Valores de terceiros em posse de empresa em recuperação não se submetem aos efeitos do processo

DECISÃO
22/06/2021 08:10

Valores de terceiros em posse de empresa em recuperação não se submetem aos efeitos do processo

Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os valores pertencentes a terceiros que estejam, em decorrência de contrato, na posse de sociedade em recuperação judicial devem ser excluídos dos efeitos do processo de soerguimento.

Com esse entendimento, o colegiado deu provimento ao recurso de duas empresas para excluir cerca de R$ 208 mil dos efeitos da recuperação de uma outra empresa, contratada pelas primeiras para prestar serviços de administração financeira, fornecendo cartões de crédito a seus clientes.

Segundo as empresas contratantes, quando os clientes faziam compras com os cartões, os valores ficavam temporariamente na posse da recuperanda, que descontava a sua parte – referente ao serviço prestado – e lhes repassava o restante. Destacaram que o repasse consistia em mera transferência da posse do dinheiro, o qual sempre lhes pertenceu.

Para receber os valores devidos, as empresas ajuizaram ação cautelar de arresto e ação monitória. Na sentença proferida na cautelar, determinou-se a exclusão dos créditos da recuperação judicial – decisão transitada em julgado. Na ação monitória, já em fase de cumprimento de sentença, foram determinados o desbloqueio de penhoras e arrestos e a suspensão da lide, sob o entendimento de que o crédito deveria se submeter aos efeitos da recuperação.

Caso semelhante à hipótese de restituição

O relator no STJ, ministro Villas Bôas Cueva, explicou que, segundo o artigo 49 da Lei 11.101/2005, estão sujeitos aos efeitos da recuperação judicial todos os créditos existentes na data do pedido. No caso, contudo, o ministro ressaltou que as contratantes não detêm propriamente um crédito perante a recuperanda, a qual só estava na posse dos valores porque não cumpriu o contrato, que previa o repasse.

Para o relator, a questão se assemelha à hipótese de restituição, prevista no artigo 85 da Lei 11.101/2005, em que o proprietário de bem que se encontra em poder do devedor na data da falência pode pedi-lo de volta.

"Ainda que o pedido de restituição não se amolde perfeitamente à recuperação judicial, é útil para demonstrar que, na hipótese de a devedora se encontrar na posse de bens de terceiros, esses não são considerados seus credores, não se podendo falar em habilitação, mas no exercício do direito de sequela", afirmou.

Segundo o ministro, se as recorrentes não detinham propriamente um crédito contra a recuperanda na data do pedido de recuperação, não podem se submeter aos efeitos previstos no artigo 49 da Lei 11.101/2005, ao contrário do que entendeu o tribunal de origem.

Propriedade resolúvel e propriedade plena

Villas Bôas Cueva observou que a Lei 11.101/2005 prevê que os titulares de propriedade resolúvel não se submetem aos efeitos da recuperação judicial, estabelecendo o parágrafo 3º do artigo 49 que "prevalecerão os direitos de propriedade sobre a coisa e as condições contratuais". Se a lei traz essa previsão para a propriedade resolúvel, acrescentou, a norma tem mais sentido ainda quanto à propriedade plena, podendo as recorrentes prosseguir na busca dos valores retidos indevidamente.

"É importante frisar, por fim, que entre os meios de recuperação judicial previstos no artigo 50 da Lei de Recuperação e Falência não está incluída a utilização de valores que integram o patrimônio de terceiros", concluiu o relator.

Leia o acórdão no REsp 1.736.887.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s):REsp 1736887

Superior Tribunal de Justiça (STJ)

  

 

Notícias

É possível usucapir imóvel destinado em parte a comércio familiar, diz STJ

MODALIDADE ESPECIAL URBANA É possível usucapir imóvel destinado em parte a comércio familiar, diz STJ 11 de maio de 2020, 15h40 Por Danilo Vital O pedido havia sido negado em primeiro e segundo grau, sob o entendimento de que a modalidade usucapião urbano é restrita a moradia. Confira em Consultor...

Meu namorado tem direito ao meu apartamento e carro se vier morar comigo?

Meu namorado tem direito ao meu apartamento e carro se vier morar comigo? Advogado Rodrigo Barcellos responde dúvida de leitor sobre pensão. Envie você também suas perguntas Por Rodrigo Barcellos, advogado Publicado em: 10/06/2018 às 07h00 Pergunta da leitora: Já tenho um apartamento há 10 anos,...

Usucapião por abandono do lar

Usucapião por abandono do lar 14.08.2020 | 05h30  É necessário que ex-cônjuge tenha realmente abandonado o lar O direito se torna belo e dinâmico quando consegue acompanhar as evoluções de novos fatos sociais quando reinterpreta ou cria nova legislação para se amoldar a essa sociedade em...

Carreira de oficial de Justiça deve ser reconhecida como exclusiva de Estado

Carreira de oficial de Justiça deve ser reconhecida como exclusiva de Estado 18 de agosto de 2020, 6h35 Por Gerardo Alves Lima Filho Neste artigo, nos propomos a identificar se os oficiais de Justiça devem ser reconhecidos como carreira exclusiva de Estado. Confira em Consultor Jurídico