Clube recreativo tem responsabilidade civil subjetiva

09/02/2011

Clube recreativo tem responsabilidade civil subjetiva
Da relação entre clube e associado podem decorrer várias situações que desafiam a interpretação do jurista. O presente artigo tem o escopo de analisar qual a natureza jurídica da responsabilidade civil que nasce dessa relação – subjetiva ou objetiva – e, em decorrência, se são aplicáveis os ditames do Código de Defesa do Consumidor.
Maria Helena Diniz define a responsabilidade civil como “a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar o dano moral ou patrimonial causado a terceiro em razão de ato próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva).” [1]
Assim, é sabido que a responsabilidade subjetiva exige a presença do elemento culpa, ao passo que a objetiva, decorre de lei, independentemente, da existência ou não da culpa. A questão que se enfrenta nesse momento é se o conceito de fornecedor apresentado no artigo 3º do CDC se estende aos clubes recreativos, e, via de consequência, se a responsabilidade civil decorrente é objetiva. Dispõe o mencionado dispositivo legal:
Art. 3º. Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.
Ainda que os clubes, em regra, sejam associações, as quais têm caráter de ente despersonalizado, para que se caracterize como fornecedor/prestador de serviço nos termos do CDC, deve ser levado em conta o seu fim social. No caso dos clubes, sua atividade não se enquadra em nenhuma daquelas previstas no artigo supracolacionado, o que por si só já resolveria a questão.


A diferença existente entre clube e empresa com qualidade de fornecedor/prestador de serviço é que, no primeiro, em decorrência de sua natureza, as decisões são tomadas pelos próprios associados, ao passo que, nas demais, são tomadas exclusivamente pelos proprietários/sócios da empresa sem que o interessado possa intervir de qualquer maneira.
Assim, considerando que são os próprios associados dos clubes que deliberam acerca de seus destinos, não se pode dizer que eventual serviço prestado seja caracterizado como relação de consumo. José Geraldo Brito Filomeno, a respeito do assunto, ensina que “quem delibera sobre seus destinos são os próprios interessados, não se podendo dizer que eventuais serviços prestados pelos seus empregados, funcionários ou diretores, síndico e demais dirigentes comunitários, sejam enquadráveis no rótulo 'fornecedores', conforme nomenclatura do Código de Defesa do Consumidor.” [2]
Logo, como a questão não deve ser analisada segundo a ótica do Código de Defesa do Consumidor, mas sim, do Código Civil, isso implica dizer que a responsabilidade será sempre subjetiva e, não, objetiva.
Os eventos ocorridos nas dependências dos clubes recreativos devem ser solucionados de acordo com o que foi ajustado pelos próprios associados, que devem se submeter ao que restou decidido em assembleia ou, pelo conselho deliberativo, para todos os fins. Esse entendimento restou pacificado perante o Superior Tribunal de Justiça:
A hipótese não é de ser assimilada a outras, em que este Tribunal tem reconhecido a responsabilidade de quem propicia estacionamento, consagrado esse entendimento na súmula 130. Ali se cuida das relações de empresas com seus clientes. Teve-se em conta o proveito econômico que aqueles obtêm, na medida em que ensejam possam os veículos ser estacionados em lugares que ofereçam comodidade para a clientela, pois com isso visam exatamente a aumentá-la. E não há um acordo de vontades entre a empresa e seus clientes de que resulte a exclusão da responsabilidade. Na hipótese em exame, os sócios acordaram em que mais convinha ao interesse de todos que a comunidade não se responsabilizasse pelo pagamento dos questionados danos. Não há nisso ofensa a qualquer norma jurídica, cuja observância seja inarredável, nem a algum princípio ético. Há de prevalecer a disposição interna, fruto da vontade da maioria dos associados. (Resp 86.137/SP, Min. Eduardo Ribeiro, 3ª Turma)
Na omissão do regulamento interno do clube, a questão deverá ser enfrentada pela ótica do Código Civil com a aplicação da responsabilidade subjetiva. Isso significa dizer que para o clube ser responsabilizado deverá o associado demonstrar a existência da culpa do agente na prática do ato ilícito nos termos do art. 186 do citado codex: “Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.”
Demonstrada a existência do ato ilícito culposo, dano e nexo de causalidade, caracterizada estará a obrigação de indenizar. Sendo que, quanto ao ônus da prova, deve ser observada a regra do artigo 333, I do Código de Processo Civil.
Assim, diante de tais considerações, conclui-se que as relações entre clube e associado devem ser regidas pelas deliberações da assembleia, bem como, pelas regras do Código Civil Brasileiro, sendo aplicada a responsabilidade subjetiva.

--------------------------------------------------------------------------------

[1] Curso de direito civil brasileiro, v. 7: responsabilidade civil. 19ª ed. p. 40. São Paulo: Saraiva, 2005.
[2] Código Brasileiro de Defesa do Consumidor, comentado pelos autores do anteprojeto. 7ª ed., p. 40. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 2001.
Por André da Silva Sacramento

Fonte: Sala de Direito 

 

Notícias

Lei do Gás atrairá investidores

Extraído de Gás Brasil | 21/03/2011 | Regulamentação da Lei do Gás atrairá investidores Artigo de Márcio Monteiro Reis e Renato Otto Kloss. Após sucessivos adiamentos, foi editado no fim do ano, o Decreto federal 7.382/2010, que traz a regulamentação a Lei 11.909, mais conhecida como Lei do Gás,...

Bandeira branca

  OAB prepara a guerra, CNJ e STF ensaiam a paz Por Rodrigo Haidar   A Ordem dos Advogados do Brasil mirou no alvo errado e acertou o próprio pé. Na esteira do natural antagonismo entre o jovem Conselho Nacional de Justiça e o vetusto Supremo Tribunal Federal, que passaram a dividir um...

Caminho mais curto

  PEC sobre fim de ação em segundo grau é polêmica Por Marina Ito   Na segunda-feira (21/3), o presidente do Supremo Tribunal Federal, ministro Cezar Peluso, vai apresentar, em um evento na FGV Direito Rio, uma Proposta de Emenda Constitucional para que os processos sejam finalizados e...

Igualdade das partes

Extraído de DPU Artigo: MP ao lado do juiz viola equidistância das partes  Por Eduardo Tergolina Teixeira, Gabriel Faria Oliveira e Vinícius Diniz Monteiro de Barros    A Constituição do Brasil, em seu artigo 5º, caput e incisos LIV e LV, estabelece a igualdade das partes no curso do...

Fiança questionada

  STJ mantém fiança de pessoa diversa do contratante A fiança feita por pessoa jurídica diferente daquela que celebrou o contrato principal, e que é juridicamente válida, deve ser mantida para não tornar o principal sem efeito. Esse foi o entendimento da 2ª Turma do Superior Tribunal de...

Diplomação deve incidir sobre suplente da coligação

Quinta-feira, 17 de março de 2011 Diplomação deve incidir sobre suplente da coligação, decide Lewandowski O ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, indeferiu pedido de liminar apresentado por Wagner da Silva Guimarães, que pretendia assumir a cadeira do deputado federal Thiago...