Cônjuge só recebe herança quando não tem culpa na separação

Cônjuge só recebe herança quando não tem culpa na separação

Publicado em 06/11/2015

Um homem e uma mulher casam em comum acordo. Ela busca a cidadania italiana do marido e o passaporte europeu. Ele, o visto de permanência no Brasil. Ficam juntos por três anos. A homossexualidade do marido é apontada como motivo para o fim da união, embora testemunhas afirmem que a mulher conhecesse a orientação sexual do marido desde antes do casamento.

Depois de nove anos separados de fato, o homem falece e a mulher busca na Justiça sua parte na herança, abrindo uma briga judicial com os cinco irmãos do ex-companheiro.

Foi essa situação que levou o Superior Tribunal de Justiça (STJ) a interpretar, pela primeira vez, de quem seria o ônus da prova previsto no artigo 1.830 do Código Civil, que cria uma exceção ao direito sucessório do companheiro.

Pelo dispositivo, o cônjuge sobrevivente terá parte da herança desde que o casal não esteja separado judicialmente ou de fato há mais de dois anos. De acordo com o mesmo artigo, essa regra só é quebrada quando é provado que a culpa pelo fim do casamento não foi do sobrevivente. “É a exceção da exceção”, resumiu a ministra Isabel Gallotti, relatora do caso (REsp 1513252/SP).

Ônus da prova

Depois de anos de briga na Justiça de São Paulo, o STJ foi chamado a responder de quem é a responsabilidade de fazer a prova sobre a culpa pela separação – da ex-esposa ou dos irmãos do falecido, que tentavam excluí-la da herança?

Em decisão inédita, a 4ª Turma da Corte definiu que é do cônjuge sobrevivente – e não de terceiros interessados – a responsabilidade de demonstrar que o casamento não teve fim por sua culpa. O entendimento foi unânime.

Gallotti defendeu que o dispositivo tem uma sequência lógica. Segundo a ministra, os herdeiros devem provar que a separação ocorreu há mais de dois anos. Isto comprovado, cabe ao cônjuge demonstrar que não foi sua a responsabilidade pelo fim do casamento.

“Cabia à ré provar que não teve culpa amparada na regra excepcional”, afirmou a ministra.

Seguindo o voto da relatora, o ministro Luís Felipe Salomão pontuou que “seria impossível” exigir dos herdeiros – que desconheciam a vida em comum do casal – que apontassem o evento que ensejou o fim do casamento. “O ônus deve recair sobre cônjuge sobrevivente se desejar participar da herança”, disse o ministro.

No caso concreto, as provas colhidas foram inconclusivas. Algumas testemunhas atribuíram o fim do casamento à homossexualidade do marido. Outras afirmaram que a esposa sabia da orientação sexual do cônjuge desde o princípio. Alguns depoimentos apontaram que o casal nunca morou na mesma casa, informação que foi desmentida por outros.

Com o entendimento, o STJ reverteu decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), que havia entendido que as provas inconclusivas beneficiaria a ex-mulher. Para os ministros, em caso de as provas não demonstrarem a culpa pelo fim da união, a dúvida deve beneficiar os herdeiros, ficando a cônjuge excluída da herança.

Sem culpa

A discussão travada pela Corte superior perdeu o sentido a partir de junho de 2010, afirma o presidente do Instituto Brasileiro de Direito de Família, Rodrigo da Cunha Pereira. De acordo com o advogado, o debate sobre a culpa pelo fim do casamento foi sepultado com a edição da Emenda Constitucional 66/2010, que alterou o artigo 226 da Constitucional para simplificar o divórcio.

“A emenda significou o avanço do Estado laico porque a culpa é entremeada de noções religiosas. O Estado não deve entrar nessa questão. O discurso agora é de responsabilidade, não de culpa”, afirma Pereira, acrescentando que o debate colocado no STJ ficou no passado mesmo sem a alteração do artigo 1.830 do Código Civil.

“O dispositivo deve ser interpretado de acordo com a previsão constitucional. Entendo que não existe mais casamento se o casal está separado há mais de dois anos. Dessa forma, não seria justo reconhecer direitos sucessórios”, conclui.

Fonte: Jota Info
Extraído de Colégio Notarial do Brasil

Notícias

Herança digital e o testamento como aliado

Herança digital e o testamento como aliado Thauane Prieto Rocha A herança digital ganha destaque como parte essencial do testamento, permitindo que o testador decida sobre bens e memórias digitais após a morte. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado em 28 de abril de 2025 08:08 Ao realizar uma...

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório Gabriel Vaccari Holding/Sucessão: Cuidado online! Artigo expõe riscos de soluções fáceis (procuração, S.A., 3 células). Evite armadilhas fiscais/legais. Leitura essencial para famílias e advogados. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado...

Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido

Processo Familiar Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido Mário Luiz Delgado 20 de abril de 2025, 8h00 Os bens recebidos em antecipação da herança necessária (legítima), nos moldes do artigo 544 do CC [6], quando “conferidos” pelo herdeiro após a abertura da sucessão, NÃO...

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário Amanda Fonseca Perrut No presente artigo, abordamos pontos cruciais sobre inventário, como prazo, multas e recolhimento de tributos, dentre outros. segunda-feira, 21 de abril de 2025 Atualizado em 17 de abril de 2025 14:23 De modo a auxiliar...

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório Amanda Fonseca Perrut A indicação de bens específicos pelo testador a determinado herdeiro é possível e evita eventuais disputas sucessórias. quinta-feira, 17 de abril de 2025 Atualizado às 09:11 É juridicamente possível atribuir...