Jurisprudência mineira - Apelação cível - Registro de óbito tardio

Jurisprudência mineira - Apelação cível - Registro de óbito tardio - Jurisdição voluntária - Rigorismo formal desnecessário

APELAÇÃO CÍVEL - REGISTRO DE ÓBITO TARDIO - JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA - RIGORISMO FORMAL DESNECESSÁRIO - ART. 1.109 DO CPC E ART. 5º DA LINDB - SENTENÇA MANTIDA


- Diante da possibilidade de, nos procedimentos de jurisdição voluntária, proceder-se ao julgamento com base no princípio da equidade, desconsiderando a legalidade estrita e atentando-se ao disposto no art. 5º da LINDB, impõe-se a manutenção de sentença que permite o registro de óbito tardio, sendo desarrazoada a extinção do feito com amparo em rigorismo formal, mormente considerando-se que o registro de óbito é imprescindível para a ordem pública.


Apelação Cível nº 1.0016.13.005034-3/001 - Comarca de Alfenas - Apelante: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Apelados: Oficial do Registro Civil de Pessoas Naturais da Comarca de Alfenas, Walkíria de Fátima Pereira Oliveira - Relator: Des. Peixoto Henriques


ACÓRDÃO


Vistos etc., acorda, em Turma, a 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos e à unanimidade, em negar provimento.


Belo Horizonte, 11 de março de 2014. - Peixoto Henriques - Relator.

 

NOTAS TAQUIGRÁFICAS


DES. PEIXOTO HENRIQUES - Por via de apelação (f. 15/19), insurge-se o Ministério Público do Estado de Minas Gerais contra a sentença (f. 11/13) que reconheceu o direito ao assentamento tardio de óbito.


Em suma, aduz o apelante: que o Oficial de Registro de Pessoas Naturais não possui legitimidade para requerer o registro de óbito, nos termos dos arts. 77 a 79 da Lei nº 6.015/73; e que, "ainda que fosse a genitora do falecido a requerente, esta não possui capacidade postulatória para estar em juízo, razão pela qual deveria constar contar com a assistência de um advogado".


Requer o provimento do recurso para reformar a sentença.


Dispensado o preparo.


A d. PGJ/MG, no judicioso parecer do i. Procurador de Justiça Paulo Cançado, opina pelo desprovimento do recurso (f. 31/32).

Fiel ao breve, dou por relatado.

Conquanto admissível, improcedente o apelo.


A Lei nº 6.015/73, conhecida como Lei de Registros Públicos, assim dispõe acerca do registro de óbito:

 

"Art. 77 - Nenhum sepultamento será feito sem certidão, do oficial de registro do lugar do falecimento, extraída após a lavratura do assento de óbito, em vista do atestado de médico, se houver no lugar, ou em caso contrário, de duas pessoas qualificadas que tiverem presenciado ou verificado a morte.


Art. 78. Na impossibilidade de ser feito o registro dentro de 24 (vinte e quatro) horas do falecimento, pela distância ou qualquer outro motivo relevante, o assento será lavrado depois, com a maior urgência, e dentro dos prazos fixados no artigo 50.


Art. 79. São obrigados a fazer declaração de óbitos:


1°) o chefe de família, a respeito de sua mulher, filhos, hóspedes, agregados e fâmulos;


2º) a viúva, a respeito de seu marido, e de cada uma das pessoas indicadas no número antecedente;


3°) o filho, a respeito do pai ou da mãe; o irmão, a respeito dos irmãos e demais pessoas de casa, indicadas no nº 1; o parente mais próximo maior e presente;


4º) o administrador, diretor ou gerente de qualquer estabelecimento público ou particular, a respeito dos que nele faleceram, salvo se estiver presente algum parente em grau acima indicado;


5º) na falta de pessoa competente, nos termos dos números anteriores, a que tiver assistido aos últimos momentos do finado, o médico, o sacerdote ou vizinho que do falecimento tiver notícia;


6°) a autoridade policial, a respeito de pessoas encontradas mortas.


Parágrafo único. A declaração poderá ser feita por meio de preposto, autorizando-o o declarante em escrito, de que constem os elementos necessários ao assento de óbito".


Ao exame dos artigos supratranscritos, verifica-se que, de fato, o Oficial de Registro de Pessoas Naturais não está incluído entre os obrigados a fazer a declaração de óbito.


Todavia, no caso em apreço, deve-se atentar para o fato de que o pedido foi feito pelo Oficial, atendendo à solicitação feita pela genitora do falecido, a, qual, como deixa certo o art. 79, § 1º, da Lei nº 6.015/73, está obrigada a declarar o óbito.


