Usucapião pode fundamentar anulação de negócio por erro essencial

Usucapião pode fundamentar anulação de negócio por erro essencial

17 de julho de 2014 às 14:23

A existência de usucapião a favor do comprador do imóvel pode fundamentar a anulação de negócio jurídico de compra e venda por erro essencial. O entendimento é da Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça ao rejeitar recurso interposto contra decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul (TJRS), que entendeu que a usucapião, apesar de ainda não reconhecida em sentença, poderia anular o negócio por erro essencial do contratante.

O erro essencial é aquele sem o qual o contratante não concluiria o negócio. No caso analisado pelo STJ, o comprador alegou que foi pressionado pela imobiliária a adquirir um imóvel em cuja posse já estava havia 16 anos, e que chegou a pagar 216 parcelas do contrato.

Tanto o juízo singular quanto o tribunal local entenderam que o comprador foi induzido a adquirir um bem que já lhe pertencia pelo decurso de prazo. O TJRS ainda reconheceu o direito à devolução das parcelas.

O vendedor alegou em recurso ao STJ que as partes pactuaram livremente as condições do contrato e que não teria havido coação, pois o objetivo era apenas regularizar a situação do invasor do imóvel. As instâncias ordinárias entenderam que o comprador era pessoa simples, que não tinha conhecimento de seu direito à declaração de domínio pela prescrição aquisitiva.

Homem mediano

O Código Civil de 1916 considerava anulável o ato jurídico por vício resultante de erro, dolo, coação, simulação ou fraude. Quanto ao erro, estabeleceu serem anuláveis os atos jurídicos quando as declarações de vontade resultassem de erro substancial. Segundo o relator do caso, ministro Luis Felipe Salomão, o Código de 2002 manteve a regra de que o erro ou a ignorância é causa de anulação dos negócios jurídicos.

A jurisprudência do STJ é no sentido de que o erro que motiva a anulação de negócio jurídico, além de essencial, deve ser perdoável em razão do desconhecimento natural das particularidades do negócio jurídico pelo homem mediano. Para ser desculpável, o erro deve ser de tal monta que qualquer pessoa de inteligência mediana o cometeria.

No caso julgado, o relator considerou que não parece crível que uma pessoa faria negócio para adquirir uma propriedade que já é do seu domínio. “Parece ter havido também um induzimento malicioso com o propósito de obter uma declaração de vontade que não seria emitida se o declarante não tivesse sido ludibriado”, afirmou o ministro.

Dolo

Para Salomão, é razoável que o comprador – auxiliar de serviços gerais, com baixo nível de instrução e sem familiaridade com assuntos jurídicos – “não soubesse que o exercício de sua posse no imóvel por um longo lapso temporal seria hábil a lhe conferir a propriedade do bem”.

O dolo que motiva a anulação do negócio jurídico é tanto o comissivo quanto o omissivo, disse Salomão, ao mencionar que o Código Civil de 1916, em seu artigo 94, já estabelecia que “nos atos bilaterais o silêncio intencional de uma das partes a respeito de fato ou qualidade que a outra parte haja ignorado constitui omissão dolosa”.

O relator observou ainda que, “preenchidos os requisitos da usucapião, há, de forma automática, o direito à transferência do domínio, não sendo a sentença requisito formal à aquisição da propriedade”. Ele explicou que, decorrido o prazo previsto em lei, o possuidor passa a deter o domínio sobre o imóvel, e que a sentença no processo de usucapião é meramente declaratória, servindo como título para ser levado ao registro de imóveis.

Esta notícia se refere ao processo: REsp 1163118


Superior Tribunal de Justiça (STJ)

Notícias

TJ-MG concede a quebra de sigilo bancário em uma ação de divórcio

Cadê o dinheiro? TJ-MG concede a quebra de sigilo bancário em uma ação de divórcio 4 de fevereiro de 2025, 19h12 Ao decidir, o desembargador entendeu que estavam presentes no caso os requisitos do artigo 300 do Código de Processo Civil para a concessão de pedido liminar: probabilidade do direito e...

STJ: Partilha em que filho recebeu R$ 700 mil e filha R$ 39 mil é nula

Doação inoficiosa STJ: Partilha em que filho recebeu R$ 700 mil e filha R$ 39 mil é nula Relatora, ministra Nancy Andrighi, ressaltou a necessidade de respeitar a legítima dos herdeiros. Da Redação terça-feira, 4 de fevereiro de 2025 Atualizado às 18:04 STJ declarou nula partilha em vida realizada...

Planejamento sucessório: o risco da inércia da holding

Planejamento sucessório: o risco da inércia da holding No universo do planejamento sucessório, a ferramenta que certamente ganhou mais atenção nos últimos tempos foi a holding. Impulsionada pelas redes sociais e por um marketing sedutor, a holding tornou-se figurinha carimbada como um produto capaz...

Bloqueio de imóvel pela Justiça agora é seletivo: veja o que mudou

Bloqueio de imóvel pela Justiça agora é seletivo: veja o que mudou Novo sistema dos cartórios permite aos juízes escolher os bens de acordo com o valor para serem bloqueados, cobrindo apenas o valor da dívida Anna França 30/01/2025 15h00 • Atualizado 5 dias atrás O avanço da digitalização dos...