Idade mínima para aposentadoria divide especialistas e centrais sindicais
INSS Antonio Cruz/Agência Brasil
Idade mínima para aposentadoria divide especialistas e centrais sindicais
16/11/2016 12h40 São Paulo e Brasília
Elaine Patrícia Cruz e Mariana Branco – Repórteres da Agência Brasil
Uma das dúvidas atuais é se a reforma da Previdência levará em conta a disparidade das expectativas de vida no país. Especialistas consultados pela Agência Brasil divergem quanto à possibilidade de a reforma levar em conta as diferenças regionais. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) mostram disparidade entre estados e municípios brasileiros no que diz respeito ao tempo médio de vida dos habitantes.
A esperança de vida em Santa Catarina, por exemplo, de 79 anos – a mais alta do Brasil – está 8,4 anos acima da mais baixa, no Maranhão, atualmente em 70,6 anos, segundo o IBGE. Além disso, em 19 municípios, todos no Nordeste, a expectativa de vida da população é de cerca de 65 anos, a idade mínima pretendida na proposta do governo. Do outro lado, 20 municípios do Sul têm expectativa ao redor de 78 anos. Os dados são do Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, do PNUD.
Ante esse panorama, o economista Gilberto Braga, professor de Finanças da Faculdade de Ciências Sociais Aplicadas Ibmec-RJ, acha que o “tecnicamente correto” seria adequar os regimes de Previdência às realidades locais. “Acho que a gente poderia ter dois ou três regimes de idade diferentes. Assim como o horário de verão é diferente [dependendo do local], não vejo porque não fazer isso”, disse. Segundo ele, uma maneira de fazer isso seria com uma regra de transição.
“Uma regra de transição na idade mínima, de maneira que nas regiões com menor expectativa de vida, com o passar dos anos, [a idade exigida para se aposentar] fosse aumentando”, explica o economista. Ele acredita, contudo, que não há um clima político favorável à adoção da ideia.
“Vejo que esse é um item com o qual o governo deveria se preocupar. Mas ele [governo], em um primeiro momento, está muito mais preocupado com o sistema geral. E, se colocar essa discussão na mesa, nesse momento, ela é mais prejudicial do que favorável à aceitação [da reforma da Previdência]. Do ponto de vista político, da discussão no Parlamento, eu acho difícil [prosperar]”.
Equilíbrio
O economista José Matias-Pereira, especialista em administração pública e professor da Universidade de Brasília (UnB), tem uma visão diferente. Ele reconhece que a questão das diversas expectativas de vida é “importante”. No entanto, considera difícil uma reforma da Previdência que atenda às disparidades regionais do tempo médio de vida do brasileiro.
Segundo ele, o principal problema em ter regimes de Previdência diferentes dependendo da região é a impossibilidade de o governo controlar a mobilidade da população. “Se você começa a tornar algo extremamente complexo de operar e tem uma mobilidade de um lado para o outro, daqui a pouco você não tem mais o controle efetivo. Você começa a distorcer o controle dessa Previdência”, diz.
Para ele, não cabe à Previdência tratar da questão das diferenças sociais e regionais. “Quando você faz um modelo de Previdência Social, o que você quer é que ela tenha o equilíbrio financeiro e atuarial e garanta para aquelas pessoas a condição de pagar ao longo do tempo. Esse outro objetivo, de equalizar a possibilidade de as pessoas viverem mais, é um problema de outras políticas públicas. A Previdência não pode estar preocupada com essa questão”.
Centrais sindicais
Já entidades representativas dos trabalhadores defendem que a reforma contemple as diferenças regionais e que o ônus de equilibrar as contas previdenciárias não recaia exclusivamente sobre os usuários do sistema. O presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Vagner Freitas, é a favor da cobrança de débitos de empresas em atraso com a contribuição.
“Você pode fazer várias modificações. Por exemplo, acabar com a sonegação, porque a maior parte das empresas sonega. Também acabar com o trabalho informal, porque aí [com mais trabalhadores formalizados] você vai renovando as pessoas que entram na Previdência”, afirma Freitas.
