Beneficiário de boa-fé não precisa restituir valores pagos a mais por erro da entidade de previdência privada

DECISÃO  21/11/2016 08:02

Beneficiário de boa-fé não precisa restituir valores pagos a mais por erro da entidade de previdência privada

Os valores de benefícios de previdência complementar recebidos de boa-fé, quando pagos indevidamente pela entidade de previdência privada em razão de interpretação equivocada ou de má aplicação de norma do regulamento, não estão sujeitos à devolução, pois se cria expectativa de que tais verbas alimentares eram legítimas.

O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em julgamento de recurso especial interposto por entidade de previdência complementar que foi condenada a devolver valores descontados de beneficiários.

O caso aconteceu a partir da revisão da renda mensal inicial de aposentadorias dos beneficiários, feita pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) em 1992. Como o valor dos proventos aumentou, os benefícios suplementares correspondentes deveriam sofrer redução, por força de norma estatutária, mas a entidade de previdência privada só ajustou as aposentadorias complementares em dezembro de 1994, promovendo o desconto das diferenças pagas indevidamente.

Os beneficiários ajuizaram ação declaratória de nulidade de desconto em previdência suplementar cumulada com repetição de indébito.

Devolução integral

A sentença, por entender ilegais os descontos dos valores nos benefícios dos autores e a sua apuração unilateral, bem como ante o seu caráter alimentar, e considerando ainda a expectativa do titular quanto ao recebimento de um valor já anteriormente conhecido e que passou a integrar o seu padrão financeiro, determinou a devolução dos valores descontados. A decisão foi mantida na apelação.

No STJ, a entidade alegou que, “se no regime da previdência social pública é permitido ao INSS proceder ao desconto de parcelas pagas a maior ao beneficiário, nos termos do artigo 115, II, da Lei 8.213/91, e se a legislação especial da recorrente – Lei 6.435/77 – determina em seu artigo 36 a aplicação subsidiária daquela outra, vislumbra-se que os descontos dos valores diretamente na suplementação do recorrido serão legais e legítimos”.

Boa-fé

A argumentação, entretanto, não convenceu o relator, ministro Villas Bôas Cueva. Ele citou o entendimento já pacificado no âmbito do STJ, do Supremo Tribunal Federal, do Tribunal de Contas da União e também da Advocacia-Geral da União de que, “configurada a boa-fé dos servidores e considerando-se também a presunção de legalidade do ato administrativo e o evidente caráter alimentar das parcelas percebidas, não há falar em restituição dos referidos valores (RE 638.115)”.  

Para o relator, apesar de os regimes normativos das entidades abertas e fechadas de previdência complementar e da previdência social serem diferentes, deve ser aplicado o mesmo raciocínio em relação à não restituição das verbas recebidas de boa-fé pelo segurado ou pensionista e que tenham aparência de definitivas, como forma de harmonizar os sistemas.

“Se restar configurada a definitividade putativa das verbas de natureza alimentar recebidas pelo assistido que, ao invés de ter dado causa ou ter contribuído para o equívoco cometido pelo ente de previdência complementar, permaneceu de boa-fé, torna-se imperioso o reconhecimento da incorporação da quantia em seu patrimônio, a afastar a pretensa repetição de indébito”, disse o ministro.

Villas Bôas Cueva esclareceu, no entanto, que a situação não se confunde com aquelas que envolvem a devolução de valores de benefícios previdenciários complementares recebidos por força de tutela antecipada posteriormente revogada.

“Nesses últimos, prevalecem a reversibilidade da medida antecipatória, a ausência de boa-fé objetiva do beneficiário e a vedação do enriquecimento sem causa”, concluiu o relator.

Leia o acórdão.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1626020
Superior Tribunal de Justiça (STJ)

 

Notícias

Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente

Opinião Renúncia à herança e sua extensão a bens descobertos posteriormente Mathias Menna Barreto Monclaro 7 de outubro de 2025, 7h01 Não se deixa de reconhecer que, em certos contextos, a rigidez da solução pode suscitar debates sob a ótica da justiça material, sobretudo em heranças complexas, em...

Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência

Proteção Juiz nega penhora de imóveis rurais usados para subsistência Magistrado reconheceu que a família do devedor explora diretamente a terra para sua subsistência e que os imóveis se enquadram como pequena propriedade rural. Da Redação domingo, 5 de outubro de 2025 Atualizado em 3 de outubro de...

Assinatura eletrônica e digital: entre prática judicial e debate acadêmico

Opinião Assinatura eletrônica e digital: entre prática judicial e debate acadêmico Cícero Alisson Bezerra Barros 2 de outubro de 2025, 18h25 A confusão entre os termos reside justamente no fato de a assinatura digital ser uma modalidade específica de assinatura eletrônica, mas dotada de requisitos...

A possibilidade da usucapião de bem imóvel ocupado por um único herdeiro

A possibilidade da usucapião de bem imóvel ocupado por um único herdeiro Victor Frassetto Giolo Decisões recentes do STJ trazem clareza à possibilidade de usucapião em herança e evidenciam os impactos da posse exclusiva na partilha familiar. terça-feira, 30 de setembro de 2025 Atualizado às...