Doação de imóvel em vida exige cuidado para evitar nulidade e litígios

Doação de imóvel em vida exige cuidado para evitar nulidade e litígios

Werner Damásio

Transferência de bens antes da morte pode ser estratégica, mas envolve limites legais, formalidades e riscos que devem ser bem compreendidos por doadores e donatários.

quinta-feira, 2 de outubro de 2025
Atualizado às 14:46

Introdução

A doação de bens imóveis em vida é uma prática comum no planejamento patrimonial, especialmente quando o objetivo é evitar inventário ou antecipar parte da herança. Apesar de suas vantagens, essa escolha jurídica envolve obrigações formais e limites legais que, se não forem respeitados, podem gerar disputas judiciais e até a anulação do ato. Entender como esse tipo de doação funciona, quais os direitos dos herdeiros e quais precauções devem ser adotadas é essencial para garantir segurança ao doador e ao beneficiário.

Regras legais e exigências formais para a doação de imóveis

A legislação brasileira estabelece regras específicas para a doação de bens imóveis, principalmente quanto à forma e ao valor envolvido. Quando o imóvel tem valor superior a 30 salários mínimos, a escritura pública em cartório é obrigatória. Além disso, o registro da doação no Cartório de Registro de Imóveis é indispensável para que o ato tenha validade perante terceiros.

É possível doar imóveis de menor valor por instrumento particular, mas essa prática é desaconselhada na maioria dos casos, dada a fragilidade jurídica que pode expor tanto o doador quanto o donatário. O ideal é que qualquer transferência imobiliária, independentemente do valor, seja formalizada com escritura pública e registrada.

Outro ponto importante é o recolhimento do imposto estadual sobre doações, o ITCMD - Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação, cuja alíquota varia conforme o Estado da federação. A ausência do pagamento pode impedir o registro da doação ou gerar questionamentos futuros.

Limites e cuidados com herdeiros necessários

Mesmo que o doador tenha plena capacidade civil, ele não pode dispor livremente de todo o seu patrimônio. Isso porque o CC resguarda aos herdeiros necessários - descendentes, ascendentes e o cônjuge - o direito à metade da herança, chamada de "legítima".

Assim, qualquer doação feita que ultrapasse a parte disponível do patrimônio, ou seja, que comprometa a legítima dos herdeiros, poderá ser objeto de impugnação no futuro. Essas doações podem ser revistas judicialmente no momento do inventário, por meio da chamada ação de redução, com a finalidade de recompor os direitos dos demais herdeiros.

Além disso, no caso de doações entre pais e filhos, essas transferências são tratadas como adiantamento da legítima, salvo disposição expressa em sentido contrário. Isso significa que o valor do bem doado será considerado na partilha futura, para evitar que um herdeiro receba mais do que os demais.

Cláusulas de proteção patrimonial e reversão

Para manter certo grau de controle sobre o bem doado, o doador pode impor cláusulas que restringem o uso ou a disposição do imóvel pelo donatário. As mais comuns são:

. Usufruto: O doador pode doar a nua-propriedade, mas manter para si o direito de uso e fruição do imóvel até o fim da vida. Isso garante, por exemplo, o direito de morar no imóvel ou receber aluguéis, mesmo após a transferência.

. Inalienabilidade: Impede que o bem doado seja vendido ou transferido pelo donatário.

. Impenhorabilidade: Protege o imóvel contra dívidas futuras, impedindo que ele seja objeto de penhora judicial.

. Incomunicabilidade: Evita que o bem integre o patrimônio comum do casal, caso o donatário se case sob regime de comunhão.

Outro mecanismo de proteção é a cláusula de reversão, que permite que o bem retorne ao patrimônio do doador caso o donatário venha a falecer antes dele. Essa cláusula é especialmente útil em doações a filhos, netos ou pessoas mais jovens.

Casos em que a doação pode ser anulada

Embora a doação seja, em regra, um ato irreversível, existem hipóteses legais que autorizam sua revogação. A mais conhecida é a doação por ingratidão, que ocorre quando o donatário pratica atos graves contra o doador, como atentado contra a vida, agressão física, injúria grave ou recusa injustificada de prestar alimentos.

Além disso, o CC prevê a possibilidade de anulação de doações realizadas a amantes, quando configurada a infidelidade do doador. Essa anulação pode ser requerida pelo cônjuge ou pelos herdeiros no prazo de até dois anos após a dissolução da união, seja por divórcio ou morte.

Também são passíveis de anulação as doações feitas em prejuízo do sustento do próprio doador. Isso significa que não se pode doar todo o patrimônio, deixando-se em situação de miserabilidade. O Judiciário pode intervir para proteger o próprio doador, especialmente se ficar comprovado que ele não compreendia as consequências da doação no momento do ato.

Riscos de conflitos e precauções necessárias

Transferências patrimoniais feitas por impulso, sem planejamento, ou sem comunicação prévia com os demais membros da família, costumam ser fontes de conflito. A doação pode ser vista por outros herdeiros como ato de favorecimento, o que gera disputas emocionais e jurídicas.

Por isso, é altamente recomendável que o processo seja feito com a intermediação de um advogado ou tabelião de confiança, que possa orientar quanto aos limites legais, às cláusulas adequadas e à melhor forma de formalização.

Além disso, uma análise da situação fiscal do imóvel, do regime de bens do donatário e da existência de dívidas em nome de qualquer uma das partes deve ser realizada com antecedência.

Conclusão

A doação de imóveis em vida é uma ferramenta legítima e eficaz para organizar o patrimônio e antecipar a sucessão, desde que feita de forma consciente, planejada e respeitando os limites legais.

Ignorar aspectos como a legítima dos herdeiros, a necessidade de escritura pública e os mecanismos de proteção pode transformar um gesto generoso em um imbróglio judicial. Por isso, antes de doar, o mais prudente é buscar orientação jurídica especializada e avaliar todas as implicações do ato.

Compartilhe este conteúdo com quem está considerando doar um imóvel e pode se beneficiar dessas informações. E, se for o seu caso, não hesite em buscar aconselhamento jurídico para tomar a melhor decisão.

Werner Damásio
Advogado pós-graduado em Direito Privado, especialista em Direito Civil, Empresarial e Imobiliário. Sócio do Lettieri Damásio Advogados, com 17 anos de atuação nacional.

Fonte: Migalhas

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