Ação de usucapião - Imóvel decorrente de herança - Posse exercida com exclusividade por um dos herdeiros - Direito de usucapir a totalidade do bem - Possibilidade

Ação de usucapião - Imóvel decorrente de herança - Posse exercida com exclusividade por um dos herdeiros - Direito de usucapir a totalidade do bem - Possibilidade

AÇÃO DE USUCAPIÃO - IMÓVEL DECORRENTE DE HERANÇA - POSSE EXERCIDA COM EXCLUSIVIDADE POR UM DOS HERDEIROS - DIREITO DE USUCAPIR A TOTALIDADE DO BEM - POSSIBILIDADE - INTERESSE DE AGIR - EXISTÊNCIA

- Ainda que o imóvel já pertença à parte por for força de direito hereditário, tal fato não obsta o reconhecimento da prescrição aquisitiva sobre o imóvel que, segundo afirma, mantém sob sua posse, com exclusividade dentre os demais herdeiros, com animus domini, por lapso temporal superior a 10 (dez) anos, sem oposição dos demais coproprietários e, ainda, realizando serviços de caráter produtivo, o que haverá de ser apurado no transcurso do processo.

Apelação Cível nº 1.0570.15.001965-3/001 - Comarca de Salinas - Apelante: Osvaldira de Oliveira Costa - Apelado: Espólio de Carlos Antônio de Oliveira - Relatora: Des.ª Aparecida Grossi

ACÓRDÃO

Vistos etc., acorda, em Turma, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, na conformidade da ata dos julgamentos, em dar provimento ao recurso e cassar a sentença.

Belo Horizonte, 6 de abril de 2016. - Aparecida Grossi - Relatora.

NOTAS TAQUIGRÁFICAS

DES.ª APARECIDA GROSSI - Trata-se de recurso de apelação interposto por Osvaldira de Oliveira Costa contra a sentença proferida pelo MM. Juiz da 2ª Vara Cível da Comarca de Salinas, que, nos autos da ação de usucapião por ela ajuizada, julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, nos termos do art. 267, VI, do CPC, por falta de interesse de agir.

Inconformada, a autora aviou recurso de apelação às f. 29/34, alegando, em síntese, ser possível a usucapião de propriedade de bem decorrente de herança.

Sem contrarrazões.

É o relatório.

Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do recurso e passo à análise da pretensão recursal.

A usucapião constitui meio de aquisição da propriedade pela posse continuada, durante certo decurso de tempo, desde que observados os requisitos da lei, quais sejam: a posse mansa, pacífica e ininterrupta, o decurso do prazo legalmente previsto e o animus domini.

O art. 1.238, parágrafo único, do Código Civil define a usucapião extraordinária com prazo reduzido:

``Art. 1.238. [...]

Parágrafo único. O prazo estabelecido neste artigo reduzir-se-á a dez anos se o possuidor houver estabelecido no imóvel a sua moradia habitual, ou nele realizado obras ou serviços de caráter produtivo.

Nessa modalidade de usucapião, não se exige do possuidor título algum nem que esteja imbuído de boa-fé, pois esses são aspectos dispensados pela norma legal.

Assim, o possuidor, se mantiver a coisa como sua, por dez anos, de maneira ininterrupta e sem oposição, estabelecendo o imóvel como sua moradia habitual ou nele estiver realizando obras ou serviços de caráter produtivo, poderá adquirir-lhe a propriedade.

No caso vertente, consta da inicial que o imóvel cuja aquisição prescritiva se pretende era do genitor da autora, que faleceu no ano de 1991, e, desde então, a requerente passou a exercer a posse sobre o bem.

Como se nota, trata-se de bem de herança que a autora adquiriu uma vez aberta a sucessão com o falecimento de seu genitor, Carlos Antônio de Oliveira.

Como ensinam Nelson Nery Júnior e Rosa Maria de Andrade Nery:

``Com a morte do autor da herança, a posse e a propriedade dos bens que a compõem transmitem-se desde logo aos herdeiros, sem que haja necessidade nem de intenção de ter como proprietário ou de possuir (animus), nem de apreensão física da coisa (corpus). [...] A transmissão da posse e da propriedade para os novos titulares dá-se ope legis, independentemente de qualquer outro ato, providência ou circunstância. Ainda que não tenha sido aberto inventário, os herdeiros já são possuidores e proprietários a partir do momento da morte do de cujus (Código Civil comentado. 8. ed., São Paulo, RT, p. 1291, comentário 7 ao art. 1.784).