E, em que pese a mãe do falecido não possuir procurador, injustificável reformar-se a sentença por conta disso.


Não se deve olvidar que o registro de óbito é necessário à ordem pública, pois confere segurança jurídica às relações sociais, sendo imperiosa a observância do disposto no art. 5ª da LINDB, segundo o qual:


"Na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum".


Além disso, por se tratar de procedimento de jurisdição voluntária, tem-se que, a teor do art. 1.109 do CPC, o juiz não é obrigado "a observar critério de legalidade estrita, podendo adotar em cada caso a solução que reputar mais conveniente ou oportuna".


Trata-se, portanto, da possibilidade de decisão por equidade.


Sobre o tema, lecionam os renomados Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

"A lei processual concede ao juiz a oportunidade de aplicação de princípios de equidade, ao arrepio da legalidade estrita, podendo decidir escorado na conveniência e oportunidade, critérios próprios do poder discricionário, portanto inquisitorial, bem como de acordo com o bem comum" (Código de Processo Civil comentado. 9. ed. São Paulo: RT, p. 1.061. Em comentário de nº 1 ao art. 1.109).


"Equidade. Na concepção aristotélica, equidade não é o legalmente justo, mas sim a correção da justiça legal. O equitativo é justo. O CPC/39 114 mandava o juiz, ao decidir por equidade, aplicar a norma que estabeleceria se fosse o legislador. Na classificação de Alípio Silveira (Conceitos e funções da equidade, p. 60-62), há três acepções para o conceito de equidade: a) em sentido amplíssimo, é o princípio universal de ordem normativa relacionada a toda conduta humana, do ponto de vista religioso, moral, social e jurídico, a que todo homem deve obedecer porque se constitui em suprema regra de justiça; b) em sentido amplo, confunde-se com os conceitos de justiça absoluta ou ideal, com os princípios de direito e com a ideia de direito natural; e, c) em sentido estrito, equidade é a justiça no caso concreto" (ob. cit., p. 336 - Em comentário de nº 1 ao art. 127). No caso em apreço, ocorrido o falecimento do filho menor por afogamento, conforme declaração subscrita por médico do IML (f. 4), impõe-se a manutenção da sentença que autoriza o extemporâneo registro do óbito, sendo desarrazoada a extinção do processo conforme rigorismo formal exigido pelo d. Promotor, fato este que somente prolongaria desnecessariamente o sofrimento da mãe e benefício algum traria à coletividade.


A propósito, eis a jurisprudência:


"O art. 1.109 do CPC abre a possibilidade de não se obrigar o juiz, nos procedimentos de jurisdição voluntária, à observância do critério de legalidade estrita, abertura essa, contudo, limitada ao ato de decidir, por exemplo, com base na equidade e na adoção da solução mais conveniente e oportuna à situação concreta" (REsp nº 623.047/RJ, 3ª T./STJ, Rel.ª Min.ª Nancy Andrighi, DJ de 14.12.2004, ementa parcial).


Isso posto, contando com o sempre reconfortante aval da d. PGJ/MG, nego provimento à apelação.


Sem custas recursais (LE nº 14.939/03).


É como voto.


Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Oliveira Firmo e Wander Marotta.


Súmula - NEGARAM PROVIMENTO.

 

Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico - MG

Extraído de Recivil

Notícias

Ação com penhora no rosto dos autos não trata de questões sobre o crédito

COISAS SEPARADAS Ação com penhora no rosto dos autos não trata de questões sobre o crédito Rafa Santos 20 de junho de 2025, 7h26 Na mesma decisão, o juiz também negou pedido de suspensão do processo e homologou a arrematação do imóvel e a expedição de carta de arrematação e mandado de imissão na...

Sem intimação pessoal, alienação de bem do devedor não é válida

Falta de aviso Sem intimação pessoal, alienação de bem do devedor não é válida Martina Colafemina 15 de junho de 2025, 15h52 Com efeito, ao menos em sede de cognição sumária, não há prova de que os autores tenham sido intimados pessoalmente, daí podendo derivar a nulidade do ato de consolidação da...

A viabilidade do inventário extrajudicial e suas as vantagens no mundo atual

A viabilidade do inventário extrajudicial e suas as vantagens no mundo atual Milena Cintra de Souza O crescimento na procura da via extrajudicial para realização de inventários em todo o país e as novidades trazidas pela resolução 571/24 do CNJ. quinta-feira, 12 de junho de 2025 Atualizado às...