Existência de apenas dois sócios na empresa não afasta vedação a que administrador aprove as próprias contas

DECISÃO
18/03/2021 07:05

Existência de apenas dois sócios na empresa não afasta vedação a que administrador aprove as próprias contas

​​A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) que anulou parcialmente u​ma assembleia geral ordinária de empresa porque o sócio administrador havia votado pela aprovação de suas próprias contas, prática proibida pelo artigo 115, parágrafo 1º, da Lei das Sociedades Anônimas (LSA).

O colegiado entendeu que, embora a empresa contasse com apenas dois sócios – um deles com dois terços do capital social, na função de administrador; e outro, que foi diretor financeiro durante parte do exercício das contas apuradas, com um terço –, a situação não possibilitava a aplicação da exceção prevista no artigo 134, parágrafo 6ª, da LSA.

Por meio de recurso especial, a empresa alegou que não cabe a vedação do artigo 115, parágrafo 1º, quando os diretores são os únicos acionistas de sociedade anônima fechada. No caso, ressaltou, o sócio minoritário foi diretor por um período. Segundo a empresa, o voto desse sócio, no sentido de não aprovar as contas, teria como único objetivo causar danos à sociedade.

Ainda segundo a empresa, se o voto do controlador e acionista majoritário não puder ser computado, a situação da sociedade ficará comprometida, pois estará submetida à vontade do único acionista votante.

Conflito formal

O ministro Villas Bôas Cueva explicou que, nos termos do artigo 115, parágrafo 1º, da LSA, o acionista não poderá votar nas deliberações da assembleia geral relativas à aprovação de suas contas como administrador. Já o artigo 134, parágrafo 6ª, da mesma lei exclui essa proibição quando os diretores forem os únicos acionistas da companhia fechada – o que autorizaria que eles participassem da decisão sobre os relatórios da administração, os demonstrativos financeiros e o parecer do conselho fiscal.

Em relação ao artigo 115, o relator apontou que a aprovação de contas pelo administrador é uma situação em que se pode presumir o conflito de interesses – no caso, conflito formal, que impede a manifestação do voto.

"Observa-se que, como a proibição é verificada de início, não há como incidir somente nas situações em que ficar comprovada a existência de prejuízo", afirmou.

Ressalva inexistente

No tocante à exceção prevista pelo artigo 134, parágrafo 6º, Villas Bôas Cueva lembrou que a aprovação das contas pelos próprios administradores só é possível nas sociedades fechadas, nas quais os diretores sejam os únicos acionistas.

Para o magistrado, "o fato de o único outro sócio da sociedade anônima fechada ter ocupado cargo de administração em parte do exercício não altera a conclusão que o sócio administrador não pode aprovar as próprias contas".

Segundo o ministro, o texto da LSA não faz ressalva quanto aos acionistas serem diretores apenas em um certo período de tempo, como ocorreu no caso dos autos. Se fosse adotada a posição defendida pela empresa recorrente – avaliou o relator –, surgiria um questionamento sobre o prazo mínimo para ser afastada a proibição prevista no artigo 115, esvaziando o conteúdo da norma.

"O fato de a sociedade ter somente dois sócios não é suficiente para afastar a proibição de o administrador aprovar suas próprias contas, pois o acionista minoritário deverá proferir seu voto no interesse da sociedade, podendo responder por eventual abuso", concluiu o relator.

Leia o acórdão.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1692803

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

 

Notícias

STJ valida filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa

Família STJ valida filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa 3ª turma reconheceu vínculo de filha criada desde a infância, ainda que falecidos não tenham formalizado adoção. Da Redação terça-feira, 7 de outubro de 2025 Atualizado às 18:55 Por unanimidade, 3ª turma do STJ...

Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente

Opinião Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente Mathias Menna Barreto Monclaro 7 de outubro de 2025, 7h01 Não se deixa de reconhecer que, em certos contextos, a rigidez da solução pode suscitar debates sob a ótica da justiça material, sobretudo em heranças complexas, em...

Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência

Proteção Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência Magistrado reconheceu que a família do devedor explora diretamente a terra para sua subsistência e que os imóveis se enquadram como pequena propriedade rural. Da Redação domingo, 5 de outubro de 2025 Atualizado em 3 de outubro de...

Assinatura eletrônica e digital: entre prática judicial e debate acadêmico

Opinião Assinatura eletrônica e digital: entre prática judicial e debate acadêmico Cícero Alisson Bezerra Barros 2 de outubro de 2025, 18h25 A confusão entre os termos reside justamente no fato de a assinatura digital ser uma modalidade específica de assinatura eletrônica, mas dotada de requisitos...