Terceira Turma garante direito à indicação de gênero neutro no registro civil

DECISÃO
09/05/2025 07:00 
 

Terceira Turma garante direito à indicação de gênero neutro no registro civil

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) decidiu, por unanimidade, que é possível retificar o registro civil para fazer constar o gênero neutro. Para o colegiado, apesar de não existir legislação específica sobre o tema, não há razão jurídica para a distinção entre pessoas transgênero binárias – que já possuem o direito à alteração do registro civil, de masculino para feminino ou vice-versa – das não binárias, devendo prevalecer no registro a identidade autopercebida pelo indivíduo.

Ainda segundo o colegiado, o direito à autodeterminação de gênero e à identidade sexual está intimamente relacionado ao livre desenvolvimento da personalidade e ao direito do ser humano de fazer as escolhas que dão sentido à sua vida. Por outro lado, os ministros esclareceram que a decisão não elimina o registro de gênero da certidão de nascimento, mas apenas assegura à pessoa o reconhecimento formal de sua identidade.

"Todos que têm gênero não binário e querem decidir sobre sua identidade de gênero devem receber respeito e dignidade, para que não sejam estigmatizados e fiquem à margem da lei", declarou a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, acrescentando que tais pessoas têm o direito de se autodeterminar.

Instâncias ordinárias negaram a retificação do registro civil

No caso analisado, a pessoa que ajuizou a ação de retificação de registro civil diz ter enfrentado dificuldades emocionais e psicológicas, tendo feito cirurgias e tratamento hormonal para mudar de sexo. Apesar de já ter alterado o nome e o gênero no registro, percebeu que, na verdade, não se identificava como homem nem como mulher – ou seja, era não binária.

Antes de recorrer ao STJ, ela teve o pedido negado pelas instâncias ordinárias. O Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) afirmou, entre outras questões, que o ordenamento jurídico prevê apenas a existência dos gêneros feminino e masculino, e que a eventual adoção do gênero neutro exigiria antes um amplo debate e o estabelecimento de uma regulamentação a respeito.

Jurisprudência já admite que pessoas trans mudem prenome e gênero

Nancy Andrighi ressaltou que toda pessoa tem assegurada a autonomia para a determinação de uma personalidade livre, sem interferência do Estado ou de particulares. Dessa forma, prosseguiu, a autodeterminação de gênero e a identidade sexual – direitos amparados por cláusula geral de proteção à personalidade prevista no artigo 12 do Código Civil – estão diretamente ligadas às escolhas pessoais que dão sentido à vida.

Segundo a relatora, a evolução da jurisprudência e as alterações legislativas permitiram até aqui que pessoas transgênero pedissem extrajudicialmente a mudança de prenome e gênero, de acordo com sua autoidentificação. No entanto, ela explicou que essas alterações levaram em conta a lógica binária de gênero masculino/feminino, a qual representa a normatividade padrão esperada pela sociedade.

"Seria incongruente admitir-se posicionamento diverso para a hipótese de transgeneridade binária e não binária, uma vez que em ambas as experiências há dissonância com o gênero que foi atribuído ao nascimento, devendo prevalecer a identidade autopercebida, como reflexo da autonomia privada e expressão máxima da dignidade humana", refletiu a ministra.

Falta de regra específica não pode deixar o tema sem solução

Com base nos artigos 4º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro e 140 do Código de Processo Civil, Nancy Andrighi lembrou que a lacuna sobre o tema na legislação não pode deixá-lo sem solução nem ser confundida com ausência do próprio direito.

A relatora comentou que já existem experiências estrangeiras na área do direito que reconhecem a existência de um terceiro gênero, não binário. Como exemplos, citou a Alemanha, a Austrália, a França, a Holanda e a Índia.

O número deste processo não é divulgado em razão de segredo judicial.

Resumo em linguagem simples:

O STJ decidiu que a pessoa que não se identifica como homem nem como mulher – chamada de não binária – tem o direito de mudar o registro civil para que conste o gênero neutro. O tribunal entendeu que, apesar de não existir lei sobre esse tema, não há razão para tratar de forma diferente as pessoas transgênero binárias – que já têm o direito à alteração do registro civil – e as não binárias, devendo prevalecer no registro a identidade autopercebida pelo indivíduo. O STJ também esclareceu que essa decisão não elimina o registro de gênero na certidão de nascimento, mas apenas garante à pessoa o reconhecimento formal de sua identidade.

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

                                                                                                                            

 

Notícias

Como fica a divisão de bens no divórcio? Entenda de vez

Como fica a divisão de bens no divórcio? Entenda de vez Alessandro Junqueira de Souza Peixoto Vai se divorciar e não sabe como dividir os bens? Entenda como o regime de bens escolhido impacta diretamente na partilha e evite surpresas no momento mais delicado da separação. quarta-feira, 4 de junho...

Advogada esclarece o que ocorre com dados digitais após falecimento

Herança digital Advogada esclarece o que ocorre com dados digitais após falecimento Com a ausência de uma legislação específica, cresce a necessidade de planejamento sucessório para ativos digitais como contas online, criptomoedas e arquivos pessoais. Da Redação terça-feira, 3 de junho de...

Imóvel não deve ser alienado sem que haja intimação do devedor

ÔNUS INVERTIDO Imóvel não deve ser alienado sem que haja intimação do devedor Martina Colafemina 29 de maio de 2025, 7h49 Como, no caso, o credor não anexou provas da intimação, o juiz classificou como verdadeiros os fatos narrados pela autora e anulou a execução extrajudicial. Confira em Consultor...