Reexame necessário - Direito ambiental - Ação Civil Pública - Averbação de área de reserva legal - Inscrição no Cadastro Ambiental Rural

Reexame necessário - Direito ambiental - Ação Civil Pública - Averbação de área de reserva legal - Inscrição no Cadastro Ambiental Rural

REEXAME NECESSÁRIO - DIREITO AMBIENTAL - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - AVERBAÇÃO DE ÁREA DE RESERVA LEGAL - INSCRIÇÃO NO CADASTRO AMBIENTAL RURAL - DANOS AO MEIO AMBIENTE - AUSÊNCIA DE PROVA - RESPONSABILIDADE INDENIZATÓRIA AFASTADA - NOVO CÓDIGO FLORESTAL - CONSTITUCIONALIDADE DECLARADA PELO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

- O novo Código Florestal apenas substituiu a averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel pelo registro da referida área no Cadastro Ambiental Rural (CAR) sem, contudo, extinguir a obrigatoriedade da instituição e da preservação da reserva legal, sendo certo que a edição da nova lei não acarretou retrocesso socioambiental, por não reduzir a proteção dos direitos ambientais.

- A indenização por danos ambientais decorrentes da intervenção, exploração e privação da área de reserva legal depende de prova do dano, cujo ônus compete, a priori, ao autor da ação.

- O Supremo Tribunal Federal reconheceu a constitucionalidade dos arts. 12, 15, 66 e 67 da Lei nº 12.651/12, nos autos da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 42 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4901, 4902, 4903 e 4937.

Remessa Necessária Cível nº 1.0342.13.017473-9/003 - Comarca de Ituiutaba - Remetente: Juiz de Direito da 2ª Vara Cível da Comarca de Ituiutaba - Autor: Ministério Público do Estado de Minas Gerais - Réus: Laura Villela Deleclave, Paulo Villela Deleclave, Maria Virginia Villela Delecave, Luciano Biassutti Delecave, Felipe Villela Deleclave e outra - Relator: Des. Renato Dresch

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 4ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em confirmar a sentença, no reexame necessário.

Belo Horizonte, 13 de dezembro de 2018. - Renato Dresch - Relator.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES. RENATO DRESCH - Trata-se de Reexame Necessário nos autos da Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de Minas Gerais em face de Felipe Villela Deleclave, Laura Villela Deleclave, Paulo Villela Deleclave, Luciano Biassutti Deleclave e Maria Virginia Villela Deleclave, cuja pretensão inicial consiste: i) na declaração de inconstitucionalidade dos arts. 12, 15, 18, 66, 67 e 83 da Lei Federal nº 12.651/12 e arts. 25, 31, 35, 38, 40 e 126 da Lei Estadual nº 20.922/2013; e ii) condenação dos requeridos em indenizar os danos ambientais decorrentes da intervenção, exploração e privação da área de reserva legal.

Por sentença de f. 308/313v. o Juiz Antônio Félix dos Santos, da 2ª Vara Cível da Comarca de Ituiutaba, julgou improcedentes os pedidos iniciais, nos termos do art. 487, I, do CPC/2015, sem condenação ao pagamento de custas ou honorários.

Não foram interpostos recursos voluntários e a sentença foi submetida ao reexame necessário.

A Procuradoria-Geral de Justiça opinou pela manutenção da sentença às f. 319/320v.

É o relatório.

Conheço do reexame necessário, diante da presença de seus pressupostos de admissibilidade.
Da regularização da área de reserva legal.

A Constituição Federal de 1988, em seu art. 225, dispõe que "todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações".

Estabelece o referido artigo, em seu parágrafo primeiro, que incumbe ao Poder Público assegurar a efetividade do direito ao meio ambiente, definindo os parâmetros de ocupação das áreas urbanas e rurais e os limites no desempenho das atividades econômicas.

A defesa do meio ambiente é destacada como princípio norteador da ordem econômica, nos termos do inciso VI do art. 170 da Constituição Federal:

“Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

[...]

VI - defesa do meio ambiente, inclusive mediante tratamento diferenciado conforme o impacto ambiental dos produtos e serviços e de seus processos de elaboração e prestação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003);” [...]

Tratando-se de propriedade rural, a sua utilização somente se torna plena quando atendida a sua função social, assim definida pelo art. 186 da Constituição Federal:

“Art. 186. A função social é cumprida quando a propriedade rural atende, simultaneamente, segundo critérios e graus de exigência estabelecidos em lei, aos seguintes requisitos:

I - aproveitamento racional e adequado;

II - utilização adequada dos recursos naturais disponíveis e preservação do meio ambiente;

III - observância das disposições que regulam as relações de trabalho;

IV - exploração que favoreça o bem-estar dos proprietários e dos trabalhadores.”

