Artigo: STJ garante proteção do lar para além da morte – por Gabriela Alves

Artigo: STJ garante proteção do lar para além da morte – por Gabriela Alves

Origem da Imagem/Fonte: Extraída de Colégio Notarial do Brasil São Paulo

Recente decisão da 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reafirmou uma diretriz fundamental no ordenamento jurídico brasileiro: a proteção do direito à moradia transcende formalidades registrais e sobrevive até mesmo à morte do titular. Trata-se de um importante precedente que reconhece a impenhorabilidade do único imóvel do espólio quando utilizado como residência pelos herdeiros, mesmo que ainda não tenha sido feita a partilha.

O caso concreto teve início com a propositura de ação cautelar antecedente, objetivando o arresto do único imóvel pertencente ao falecido, sob a justificativa de que haveria risco de alienação do bem antes da resolução de execução trabalhista movida contra ele, responsável por 95% do capital social de empresa falida. A liminar foi deferida, e o arresto mantido mesmo após a conversão da ação e a condenação dos sucessores ao pagamento de indenização.

O ponto essencial da controvérsia — e que acabou sendo objeto de recurso — foi o entendimento do Juízo de origem e do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, que rechaçaram a tese de impenhorabilidade. A alegação foi que, ausente a partilha, o imóvel ainda pertenceria ao espólio e, por consequência, estaria sujeito às dívidas deixadas pelo falecido.

Destinação social do imóvel

Ora, tal raciocínio ignora não apenas o espírito protetivo da Lei 8.009/1990, mas também princípios estruturantes do direito civil, como o da saisine, previsto no artigo 1.784 do Código Civil, segundo o qual a herança transmite-se automaticamente aos herdeiros com a abertura da sucessão. Não é a lavratura formal da partilha que legitima o uso do imóvel como residência familiar. É a sua destinação social como tal.

A decisão do STJ (REsp 2.111.839/RS) é acertada ao lembrar que a impenhorabilidade do bem de família não é um prêmio ao proprietário, mas um instrumento de proteção à dignidade da pessoa humana e à moradia da entidade familiar. Se o imóvel seria impenhorável caso o falecido ainda estivesse vivo e residindo ali com sua família, não há motivo razoável para afastar essa proteção apenas porque a titularidade ainda se encontra formalmente em nome do “de cujus“.

Ao contrário do que sustentou o Tribunal de origem, a ausência de averbação da partilha não tem o condão de afastar a impenhorabilidade, desde que reste configurada a condição de residência da entidade familiar. A Súmula 364 do STJ já pacificou entendimento nesse sentido, e o acórdão da 4ª Turma reafirma essa jurisprudência com base nos fatos e no direito.

Manutenção de subsistência e dignidade dos herdeiros

Mais ainda: não há notícia de que uma dívida trabalhista se enquadrasse nas exceções do artigo 3º da Lei 8.009/1990, o que afasta qualquer possibilidade de relativização da regra geral de impenhorabilidade. Assim, manter o arresto do imóvel seria punir não apenas o falecido (o verdadeiro devedor), mas sobretudo os herdeiros que ali residem e que dependem daquele bem para preservar sua subsistência e dignidade.

Portanto, a decisão do STJ vai além de resolver um caso concreto. Ela representa um marco importante na consolidação da função social da moradia, reafirmando que o direito à habitação não morre com o titular, e que a proteção legal ao bem de família acompanha os vínculos afetivos e existenciais que o cercam — e não apenas a sua formalidade cartorial.

Em tempos de crescente insegurança jurídica e patrimonial, decisões como essa nos lembram que o direito, mais do que técnica, deve ser instrumento de justiça e humanidade.

Fonte: Conjur
Extraído de Colégio Notarial do Brasil São Paulo

                                                                                                                            

Notícias

Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido

Processo Familiar Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido Mário Luiz Delgado 20 de abril de 2025, 8h00 Os bens recebidos em antecipação da herança necessária (legítima), nos moldes do artigo 544 do CC [6], quando “conferidos” pelo herdeiro após a abertura da sucessão, NÃO...

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário Amanda Fonseca Perrut No presente artigo, abordamos pontos cruciais sobre inventário, como prazo, multas e recolhimento de tributos, dentre outros. segunda-feira, 21 de abril de 2025 Atualizado em 17 de abril de 2025 14:23 De modo a auxiliar...

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório Amanda Fonseca Perrut A indicação de bens específicos pelo testador a determinado herdeiro é possível e evita eventuais disputas sucessórias. quinta-feira, 17 de abril de 2025 Atualizado às 09:11 É juridicamente possível atribuir...

Divórcio liminar?

Opinião Divórcio liminar? Daniela Bermudes Lino Raul Cézar de Albuquerque 9 de abril de 2025, 17h13 Enquanto isso, nos parece mais adequada a solução amplamente utilizada em Varas de Família e ratificada em algumas decisões de tribunais: decretar o divórcio na primeira audiência do processo, com...