Entrementes, independe se o imóvel já pertence à apelante por força de direito hereditário, não se podendo negá-lhe o acesso ao Judiciário para a obtenção do reconhecimento da prescrição aquisitiva sobre o imóvel, que, segundo afirma, mantém sob sua posse, com exclusividade dentre os demais herdeiros, com animus domini, por lapso temporal superior a 10 (dez) anos, sem oposição dos demais coproprietários e, ainda, realizando serviços de caráter produtivo, o que haverá de ser apurado no transcurso do processo.

Nesse sentido, já se posicionou esta 16ª Câmara Cível, bem como o Superior Tribunal de Justiça, conforme ementas abaixo colacionadas:

``Usucapião. Imóvel mantido em comunhão com os demais herdeiros. Posse exclusiva pelo condômino. Falta de interesse de agir afastada. - A doutrina e também a jurisprudência deste Tribunal tem admitido a possibilidade de que, aberta a sucessão e estabelecido um condomínio, o condômino adquira a propriedade do imóvel comum através de usucapião, desde que prove, na fase de instrução, que vem exercendo a posse com exclusividade, não havendo que se falar na falta de interesse de agir do autor." Apelação Cível 1.0704.10.008763-1/001, Rel. Des. Batista de Abreu, 16ª Câmara Cível, j. em 29.05.2014, p. em 11.06.2014.)

``Ação de usucapião. Herdeira. Possibilidade. Legitimidade. Ausência de pronunciamento pelo tribunal acerca do caráter público do imóvel objeto de usucapião que se encontra com a Caixa Econômica Federal. Provimento do recurso especial. - 1. O condômino tem legitimidade para usucapir em nome próprio, desde que exerça a posse por si mesmo, ou seja, desde que comprovados os requisitos legais atinentes à usucapião, bem como tenha sido exercida posse exclusiva com efetivo animus domini pelo prazo determinado em lei, sem qualquer oposição dos demais proprietários. [...]". (REsp 668131/PR, Rel. Ministro Luis Felipe Salomão, Quarta Turma, j. em 19.08.2010, DJe de 14.09.2010.)

Dessarte, considerando que as condições da ação são aferidas in statu assertionis, abstratamente, à vista da descrição fática abordada na petição inicial, ao menos a princípio, no caso em apreço, verifica-se a necessidade da invocação da tutela jurisdicional e adequada a via processual eleita para a obtenção do resultado prático almejado.

Com tais considerações, dou provimento ao recurso para cassar a sentença e determinar o regular prosseguimento e necessária instrução do feito, preservado o contraditório.

Custas recursais, ao final, pela parte vencida.

Votaram de acordo com a Relatora os Desembargadores Pedro Aleixo e Otávio de Abreu Portes.

Súmula - DERAM PROVIMENTO AO RECURSO.

Data: 02/05/2016 - 10:20:46   Fonte: Diário do Judiciário Eletrônico
Extraído de Sinoreg/MG

Notícias

Herança digital e o testamento como aliado

Herança digital e o testamento como aliado Thauane Prieto Rocha A herança digital ganha destaque como parte essencial do testamento, permitindo que o testador decida sobre bens e memórias digitais após a morte. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado em 28 de abril de 2025 08:08 Ao realizar uma...

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório Gabriel Vaccari Holding/Sucessão: Cuidado online! Artigo expõe riscos de soluções fáceis (procuração, S.A., 3 células). Evite armadilhas fiscais/legais. Leitura essencial para famílias e advogados. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado...

Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido

Processo Familiar Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido Mário Luiz Delgado 20 de abril de 2025, 8h00 Os bens recebidos em antecipação da herança necessária (legítima), nos moldes do artigo 544 do CC [6], quando “conferidos” pelo herdeiro após a abertura da sucessão, NÃO...

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário

10 informações jurídicas essenciais acerca do inventário Amanda Fonseca Perrut No presente artigo, abordamos pontos cruciais sobre inventário, como prazo, multas e recolhimento de tributos, dentre outros. segunda-feira, 21 de abril de 2025 Atualizado em 17 de abril de 2025 14:23 De modo a auxiliar...

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório

Partilha testamentária como meio eficaz de planejamento sucessório Amanda Fonseca Perrut A indicação de bens específicos pelo testador a determinado herdeiro é possível e evita eventuais disputas sucessórias. quinta-feira, 17 de abril de 2025 Atualizado às 09:11 É juridicamente possível atribuir...