Juízes dispensam audiências de conciliação; advogados apontam soluções

Perda de tempo?

Juízes dispensam audiências de conciliação; advogados apontam soluções

Magistrados negam fase conciliatória em ações de superendividamento, questionando efetividade da medida.

Da Redação
segunda-feira, 12 de maio de 2025
Atualizado às 06:55

A realização de audiências de conciliação nos processos de superendividamento, embora prevista como etapa obrigatória na lei 14.181/21, tem sido frequentemente dispensada por magistrados, que alegam baixa efetividade do ato e "desperdício de tempo".

Um exemplo recente ocorreu em fevereiro de 2025, quando uma juíza de Direito do TJ/SP indeferiu pedido de realização de audiência sob o argumento de que o ato seria "inútil".

Leia Mais
"Desperdício de tempo", diz juíza ao negar audiência de conciliação

A magistrada alegou que a experiência prática tem demonstrado poucos acordos efetivados e que a insistência na audiência apenas prolongaria o curso do processo.

A tendência tem preocupado juristas, que em entrevista ao Migalhas, apontaram soluções para que a etapa não seja indevidamente desprezada.

O que diz a lei?

A lei 14.181/21, que alterou o CDC para criar mecanismos de prevenção e tratamento do superendividamento, prevê, em seu rito, a realização de audiência de conciliação coletiva com todos os credores.

O objetivo é permitir que o consumidor apresente um plano de pagamento viável, respeitando o mínimo existencial e buscando solução consensual para a repactuação das dívidas.

Dessa forma, a dispensa da audiência, sem previsão legal para tanto, coloca em xeque a própria validade do procedimento adotado pelo juiz.

Exemplo disso foi decisão recente do TJ/SP, que anulou sentença em processo de superendividamento por ausência da audiência obrigatória. Para o Tribunal, o descumprimento do rito compromete o devido processo legal e enseja nulidade.

Desperdício de tempo?

A justificativa mais comum entre os magistrados que optam por não realizar a audiência é a alegada ineficiência do ato, em razão do baixo índice de acordos. No entanto, especialistas ponderam que a função da audiência vai além da celebração de pactos imediatos.

A advogada Viviane Ferreira, diretora jurídica de excelência e experiência do cliente da banca Parada Advogados, reconhece a baixa efetividade prática, mas defende a manutenção do ato como instrumento pedagógico e de estruturação de propostas.

"O problema não está na audiência, mas na forma como ela tem sido realizada. Falta preparo técnico, falta envolvimento das partes, falta expertise dos conciliadores. É preciso investir nisso - e não eliminar a etapa."

Viviane destaca ainda que há material institucional, como cartilhas desenvolvidas no CNJ sob relatoria do ministro Luiz Fux, que orientam o preparo adequado das partes e reforçam o caráter educativo do procedimento.

A tensão entre celeridade processual e proteção do consumidor vulnerável permeia todo o debate. Se, por um lado, a dispensa da audiência pode acelerar o trâmite, por outro compromete um dos pilares da política pública prevista na lei.

"A audiência é espaço para diálogo, para tentativa de composição. Tornar isso opcional, ao gosto do julgador, fragiliza a política pública e pode comprometer a efetividade da norma", afirma Viviane.

Confira:

Tirar do Judiciário

Para o advogado Rubens Tilkian, sócio da banca Decoussau Tilkian Advogados é preciso reconhecer os limites operacionais do Judiciário.

"Você reunir 10, 15 credores numa sala sem estrutura adequada, sem conciliador especializado, pode gerar tumulto. Muitos credores não comparecem, o consumidor não apresenta um plano viável, e a audiência não cumpre seu propósito."

Rubens defende a realização da audiência como regra, mas admite que, em casos específicos, sua dispensa poderia ser compreensível. A seu ver, a solução está na criação de varas especializadas e maior uso de câmaras privadas de mediação.

"Assim como existem varas de recuperação judicial, é possível estruturar um ambiente apropriado para lidar com o superendividamento. Jogar tudo no colo do juiz não resolve o problema."

Rubens também aponta inseguranças normativas, como a indefinição do chamado "mínimo existencial", conceito central à lei, mas ainda carente de regulamentação clara.

"Como estabelecer um plano de pagamento se não há consenso sobre o que é essencial para a sobrevivência do consumidor? Essa lacuna dificulta os acordos e sobrecarrega o juiz."

Assista a entrevista.

Fonte: Migalhas

                                                                                                                            

Notícias

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem

Penhora de bem alienado fiduciariamente por dívidas propter rem Flávia Vidigal e Priscylla Castelar de Novaes de Chiara O STJ mudou seu entendimento sobre a penhorabilidade de imóveis alienados fiduciariamente em execuções de despesas condominiais, reconhecendo a possibilidade de penhorar o bem,...

Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural

Impenhorabilidade Ministro do STJ exclui área ambiental do cálculo de pequena propriedade rural STJ decidiu que, para impenhorabilidade, apenas a área produtiva de pequenas propriedades rurais deve ser considerada, excluindo-se a área de preservação ambiental. Decisão baseou-se em assegurar que...

Tribunal nega registro civil tardio de casamento de bisavós

Tribunal nega registro civil tardio de casamento de bisavós 20/07/2021 Prova de existência de filhos não é suficiente. A 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo manteve decisão do juiz Seung Chul Kim, da 1ª Vara Cível de Cotia, que negou pedido de registro tardio de...

Inseminação caseira: Veja impacto jurídico da prática não regulada no país

Reprodução assistida Inseminação caseira: Veja impacto jurídico da prática não regulada no país Recente decisão do STJ, reconhecendo dupla maternidade em caso de inseminação caseira, denota a urgência do tema. Da Redação segunda-feira, 4 de novembro de 2024 Atualizado às 09:56 Registrar o...