Artigo – Estadão – Os novos aliados da recuperação judicial – Por Augusto Barros

Artigo – Estadão – Os novos aliados da recuperação judicial – Por Augusto Barros

Ao longo dos últimos anos temos visto no Brasil um grande número de pedidos de recuperação judicial. Notícias sobre as dificuldades de empresas queridas pelo grande público – como no caso das Livrarias Cultura e Saraiva e das companhias de aviação Avianca e Latam, por exemplo – causam grande comoção e real torcida pela sua recuperação. São tempos extremamente desafiadores em que a agonia dos empresários e de algumas profissões e decorre não apenas da crise política e econômica prolongada em que nos encontramos e dos desafios da pandemia que ainda assola boa parte do mundo, mas também da rápida mudança causada pela nova dinâmica social e comercial em relações crescentemente virtuais.

Durante muito tempo, a única opção para as empresas em dificuldade era o procedimento de falência. Muitos anos se passaram até que no ano de 2005 fosse aprovada a Lei 11.101, trazendo o conceito da Recuperação Judicial com o objetivo de “viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.” Poucos anos depois desta grande evolução um outro movimento importante se iniciou com a publicação pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) da Resolução 125/2010, dispondo sobre a política judiciária nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário, que foi a mola propulsora do uso dos Métodos Extrajudiciais de Solução de Controvérsias em nosso país.

O primeiro método a se consagrar foi a mediação, que já se apresenta como uma grande aliada nos procedimentos de recuperação judicial. A existência de lei específica regulando o procedimento – Lei 13.140/2015 – e do enunciado 45 aprovado na I Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, referendando a compatibilidade da mediação com a recuperação judicial, a extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, pavimentaram o caminho para a sua crescente utilização, que foi também chancelada pela Recomendação 58/2019 do CNJ, que reforça a recomendação pelo seu uso. A atuação de um mediador na fase pré-processual, facilitando a articulação entre os interessados no procedimento e a melhor estruturação do plano de recuperação já é utilizada com frequência e com bons resultados para sucesso da sua aprovação pelos credores. Também temos visto com certa frequência a atuação de mediadores ao longo do procedimento, dando maior celeridade e efetividade às negociações e ao deslinde do processo de uma forma geral.

A pacificação do uso da mediação nos procedimentos favorece a aceitação de novas soluções que também possam contribuir para eficiência e celeridade do procedimento, abrindo espaço para que sejam propostas novas técnicas menos conhecidas, mas igualmente efetivas. A construção de consenso (“consensus building”) e as técnicas de advocacia colaborativa, por exemplo, se mostram bastante promissoras, mas há um método que merece especial atenção por suas características e que promete se tornar tão frequente e bem-sucedido quanto à mediação: os Dispute Boards.

Também conhecido como Comitês de Prevenção e Resolução de Disputas, os Dispute Boards nasceram nos EUA no final dos anos 60 como uma alternativa à arbitragem na resolução de disputas nos contratos de infraestrutura. Em seu formato mais frequente, o Comitê é formado por três profissionais indicados pelas partes e que acompanham o projeto desde o seu início, prevenindo e solucionando as disputas surgidas ao longo da execução do contrato. Como ocorre nos demais métodos extrajudiciais de solução de controvérsias, a sua utilização é necessariamente combinada com a arbitragem ou com o poder judiciário como forma final de resolução de disputa. Casos recentes de sucesso no país com a previsão do seu uso nos contratos de estruturas temporárias dos Jogos Olímpicos e na linha 4 do metrô de São Paulo, aliados aos avanços na sua regulação como os três enunciados aprovados na já mencionada I Jornada de Jornada de Prevenção e Solução Extrajudicial de Litígios, a Lei Municipal aprovada na cidade de São Paulo e dois projetos de Lei em trâmite no Senado e na Câmara, vem dando maior segurança aos usuários para a sua utilização.

A vocação do Comitê para impulsionar a marcha do contrato e promover o diálogo entre as partes na resolução dos seus conflitos em tempo real o fazem um método com características únicas em relação aos demais. Com os necessários ajustes é possível prever a sua utilização em outros tipos de contrato que não os de infraestrutura, como nas relações societárias e nos contratos de tecnologia, por exemplo, e também já se começa a ver um exercício de adaptação para a sua utilização como aliado na recuperação das empresas em dificuldades. Em um artigo inovador sobre o tema, que será publicado no livro “Manual de Dispute Boards: Teoria, Prática e Provocações”, o professor Márcio Guimarães trata do tema, considerando-os plenamente compatíveis com o espírito de transparência e cooperação que devem guiar o processo de soerguimento da empresa em crise. De forma prática e objetiva, cogita a sua utilização nos conflitos em que se discutam a existência, importância e natureza de créditos e na composição de interesses antagônicos surgidos ao longo do processo recuperacional como nas disputas relacionadas à consolidação do quadro geral de credores e nas Disputas societárias comumente observadas nos processos de reestruturação. A possibilidade de ter uma decisão mais célere emitida por um Comitê que, além de ser composto por especialistas ainda são capazes de atuar em tempo real no deslinde das controvérsias, é algo que em muito contribuiria para a maior eficiência dos procedimentos, respeitados os requisitos legais para a sua perfeita integração ao sistema já existente na prática atual.

Estamos diante da expectativa de um aumento exponencial no número de novos pedidos de recuperação judicial e este crescimento no volume de processos certamente tornará ainda mais longos e dolorosos os procedimentos. O estímulo à utilização de novos métodos extrajudiciais de solução de controvérsias certamente servirá como um grande aliado para a maior celeridade e eficiência das recuperações judiciais.

Fonte: O Estado de São Paulo
Extraído de Anoreg/BR

Notícias

Divórcio potestativo sob a perspectiva jurisprudencial

Com Partilha Divórcio potestativo sob a perspectiva jurisprudencial Marília Mello de Lima 9 de outubro de 2025, 8h00 Há julgados recentes, inclusive do Superior Tribunal de Justiça, no sentido de que o divórcio pode ser decretado antes mesmo da citação da parte requerida. Leia em Consultor...

Doação verbal exige escritura pública para validade do ato, diz TJ-BA

Usucapião afastado Doação verbal exige escritura pública para validade do ato, diz TJ-BA 8 de outubro de 2025, 12h19 O julgador explicou que a ocupação do imóvel — ainda que por um longo período de tempo — ocorreu por mera liberalidade da proprietária. Leia em Consultor...

STJ valida filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa

Família STJ valida filiação socioafetiva post mortem sem manifestação expressa 3ª turma reconheceu vínculo de filha criada desde a infância, ainda que falecidos não tenham formalizado adoção. Da Redação terça-feira, 7 de outubro de 2025 Atualizado às 18:55 Por unanimidade, 3ª turma do STJ...

Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente

Opinião Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente Mathias Menna Barreto Monclaro 7 de outubro de 2025, 7h01 Não se deixa de reconhecer que, em certos contextos, a rigidez da solução pode suscitar debates sob a ótica da justiça material, sobretudo em heranças complexas, em...

Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência

Proteção Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência Magistrado reconheceu que a família do devedor explora diretamente a terra para sua subsistência e que os imóveis se enquadram como pequena propriedade rural. Da Redação domingo, 5 de outubro de 2025 Atualizado em 3 de outubro de...