Quando esta ação foi ajuizada já se encontrava em vigor a Lei Federal nº 12.651, de 25 de maio de 2012 - Novo Código Florestal - que expressamente revogou a Lei nº 4.771/65, passando a tratar do instituto da Reserva Legal com a seguinte redação:

“Art. 18. A área de Reserva Legal deverá ser registrada no órgão ambiental competente por meio de inscrição no CAR de que trata o art. 29, sendo vedada a alteração de sua destinação, nos casos de transmissão, a qualquer título, ou de desmembramento, com as exceções previstas nesta Lei.

§ 1º A inscrição da Reserva Legal no CAR será feita mediante a apresentação de planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração, conforme ato do Chefe do Poder Executivo.

§ 2º Na posse, a área de Reserva Legal é assegurada por termo de compromisso firmado pelo possuidor com o órgão competente do Sisnama, com força de título executivo extrajudicial, que explicite, no mínimo, a localização da área de Reserva Legal e as obrigações assumidas pelo possuidor por força do previsto nesta Lei.

§ 3º A transferência da posse implica a sub-rogação das obrigações assumidas no termo de compromisso de que trata o § 2º.

§ 4º. O registro da Reserva Legal no CAR desobriga a averbação no Cartório de Registro de Imóveis, sendo que, no período entre a data da publicação desta Lei e o registro no CAR, o proprietário ou possuidor rural que desejar fazer a averbação terá direito à gratuidade deste ato”.

“Art. 29. É criado o Cadastro Ambiental Rural - CAR, no âmbito do Sistema Nacional de Informação sobre Meio Ambiente - SINIMA, registro público eletrônico de âmbito nacional, obrigatório para todos os imóveis rurais, com a finalidade de integrar as informações ambientais das propriedades e posses rurais, compondo base de dados para controle, monitoramento, planejamento ambiental e econômico e combate ao desmatamento.

§ 1º A inscrição do imóvel rural no CAR deverá ser feita, preferencialmente, no órgão ambiental municipal ou estadual, que, nos termos do regulamento, exigirá do proprietário ou possuidor rural:

I - identificação do proprietário ou possuidor rural;

II - comprovação da propriedade ou posse;

III - identificação do imóvel por meio de planta e memorial descritivo, contendo a indicação das coordenadas geográficas com pelo menos um ponto de amarração do perímetro do imóvel, informando a localização dos remanescentes de vegetação nativa, das Áreas de Preservação Permanente, das Áreas de Uso Restrito, das áreas consolidadas e, caso existente, também da localização da Reserva Legal.

§ 2º O cadastramento não será considerado título para fins de reconhecimento do direito de propriedade ou posse, tampouco elimina a necessidade de cumprimento do disposto no art. 2º da Lei no 10.267, de 28 de agosto de 2001.

§ 3º A inscrição no CAR será obrigatória para todas as propriedades e posses rurais, devendo ser requerida no prazo de 1 (um) ano contado da sua implantação, prorrogável, uma única vez, por igual período por ato do Chefe do Poder Executivo”.

A obrigatoriedade da instituição de reserva ambiental é matéria que já estava consolidada no STJ antes da vigência do novo Código Florestal.

Vejamos:

“Administrativo. Ação civil pública. Instituição de reserva florestal. Dever de obediência. Obrigação do proprietário ou possuidor do imóvel rural. Omissão. Inexistência. Ausência de prequestionamento. Súmula 211/STJ. Alegação de que houve constituição de reserva florestal e de que não ocorreu degradação ambiental. Necessidade de reexame do contexto fático. Súmula 7/STJ. 1 - Na hipótese em exame, o Tribunal de origem decidiu o ponto relativo à constituição da Reserva Legal de forma cabal e hialina.

Portanto, não se configura ofensa ao art. 535 do Código de Processo Civil, uma vez que o Sodalício a quo julgou integralmente a lide e solucionou a controvérsia, tal como lhe foi apresentada. 2 - O entendimento da Corte originária (f. 536-540/STJ) está em conformidade com a orientação do STJ, de que a delimitação e a averbação da Reserva Legal configuram dever do proprietário ou adquirente do imóvel rural, independentemente da existência de florestas ou outras formas de vegetação nativa na gleba.