A cobrança às empresas também é defendida por João Carlos Gonçalves, o Juruna, secretário-geral da Força Sindical. “A reforma, para nós, tem outro viés. É o viés da melhoria da arrecadação, da cobrança de atrasados, de repensar uma estrutura de aposentadoria que seja igualitária para todos. O que não podemos é focar apenas na questão de diminuir o custo, pois isso é cortar o social e prejudicar quem está lá, quem já teve dificuldade e vai ter mais ainda para chegar aos 65 anos”.
O diretor de administração do Sindicato Nacional dos Aposentados, Julio Quaresma Filho, afirma que a reforma da Previdência, como está formatada, privilegia os habitantes das regiões mais desenvolvidas e com mais escolaridade.
“Quem tem um pouco mais de condições econômicas, se forma, trabalha em uma atividade um pouco mais requintada, faz alguma coisa mais técnica. Mas esse pessoal de trabalho braçal vai ter muitos problemas. E não consegue [trabalhar], com 65 anos, a fábrica vai achar que ele já não está produzindo muito, e vai dispensar”, teme o sindicalista.
Edição: Carolina Pimentel
Agência Brasil
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Com perspectiva de reforma, brasileiros têm dúvidas sobre aposentadoria
18/11/2016 13h01 São Paulo
Elaine Cruz – Repórter da Agência Brasil*
A perspectiva de uma reforma da Previdência tem provocado dúvidas a brasileiros de todas as idades. Para os mais jovens, que começaram a contribuir há pouco tempo para o Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), ainda não há clareza de como será o modelo quando chegar a vez de se aposentar. Os mais velhos, que estão próximos de atingir o tempo de contribuição exigido atualmente, temem ter a aposentadoria adiada pela reforma iminente.
Com uma possível reforma, brasileiros têm dúvidas sobre como ficará a aposentadoria Valter Campanato/Agência Brasil
Para a trabalhadora Andreia Ferreira Pinto, 20 anos, a aposentadoria ainda está distante. A jovem que trabalha desde os 17 anos, tem registro em carteira há apenas um ano. Atualmente, ela ganha R$ 1,2 mil por mês prestando serviços na confecção de embalagens e rótulos adesivos.
“Tem trabalhos que a gente passa verniz. Tem a questão da insalubridade e isso é pago por fora, porque é muito forte a química”, relata à Agência Brasil. Andreia vive com a mãe no bairro Ermelino Matarazzo, zona leste de São Paulo. Segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano no Brasil, da Organização das Nações Unidas (ONU), a esperança de vida nessa área varia muito: entre 70,2 e 79 anos, dependendo da localidade do bairro. Apesar de jovem, Andreia preocupa-se com a aposentadoria.
Ela considera “muito longe” a idade mínima de 65 anos para se aposentar. A ideia de criar a idade mínima, para homens e mulheres, é uma das propostas da reforma da Previdência defendida pelo governo, e que já foi citada em entrevistas pelo ministro-chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha. Atualmente, não existe idade mínima para se aposentar.
“Eu espero [aposentar] porque não acho justo as pessoas trabalharem, trabalharem e, quando ela diz, 'já não aguento mais', e já não tem mais idade para trabalhar, você não pode receber nada do governo porque você não concluiu seu tempo de trabalho ainda”, diz a jovem.
Necessária
Diferentemente de Andreia, o contador e administrador Paulo de Camargo, 55 anos, encontra-se às portas da aposentadoria. Ele espera conseguir o benefício em outubro de 2018, quando atinge os 95 anos da somatória entre idade e tempo de contribuição. “Já completei os 35 anos [de contribuição] para me aposentar pelo teto, mas continuo contribuindo com o menor valor porque eu não tenho tempo de serviço ainda para a somatória”, explica.
Paulo começou a contribuir para a Previdência aos 18 anos. Ele conta que a maior parte da vida trabalhou como gerente financeiro e administrativo. Nos últimos quatro anos, atuou como gerente de vendas. No ano passado, deixou o emprego e montou a própria empresa de vendas. E diz que o momento de crise está impactando os negócios. “Eu continuo contribuindo para o INSS, mas o que facilita é que tenho uma reserva”, conta.
O contador tem três filhas em idade escolar e mora no Butantã, zona oeste de São Paulo. A esperança de vida no bairro, segundo o Atlas de Desenvolvimento Humano da ONU, é 81,3 anos. Apesar de não considerar a reforma da Previdência “justa”, Paulo acha que é “necessária”.
