Limitação à autonomia da cláusula de eleição de foro

Limitação à autonomia da cláusula de eleição de foro

Davi Ferreira Avelino Santana

A eleição de foro (aquela cláusula esquecida na maioria dos contratos) agora não pode se dar sem guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes ou com o local da obrigação.

sexta-feira, 7 de junho de 2024
Atualizado às 08:06

Nesta semana foi publicada a lei 14.879, que alterou o CPC no que concerne à eleição de foro. Agora, o conteúdo da cláusula deve guardar pertinência com o domicílio das partes ou com o local da obrigação. E ainda, que o ajuizamento de ação em juízo aleatório constitui prática abusiva, passível de declinação de competência de ofício pelo magistrado.

O art. 63 do CPC, cujo caput diz que "[a]s partes podem modificar a competência em razão do valor e do território, elegendo foro onde será proposta ação oriunda de direitos e obrigações", foi alterado no seu parágrafo primeiro para passar a ter a seguinte redação:

§ 1º. A eleição de foro somente produz efeito quando constar de instrumento escrito, aludir expressamente a determinado negócio jurídico e guardar pertinência com o domicílio ou a residência de uma das partes ou com o local da obrigação, ressalvada a pactuação consumerista, quando favorável ao consumidor.

E acrescentou-se um quinto parágrafo, acerca da consequência do descumprimento:

§ 5º. O ajuizamento de ação em juízo aleatório, entendido como aquele sem vinculação com o domicílio ou a residência das partes ou com o negócio jurídico discutido na demanda, constitui prática abusiva que justifica a declinação de competência de ofício.

Com isso, a novidade do tema está na introdução da pertinência geográfica como um conceito central que impacta as práticas contratuais e processuais. Segundo a ideia de facilitar o acesso à justiça, quando o foro está geograficamente relacionado ao domicílio, residência ou local da obrigação, as partes têm mais facilidade de acesso aos tribunais, reduzindo custos e dificuldades logísticas. Além disso, ao exigir uma conexão geográfica, a legislação previne a prática de escolher foros inconvenientes para prejudicar a outra parte, prática conhecida como forum shopping.

Inicialmente, deve-se destacar a maior proteção conferida às partes vulneráveis, especialmente aos consumidores. A nova redação estabelece que, em contratos de consumo, a eleição de foro só será válida se for favorável ao consumidor, o que visa prevenir que consumidores sejam forçados a litigar em foros distantes ou inconvenientes, os quais poderiam representar um obstáculo significativo ao exercício pleno de seus direitos. Dessa forma, a legislação protege os consumidores contra cláusulas potencialmente abusivas, que poderiam prejudicar seu acesso à justiça.

Com a exigência de que a cláusula de eleição de foro tenha uma conexão com o domicílio, a residência das partes ou o local da obrigação, a legislação reduz ambiguidades e disputas sobre a competência territorial. Assim, as partes sabem, desde o início, onde deverão resolver eventuais litígios. Consequentemente, reduzirá disputas processuais preliminares sobre a competência territorial, permitindo que os tribunais se concentrem no mérito das questões apresentadas.

Outro impacto relevante é a capacidade conferida aos juízes de declinar a competência de ofício em casos de cláusulas abusivas de eleição de foro, conforme estabelecido pelo parágrafo quinto adicionado ao art. 63. A disposição permite que o magistrado, ao identificar que uma ação foi proposta em um foro sem qualquer pertinência, possa declarar a incompetência ex officio. Tal mecanismo fortalece o papel do judiciário na proteção das partes contra práticas processuais desleais e abusivas.

Davi Ferreira Avelino Santana
Graduando em Direito na Universidade Católica do Salvador com intercâmbio na Universidade do Porto e extensão na Pontificia Università Lateranense di Roma

Fonte: Migalhas

Notícias

Juíza reconhece nulidade de algibeira em caso de execução de patrimônio

SÓ QUANDO CONVÉM Juíza reconhece nulidade de algibeira em caso de execução de patrimônio 8 de maio de 2025, 11h57 Tal conduta caracteriza a chamada ‘nulidade de algibeira’. Em síntese, a nulidade de algibeira consiste na estratégia de não alegar a nulidade no momento em que ela ocorre, utilizando-a...

Quando o bem de família pode ser penhorado? Jurisprudência do STJ

Opinião Quando o bem de família pode ser penhorado? Jurisprudência do STJ Caroline Valéria Adorno de Macêdo 5 de maio de 2025, 6h32 A jurisprudência do STJ tem reiterado que tais exceções devem ser interpretadas restritivamente, em respeito à função social da moradia e à dignidade da pessoa...

Herança digital e o testamento como aliado

Herança digital e o testamento como aliado Thauane Prieto Rocha A herança digital ganha destaque como parte essencial do testamento, permitindo que o testador decida sobre bens e memórias digitais após a morte. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado em 28 de abril de 2025 08:08 Ao realizar uma...

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório

Análise crítica de estratégias de planejamento sucessório Gabriel Vaccari Holding/Sucessão: Cuidado online! Artigo expõe riscos de soluções fáceis (procuração, S.A., 3 células). Evite armadilhas fiscais/legais. Leitura essencial para famílias e advogados. sexta-feira, 25 de abril de 2025 Atualizado...

Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido

Processo Familiar Bens trazidos à colação não respondem pelas dívidas do falecido Mário Luiz Delgado 20 de abril de 2025, 8h00 Os bens recebidos em antecipação da herança necessária (legítima), nos moldes do artigo 544 do CC [6], quando “conferidos” pelo herdeiro após a abertura da sucessão, NÃO...