Outrossim, constitui obrigação do proprietário ou adquirente tomar as providências necessárias à restauração ou à recuperação das formas de vegetação nativa para se adequar aos limites percentuais previstos nos incisos do art. 16 do Código Florestal” (EREsp 218.781/PR, Rel. Ministro Herman Benjamin, Primeira Seção, DJe de 23/2/2012; no mesmo sentido, RMS 21.830/MG, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 1º/12/2008; RMS 22.391/MG, Rel.ª Min.ª Denise Arruda, DJe de 3/12/2008; REsp 973.225/MG, Rel.ª Min.ª Eliana Calmon, DJe de 3/9/2009, REsp 821.083/MG, Rel. Min. Luiz Fux, DJe de 9/4/2008; REsp 1.087.370/PR, Rel.ª Ministra Denise Arruda, Primeira Turma, DJe de 27/11/2009; EDcl no Ag 1.224.056/SP, Rel. Ministro Mauro Campbell Marques, Segunda Turma, DJe de 6/8/2010 ). 3 - Em matéria ambiental, a adoção do princípio tempus regit actum impõe obediência à lei em vigor, quando da ocorrência do fato ilícito (AgRg no REsp 1.367.968/SP, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe de 12/3/2014; REsp 1.090.968/SP, Rel. Ministro Luiz Fux, Primeira Turma, DJe de 3/8/2010; REsp 625.024/RO, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 4/5/2011). 4 - Agravo Regimental não provido (STJ - AgRg no AREsp 231561/MG - Agravo Regimental no Agravo em Recurso Especial 2012/0195751-5 - Rel. Min. Herman Benjamin (1132), Segunda Turma, j. em 16/12/2014, p. em DJe de 3/2/2015).

O novo Código Florestal apenas substituiu a averbação da área de reserva legal na matrícula do imóvel pelo registro da referida área no Cadastro Ambiental Rural - CAR, sem, contudo, extinguir a obrigatoriedade da instituição e da preservação da reserva legal.

Por outro lado, importante asseverar que, a teor do que dispõe o § 4º do art. 18 supracitado, o proprietário ou possuidor do imóvel rural apenas se desobriga da averbação da área de reserva legal no cartório de registro de imóveis quando comprovar que providenciou o registro da área no CAR - Cadastro Ambiental Rural.

Nesse sentido, o CAR, regulamentado pelo Decreto nº 7.830, de 17 de outubro de 2012, foi efetivamente implantado em 9/5/2014, pela Instrução Normativa nº 02/2014 do Ministério do Meio Ambiente, sendo certo que, com a implantação, o registro da reserva legal neste cadastro passou a ser obrigatório.

O prazo para a inscrição pelo CAR sofreu diversas prorrogações, sendo a última promovida pelo Decreto nº 9.395, de 30 de maio de 2018, estabelecendo atualmente o prazo limite para a inscrição do CAR em 31 de dezembro de 2018.

Ocorre que, enquanto a inscrição no CAR for facultativa, subsiste a obrigação de averbar a reserva na matrícula do imóvel. Assim, o proprietário do imóvel rural deverá optar pela averbação na matrícula do imóvel ou pela inscrição no CAR.

Cumpre destacar que o Supremo Tribunal Federal concluiu o julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 42 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4901, 4902, 4903 e 4937, que tratavam da constitucionalidade do novo Código Florestal (Lei 12.651/2012), reconhecendo a constitucionalidade dos arts. 12, 15, 66 e 67 da Lei nº 12.651/12, não havendo que se falar, ainda, na inconstitucionalidade da Lei nº 20.922/2013.

No caso destes autos, verifica-se que os requeridos realizaram a inscrição do imóvel no Cadastro Ambiental Rural em 6/9/2014 (f. 240/248), o que os desobriga da averbação da Reserva Legal na matrícula do imóvel. Também comprovaram a regularização quanto à utilização de recursos hídricos em sua propriedade (f. 297/302).

Em contrapartida, o autor da ação não comprovou a existência de danos ambientais a ensejar a reparação ou compensação, ônus que lhe incumbia.

Não há que se cogitar, portanto, da indenização por danos ambientais decorrentes da intervenção, exploração e privação da área de reserva legal.

Quanto ao requerimento de inconstitucionalidade dos dispositivos do Novo Código Florestal e dos dispositivos legais correspondentes na Lei Estadual nº 20.922/2013, trata-se de matéria que ficou prejudicada com o julgamento da constitucionalidade dos referidos dispositivos do Código Florestal pelo STF por meio da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) nº 42 e das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4901, 4902, 4903 e 4937.

Diante do exposto, em reexame necessário, confirmo a sentença.

Sem custas recursais.

Votaram de acordo com o Relator os Desembargadores Moreira Diniz e Dárcio Lopardi Mendes.

Súmula - CONFIRMARAM A SENTENÇA, NO REEXAME NECESSÁRIO.

Data: 07/02/2019 - 09:42:21   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG

 

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