“Se eu falasse que acho justo, seria hipocrisia de minha parte. Eu acho injusto porque já trabalhei 38 anos, contribuí com 35 e vou chegar a 37 de contribuição. Mas o que vejo também é que o país tem que mudar mesmo. Não tem como sustentar isso [a previdência] dentro do que está hoje. Vai estourar daqui a 10 ou 15 anos e aí não vai conseguir pagar nem os que já estão aposentados”, acredita.
Embora não saiba como será a regra de transição para os que estão prestes a se aposentar, o contador não acredita que terá de trabalhar até os 65 anos. “Com certeza terá um pedágio aí, mas pode ser diferente de [se aposentar em] 2018. Não sei, vou ter que ver ainda”.
Paulo, contudo, acha a idade mínima de 65 anos razoável para quem está entrando agora no mercado de trabalho.“Todo mundo trabalha até 65 anos ou um pouco mais. A idade média [de vida] do brasileiro cresceu e está em 74 ou 75 anos. Não é que é virar aposentado e morrer, não é isso. Mas, cada vez mais, vai aumentando essa idade porque a gente está se cuidando”.
Em entrevistas à imprensa, o ministro Eliseu Padilha também tem abordado a regra de transição para os contribuintes mais velhos. Segundo ele, a nova regra, caso aprovada pelo Congresso Nacional, só valerá para os trabalhadores com menos de 50 anos. Quem tem mais de 50 anos poderá aposentar-se antes de 65 anos, mas terá de pagar uma espécie de “pedágio”.
Isenção fiscal
A mineira Viviane Freitas, de 37 anos, começou a trabalhar aos 16 e contribui com o INSS desde então, com exceção de períodos em que esteve desempregada. Atualmente trabalhando como secretária, ela estima que acumula cerca de 15 anos de contribuição, o que lhe permitiria aposentar com 52 anos pelas regras atuais. "Pessoas na minha situação certamente serão prejudicadas. E quem nunca contribuiu, é melhor esperar até ficar mais velho pra começar a contribuir. Não vai adiantar contribuir antes", avalia.
Viviane considera que a proposta de reforma em discussão é péssima para ela, mas entende a necessidade de mudanças. "A previdência está quebrada e as pessoas estão vivendo mais, consequentemente é necessário mais tempo de contribuição. Só acho que a reforma tem que ser feita de forma a beneficiar a todos. Quem já contribui e quem ainda não começou. Não concordo com a imposição da idade mínima", pondera a secretária, que vive em Belo Horizonte. Na opinião dela, a qualidade de vida do brasileiro não se equipara a dos países desenvolvidos e a grande maioria não tem saúde para trabalhar até os 65 anos.
A mineira acredita que uma reforma tributária poderia ajudar a balancear as dificuldades com a previdência. "Sou a favor do fim da isenção fiscal para setores como as igrejas, por exemplo. A arrecadação aumentaria e o recurso poderia ser destinado para a previdência. As igrejas arrecadam muito dinheiro e não paga imposto nenhum".
Expectativa de vida
Uma das principais dúvidas é se a reforma da Previdência levará em conta a disparidade das expectativas de vida no país. Especialistas consultados pela Agência Brasil divergem quanto à possibilidade de a reforma levar em conta as diferenças regionais. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) mostram disparidade entre estados e municípios brasileiros no que diz respeito ao tempo médio de vida dos habitantes.
A esperança de vida em Santa Catarina, por exemplo, de 79 anos – a mais alta do Brasil – está 8,4 anos acima da mais baixa, no Maranhão, atualmente em 70,6 anos, segundo o IBGE.
Para o secretário da Previdência, Marcelo Caetano, o dado mais adequado a ser levado em conta para a reforma e a sobrevida quando aproxima-se da idade da aposentadoria. “A expectativa de vida ao nascer é muito influenciada pela mortalidade infantil. Quando a gente considera para a Previdência, a gente tem que considerar a partir de uma idade em que a pessoa já entrou no mercado de trabalho”, afirma Caetano.
* Colaborou Léo Rodrigues, de Belo Horizonte
Edição: Carolina Pimentel
agência Brasil