do cônjuge ao nome civil durante o período de convivência do casal. A decisão é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em recurso no qual o Ministério...

Registro do bilhete da Mega-Sena deve ser feito na presença do apostador

10/09/2012 Apostadores de bolão em Novo Hamburgo (RS) não têm direito ao prêmio da Mega-Sena A Justiça Federal de Novo Hamburgo negou o pedido de apostadores que pretendiam receber o prêmio acumulado do concurso 1.155 da Mega-Sena, sorteado em fevereiro de 2010, no total de R$ 53 milhões. O...